sexta-feira, 5 de setembro de 2014
MEMÓRIA ORAL (167)
ALGUMA COISA DO SUL DESSE PAÍS CONTINENTE – CIDADES DA SERRA GAÚCHA
Acabo de voltar de minha primeira viagem ao interior gaúcho. Caxias do Sul, Gramado, Canela, Farroupilha, Bento Gonçalves, Flores da Cunha e algumas outras pequeninas cidades, vilas e distritos, todas na denominada Serra Gaúcha, ou Vale do Vinho. O encantamento que sempre tive com o sul do país é algo facilmente explicável, em músicas como “Eu sou do Sul” (do Elton Saldanha), aqui na voz de dois opostos da música riograndense, o nativista Neto Fagundes e Tiago Ferraz, a voz do grupo de rock Estado das Coisas: https://www.youtube.com/watch?v=tI07S1ZVEDQ. “Eu sou do Sul/ É só olhar e ver que sou do Sul/ A minha terra tem o azul/ É só olhar e ver”. Fui ver isso tudo de perto e conto abaixo um bocadinho do que ficou cravado aqui dentro de mim. Essa coisa do nativismo sempre me cativou, sempre despertou em mim algo apaixonante, uma união em torno de um ideal de luta, existente em poucas regiões do país.
A primeira impressão marcante, dessas calando fundo tive ao visitar a denominada Casa de pedra, um museu localizado bem no meio do caminho para o famoso Parque de Eventos, onde todo ano é realizada a famosa Festa da Uva. Enxerguei naquela casinha encravada no meio de uma pracinha, rodeada de ruas movimentadas e de difícil acesso, a habitação mais representativa do período de colonização italiana na região. Data do início do século XIX e segundo relato ouvido de um monitor, foi levantada após a desilusão dos imigrantes italianos, após terem aportado no país e perceberem o engodo do qual foram induzidos ao embarcarem para o novo eldorado. A realidade aqui era dua, eles sem condições mínimas de comprar casas, muito menos levantar dentro do que lhes era oferecido para tanto. O jeito foi fazê-lo com pedras, algo em abundância na região. O resultado é a lindeza vista ali.
Dentro do citado Parque, uma cabeça do Cristo pode ser vista de todos os lugares e chama muito a atenção. Trata-se do Espaço Jesus 3º Milênio, obra idealizada e concebida pelo escultor Bruno Segalla, num rosto com 21 metros de altura, voltado para observar toda a cidade. No pé do Cristo algo de grande interesse preservacionista, o Memorial Atelier Zambelli, abrigando muitas peças de um antigo atelier de escultura do italiano Michelangelo Zambelli, que iniciou a produção de imagens sacras em 1915 e as revendia para igrejas, monumentos variados não só no país, mas mundo afora. Ver os moldes, como o artista produzia as peças de forma artesanal, depois quase industrial é uma boa maneira de constatar e valorizar o trabalho do artesão, produzindo maravilhas e as modelando com pequenas peças de mão. O esforço em reunir todas as peças é admirável e salutar para não deixar algo tão importante se perder ao longo do tempo.
No caminho de Bento Gonçalves, no alto de um pico da serra, lá está fincado não uma bandeira, mas uma imensa edificação católica, uma igreja, a de Caravaggio. Estive ali num domingo e o imenso pátio estava lotado, não de romeiros, mas de turistas, alguns devotos, todos ali por causa do mesmo motivo, observar a suntuosidade do imenso mosteiro, olhar lá de cima o vale à volta, a beleza do verde preservado e intacto. No entorno, alguns poucos restaurantes, todos com preços até elevados, cozinhas renomadas e na maioria deles, massas. No entorno da igreja muitos camelôs e em nenhum deles artigos religiosos reverenciando o religioso homenageado, mas sim aquilo encontrado em todas feiras populares, os inconfundíveis artigos de R$ 1,99, promovendo o sustento de muitas famílias, comendo pelas beiradas a quantidade de gente diariamente no local.
Vir ao Rio Grande e não conhecer uma vinícola é o mesmo que ir ao Rio, por exemplo, e não conhecer o Maracanã. Fui em algumas, destacando uma delas, talvez a maior da região, dentro do denominado Vale dos Vinhedos, já na cidade de Bento Gonçalves. A Casa Valduga está cercada de pequenos agrupamentos, meio urbano, meio rurais, todos com igrejinhas postadas bem na beira da pista. Um local dos mais aprazíveis, imensos parreirais à volta e com a predominância do verde nativo. A beleza do lugar, não esconde certo bucolismo, tanto que ouço de alguém bem próximo sobre o agrupamento humano à volta das vinícolas: “Na primeira semana tudo é mesmo muito lindo, da segunda em diante faltará movimentação e depois de mês não suportarei mais. Prefiro só visitar”. Não sei se chego a concordar, mas o que posso referendar é sobre a imponência dos Valduga, cobrando R$ 20 reais pela visita, mas oferecendo degustação grátis no percurso e na saída ainda a possibilidade de levar consigo uma bonita taça gravada com o nome da casa.Dentre mais de vinte no local, algo marcante.
No caminho de Canela, impossível não parar para nem que seja um simples espiada no trem tombado na fachada do “Mundo a Vapor” (www.mundoavapor.com.br), um museu dedicado à muitas formas de invenções a vapor, que movimentaram o mundo no século passado. Com uma bela monitoria, feita toda por jovens aprendizes, uma instigante viagem no tempo. Tudo montado em réplicas e nelas uma amostragem bem detalhada de como mundo funcionava cheio de muita fumaça no seu entorno, tudo graças ao uso do vapor. As réplicas são tão perfeitas, que numa delas a de uma fábrica de papel, ainda leva-se como brinde algo impresso ali na hora, com um papel feito ali diante dos olhos de todos. De tudo, algo salutar foi a reverência à famílias dos pioneiros, dos que labutaram na região em lugares insalubres, mas levaram adiante e foram pioneiros no progresso não só das cidades onde atuavam, mas do mundo num todo. Existia muito da criatividade pessoal de cada bom artífice dentro daquelas oficinas de antanho e isso foi fator determinante para facilitar as coisas para quem viveu na seqüência.
De tantas idas e vindas, andanças pra lá e para cá, destaco uma personagem inesquecível dentro desse mundo nada imaginário, mas muito real por detrás da boniteza dos lugares. No pequeno distrito de Forqueta, entre Caxias do Sul e Farroupilha. Até pouco tempo atrás um pequeno vilarejo, hoje crescendo demasiadamente, inclusive com a chegada de conjuntos habitacionais imensos. Resistindo dentro do bucólico lugar, uma espécie de museu, o da 1ª Cooperativa Vitinícola da América Latina, criada em 1929. Ali, num imenso barracão, talvez o maior do lugar, de um lado um pequeno museu, mostrando como o vinho era feito de forma quase artesanal há aproximadamente 70 a 100 anos. Do outro, uma loja, com produtos variados da região. São mais de trezentas família todas em plena atuação na região e ali naquele local a exposição do bocadinho produzindo por cada um desses.
O local tem um diferencial, dona Gema Trevisan Daltiero, 60 e poucos anos e todos dedicados à italianice e a dedicação quase exclusiva ao local. Ela própria se intitula “animadora” do local e faz jus ao título, pois com um vozeirão imponente conta piadas como ninguém, faz uma propaganda do lugar com um estilo mais que próprio, com requinte e galhardia. Na verdade o que faz é uma espécie de stand up forquetense, tanto que já apareceu em alguns programas de TV e acaba de gravar um DVD, que em breve de estar sendo revendido como mais um dos produtos distribuídos pela cooperativa. Gema dá um brilho mais que especial ao lugar e quando gosta de alguma pessoa ou grupo, dificilmente conseguirá se desvencilhar de tê-la grudada dificultando até as despedida do lugar. Encarnou o seu trabalho como uma missão, alguém podendo também ser considerada como um cartão postal da cooperativa.
Antes da despedida e na impossibilidade de citar todos os lugares por onde tive o prazer de circular, cito um pelo qual Caxias também se orgulha. Defronte o pátio férreo de sua antiga estação, hoje ocupada pela Secretaria de Cultura do município, um bar reverenciando o blues norte-americano, o Mississipi Delta Blues Bar, que além de reunir os amantes do blues gaúcho, conseguem não se sabe bem como promover a realização anual de um grandioso Festival de Blues, sendo que no último, conseguiu reunir mais de 7 mil pessoas na rua defronte a estação e ao bar, com atrações nacionais e internacionais. O local é relativamente pequeno, abrigando no máximo 250 pessoas (bem acotoveladas), o som é de primeira e além do alto astral, uma boutique com roupas bem transadas e o que há de melhor dentro desse quesito musical. Num estado e cidade com laços bem enraizados dentro do nativismo gaúcho, esse o mais movimentado e o melhor bar noturno com música ao vivo da cidade. Faltou o nativismo, não presenciado durante a semana por lá passada, mesmo após intensa garimpagem. Esse o rescaldo de parte do que me marcou lá pelas bandas (não seria pampas?) do sul do país.
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Um comentário:
COMENTÁRIOS VIA FACEBOOK:
Juliana Barbosa Como você bem citou, faltou o nativismo!
Pena que no roteiro não há nenhum CTG, você iria conhecer a cultura gaúcha de fato... saudades de vocês!
5 de setembro às 23:35 · Editado · Descurtir · 2
Dani Barbosa Faltou Eu!!!
5 de setembro às 23:59 · Descurtir · 2
Vitor Ribeiro Aproveite! Vc está em um dos lugares mais legais do Brasil!!!
Ontem às 01:32 · Descurtir · 1
Cesar Melleiro O interior do Rio Grande do Sul é espetacular, seja pela sua cultura, culinária passeios enfim vale a pena conhecer o Rio Grande do Sul.
Ontem às 07:03 · Descurtir · 3
Ana Rebello Um relato com todas as vivas cores dos vinhos do Sul! E com as cores das suas impressões e seu entusiasmo, muito importantes para pintar esse quadro que você assina, e bem! Abraço amigo Henrique Perazzi de Aquino!
Ontem às 08:07 · Curtir · 1
Oscar Fernandes da Cunha Deveria ter trazido pelo menos um garrafa para a minha adega. kkkkkk
Ontem às 08:58 · Descurtir · 2
José Eduardo Zé Loca Gol É outro pais Henrique - Abraços...
Ontem às 10:06 · Descurtir · 3
Oswaldo Luiz Oliveira Grande Dunha!!!
há 20 horas · Curtir
Helena Aquino hummmmm .... vi minhas vodkas na prateleira ....rssss
há 9 horas · Curtir
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