GENTE "LOUCA POR ALEGRIA" E UM DESFILE DE ONZE, JUNTANDO-SE AO TAMBÉM DOIDO "MOITARÁ"
Gente que me lê, peço perdão por antecipação, mas hoje, segunda de Carnaval, curtindo uma belíssima ressaca da noite magistral de ontem, quero divagar, escrevinhar sem compromissos ou obrigações outras. Quero relatar de minha felicidade interior e de tantos outros que ontem estiveram comigo lá no Sambódromo de Bauru, quando descemos o percurso de forma pomposa e cheia de brilho e contentamento. Não esperava tudo acontecer da forma maravilhosa como foi se sucedendo. Tudo foi se encaixando de uma tal forma, desembocando em reencontros pelos caminhos da vida, culminando com o desfile. Quem tiver paciência e disposição para ler um relato mais do que pessoal, algo emocionado, que prossiga e curta tudo, como fizemos ontem à noite.
Nada programado com muita antecipação. De certo só alguns contatos e uma vontade de descer o Sambódromo num grupo de amigos e considerados. Muitos desistiram pelo caminhos (uns chatos), outros fizeram falta (de arrependimento também se morre) e alguns vão nos incriminar por não terem sido convidados (fica para a próxima). O fato é que havia um acordo prévio de passarmos na casa da amiga Rosa Barrenha (psicóloga da Prefeitura e integrante de um grupo de apoio denominado "Loucos por Alegria", ligado à luta antimanicomial) por volta das 19h, com alguns amigos dispostos a sambar na avenida. Tentei gente aqui e acolá, mas o único a acolher a idéia desde o início foi o Duílio Duka. Marcamos e nos encontramos no começo da noite, eu, ele, sua esposa, a Rosana, meu filho, também Henrique e outros que foram se juntando. Ana Bia, professora da Unesp liga e perdida numa cidade nova para ela, adere ao grupo. Na casa da Rose, ela nos aguardava com uma colaboradora (qual é mesmo seu nome?) do seu grupo. De uma hora para outra, dentro do inesperado da vida, surgem de um guarda-roupa, roupas e mais roupas, fantasias prontas e camisetas com estampas desse grupo, que juntando-se à vontade expressa na fisionomia de todos, tinha tudo para dar certo. Roupas escolhidas, um batom foi sendo usado como pincel no rosto de alguns, uma pintura era feita com um fino pincel em outras e até um spray com uma tinta verde era esparramada nos cabelos e barbas dos mais tresloucados.
Éramos sete ao sair da casa da Rose, três quadras do Sambódromo. Logo de cara, ao adentrarmos o espaço mais cheio de gente, o burburinho, eis que aparece do nada o Cláudio, um amigo ferroviário. Ele e sua filha juntam-se ao grupo, com duas camisetas, outros parangolés (Rose trouxe uma bolsa cheio deles) e muito batom no rosto, em desenhos que as mulheres iam fazendo em seus rostos. Melhorou, já éramos dez. Logo adiante, o gigante, incomensurável, um verdadeiro boneco de Olinda, Oscar "Pororó" Cunha Sobrinho, professor de História e arruaçeiro como todos os presentes. Dizendo-se anarquista ganhou na testa o símbolo do anarquismo envolto num coração e uma camiseta das mais transadas do estoque da Rose, com os dizeres "Quimera não morreu". Pronto, já éramos onze e não fomos mais porque Dudu, o filho do véio Duka, mulher e filhos ficaram acanhados de enfrentar a passarela. Chegamos na concentração e aí o problema, onde sairíamos. Acreditávamos que um bloco dentre os inscritos nos adotaria. Estávamos ali para isso.
Damos de cara com um Arlequim vindo ao nosso encontro de braços abertos, era Carlos Eduardo Martins, diretor e agitador teatral. Estava no meio de uma trupe das mais vibrantes por ali, os integrantes do bloco "Moitará", que vim a saber ali mesmo naquele momento era cria do designer Souto, da Propag Comunicação Visual, que além do belo trabalho de idéias, mantém um unido grupo de manifestações culturais, sempre pronto para novas intervenções cidade afora. Observando a animação do grupo e a vestimenta nada original, além da alegria estampada na fisionomia de cada um, fomos aceitos e para nossa surpresa, na sequência do desfile, estava saindo um bloco naquele momento e o nosso seria o próximo. Aproveitamos todos para novas pinturas, retoques e para conhecer e reconhecer gente pela concentração. Roque, com uma camiseta do Águias no peito quase (por muito pouco) não aderiu ao grupo. Quem aderiu ali foi o artista plástico Rômulo e dois amigos. Adereços do Boitará surgem como que por encanto e juntam-se ao grupo.
Gente animada e algo que passou mais rápido do que imaginávamos. Meu filho curtiu adoidado, pois trajava um fraque e cartola, além da camiseta de Louco. Eu, com uma larga roupa de palhaço e uma cartola cheia de inscrições transadas, de tomadas de posição do grupo. Cada um na sua, curtimos adoidado aqueles momentos que passam mais rápido do que um pluft, um vapt-vupt e quando demos por si, já estávamos todos no final da avenida. Interagimos bem o restante do grupo, fomos acarinhados e acarinhamos. Cantamos, dançamos e a diversão foi geral, sem neuras e com muita loucura. Nem beber bebemos, foi tudo de cara limpa, puros momentos mágicos. Por fim, já na parte final, antes dos abraços fraternos entre todos, alguns já se dispersaram ali mesmo. Roupas eram tiradas no "escurinho do cinema". Acompanhei a Rose e alguns até sua casa para aí então, darmos um fim nas cervejas que nos aguardavam no seu congelador. Papo vai, papo vem, tentei dar uma espiada em outro momento do desfile. Passava pouco mais das 23h, quem desfilava era o bloco "É isso mesmo". Aqui me penitencio, pois não aproveitei o restante da festa (reconheço, a festa foi bonita e tudo deu certo - ainda bem), estava cansado e fui descansar ao lado do filhão. Não vi mais nada. Nem fome sentimos, foi "ploft" e acordei agorinha a pouco, em puro estado de graça.
Ao abrir meu e-mail, algo da lavra do Marcos Paulo e sobre esses festejos (o filho da mãe, além de revolucionário é poeta, além de carnavalesco ausente), um que fez falta na diversão (se fosse o "Viúvas do Batata", tenho certeza ele iria). Deixou registrado um poema com o título, "ANTIGO BAILE DE MÁSCARAS": Eu nunca quis ser seu amigo/ Apenas um amante no baile de máscaras/ Sem importar como tudo poderia acabar/ Muito menos como começamos/ Encontre sua máscara/ Que eu encontrarei a minha/ No breu do salão de nossas vidas/ Corra e esconda-se debaixo da fantasia/ Negação de tudo o que já foi/ O salão irá desmoronar/ Entre colunas rachadas na inconsciência/ Esconda tudo no porão da casa/ E dê um beijo de boa noite no seu homem/ Mas não deixe de por sua máscara/ Que eu não deixarei a minha/ Seus olhos fervem além do disfarce/ Negação da verdade exposta numa noite distante". Outros (as) fizeram muita falta e devem estar se remoendo por não superarem suas desavenças interiores. Nesses dias estravazo e só darei guarida às minhas na quarta-feira de cinzas.
ALGO A ENTRISTECER QUALQUER CARNAVAL: Além da alegria, algo precisa ficar registrado. Uma comissão autorizada pelo Conselho Municipal de Cultura, formada por três dos seus membros, José Perea Martins, da ABL, pelo diretor teatral Carlos Eduardo Martins e por mim, ficou encarregada de idealizar um Concurso Municipal de Marchinhas de Carnaval. Isso ano passado. O assunto foi discutido em várias reuniões, sendo até autorizado uma Comissão para alavancar o tema, todas na presença do mandatário da Cultura local. Algumas promessas foram feitas e não cumpridas. A pessoa mais motivada, o idealizador da idéia, o sr José Perea Martins, triste com o destino dado à sua idéia (a lata de lixo), renunciou de ser Conselheiro, em caráter irrevogável e desligou-se do mesmo (o Conselho depois disso não mais se reuniu, feneceu). Perda lamentável e que poderia ter sido evitada. Disse não ter mais idade para suportar coisas desse tipo. Algo que poderia ter sido realizado junto da escolha da Rainha do Carnaval, talvez fique para outro ano ou quando alguém com maior sensibilidade estiver à frente dos destinos culturais da cidade. Por enquanto, o trivial e sempre às pressas.
6 comentários:
Gostei da criatividade do seu bloco.Que animação,gente bonita !!!
Carnaval é isso ,um momento propício para o ser humano trocar as máscaras e deixar de lado os tormentos do dia a dia.
É só alegria,SKIDUM...SKIDUM
Beijão
Maria José
Muito bom o relato do bloco e das possibilidades de pessoas querendo desfilar e serem felizes.
Dos problemas lá na Secretaria de Cultura, nenhuma novidade. Ouço que depois que foram conseguidos do Conselho Municipal de Cultura o cumprimento de algumas obrigações iniciais, datas e prazos necessários, o próprio Conselho está sendo desestimulado. Não seria isso o que está sendo estimulado? Um esvaziamento intencional. O caso da saída do seu Perea é extatamente isso. Já não fazem tanta questão do Conselho continuar atuando.
E criticaram a atuação do mandatário anterior da Cultura. Nada como o tempo para recolocar tudo no seu devido lugar.
Um grande abraço cultural e carnavalesco do
Daniel Proença
Sabe Aquela pessoa que você não se lembrou o nome? Sou eu, a Luciana, turismóloga e apaixonada por Bauru e por cultura brasileira... valeu a animação... Palhaço!!! Não precisava pôr tantas fotos minhas...rssssssssss....
Olá Henrique,
No dia 27 de março vamos fazer um Moitará com um sarau ( Poesia, musica, performance....)
e apresentação do SHow do Vinícius Zurliam quero convidar todos do bloco loucos por alegria para participar.
Em breve te envio o convite.
Beijos e abraço
Ana Lidia Aquino - MOITARÁ
21/02/2010
Um autêntico Carnaval
Sou membro conselheiro do Conselho de Cultura (estamos já há uns quatro meses sem nos reunirmos) e no conselho surgiu a idéia de questionarmos o modelo de “carnaval” que Bauru adotou nos últimos tempos e que redundou na “ausência” deste por treze anos. Acreditamos que o carnaval é sim uma festa popular e que deve acontecer como manifestação espontânea de um povo. O modelo que depende da injeção de verbas públicas para sua realização está falido. Programamos a realização de um Fórum do Carnaval, mas por falta de apoio o mesmo acabou não acontecendo.
O poder público, bem como os representantes da sociedade civil não parecem preparados para exercer a democracia participativa, nome bonito para os programas de campanha, mas descartado depois que se toma posse.
Há questão de uns três meses comecei a perceber nas páginas de meus amigos na Internet o chamamento para a participação do Bloco Moitará, na retomada do carnaval no Sambódromo. Com a aproximação dos festejos de Momo, entrei em contato com o Souto, responsável pela Propag que oferece apoio logístico cedendo espaço para o Moitará, para saber se poderia sair vestido com uma fantasia de arlequim (do carnaval de 2006, na Hípica), a resposta foi que como o tema era Cultura Popular Brasileira, tudo bem. Cheguei ao Sambódromo por volta das 19 horas e encontrei uma turma em volta de roupas e adereços espalhados pelo chão. Em pouco tempo as produções foram aparecendo e o trabalho como em uma colméia era perfeitamente organizado sob a coordenação da abelha rainha Ana Lidia. Uns prendiam as roupas dos outros com alfinetes, barbantes, arames, o que estivesse à mão; as maquiagens foram sendo feitas com o mesmo espírito. Em pouco tempo tudo estava pronto para a festa que na realidade havia começado quando da decisão da criação do Bloco Moitará para a participação no desfile. Com a chegada dos Loucos por Alegria estes foram incorporados pelo Moitará.
Fiquei encantado com o movimento e procurei dados mais precisos para escrever para este democrático espaço. Tudo começou com um chamamento no JC. As roupas foram adquiridas pelo Moitará no brechó da Vila Vicentina e outras repassadas pela Bete do Grupo Ato. O Servi Med colaborou com caixas velhas de isopor e mais isopor foi obtido no lixo das ruas. Com um processo de criação coletiva os materiais foram se transformando em pura arte.
Moitará para os povos indígenas é uma celebração e esta é a proposta do movimento Moitará que envolve todas as manifestações de arte: pintura, escultura, teatro, dança, música, moda, propaganda, poesia, em completa correlação-integração tendo como finalidade a criação artística. É um movimento aberto e apesar do apoio da Propag, com a cessão do espaço para a concretização das idéias, pode acontecer em qualquer local, o bloco aconteceu no Sambódromo. Com as apresentações de domingo no Sambódromo ficou provado que a pobreza financeira do Moitará foi compensada com uma riqueza de proposta, de envolvimento, de criação, de animação, e que mesmo com os R$10.000,00 que as escolas receberam estas eram pobres, pois não existe mais entre as comunidades o envolvimento com a criação carnavalesca.
Cabe aqui ressaltar a exceção representada pelos blocos Ouro Verde 100/% Arte e Acadêmicos de Tibiriçá e pela Escola de Samba Azulão do Morro. Creio que ficou demonstrado que a solução para a continuidade do nosso carnaval depende de uma quebra de paradigmas, de uma abertura para o novo que se apresenta, de um abandono de pré-conceitos estabelecidos por um modelo que não é nosso.
Saudades do corso na Batista e do Caré e suas Pastoras, este sim, a exemplo do Moitará, um modelo a ser seguido.
Carlos Eduardo Martins, artista
(Tribuna do Leitor - JC, 21/02/2010)
Foi maravilhoso ter participado deste desfile!Mais ainda, porque inesperado,espontâneo, como acredito que deva ser a alegria!
Faça o favor de nos convidar para a tal festa do pessoal do bloco, hem?!Eu sempre soube que você é um de nós, Louco por Alegria se reconhece a distância, no escuro, até pelo cheiro! Considere-se batizado!bjs!
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