sexta-feira, 11 de agosto de 2017

PRECONCEITO AO SAPO BARBUDO (117)


ENCONTRO COM UM EX-VERDE-AMARELO NO ELEVADOR

Encontro um vizinho no elevador, velho conhecido, ele com escritório montado na cidade, profissional liberal e a me olhar com certo desdenho e distanciamento desde quando me via com camisetas e bottons contra o golpe e o país todo inflamado a favor de uma tal de mudança, vestindo verde-amarelo. Lembro bem de outro encontro, esse antes da deposição de Dilma e ele, junto de sua esposa, no mesmo elevador, quase me virando o rosto, como a me dizer: “Não sei como consegue estar ao lado disso tudo”. O tempo passou e ontem ele novamente no mesmo elevador. Uma mudança considerável, pois não consegue me olhar nos olhos, cabeça baixa, faz um cumprimento meio que envergonhado. Eu continuo com os mesmos bottons na lapela, ele sempre querendo se mostrar indiferente, impecável vinco nas roupas, perfume caro, olha assim de soslaio e como para se justificar me diz::

- Que coisa, hem! O que fizeram de nosso país!
Lembram-se de Lacerda?

- Estava tudo tão claro, os que deram o golpe hoje são os mesmos de sempre. Não sei como vocês se deixaram levar, como foram embarcar naquela ladainha da TV? Nem dava para conversar com vocês, pois pareciam hipnotizados, papagaios de pirata.

- Eu lutava e luto contra a corrupção, tinha que me posicionar contra o que via acontecendo.

Tive que interrompê-lo, pois já não aguento mais os que ainda tentam se justificar com esses pífios argumentos:

- Sim, saiu de verde-amarelo, desfilou pela Getúlio Vargas naquelas marchas, todos gritando em alto e bom som, não contra a corrupção, mas contra o PT. Se estivessem bradando contra a corrupção, estariam hoje novamente na mesma avenida, mas se calam e justamente quando a corrupção atinge níveis nunca vistos. Por que agora estão calados? Não percebe terem sido marionetes de uma máfia televisiva, uma mídia criminosa e um Judiciário tendencioso a defender algo para si e não para o povo? Sinto em lhe dizer, mas foi gente como tu que propiciou ao país estar hoje nessa situação calamitosa.

- Pera lá, eu não tenho culpa de nada. Foi gente como você que votou em Temer.

- Eu não votei em Temer, votei em Dilma e tanto ontem como hoje, não existe possibilidade de ninguém se eleger e governar o país sozinho, quando não se tem maioria dentro do Congresso Nacional. Dentro do atual sistema acordos se fazem necessários. Temer estava contido até dar o golpe, traiu os interesses pelos quais foi eleito e insuflado por esses todos que tu apoiou. Ele é um traidor, estava contido nos governos de Lula e Dilma e hoje explicita seu baú de maldades, junto dos piores da nação. E se ontem você vestiu verde-amarelo e foi pra rua, hoje esconde sua camiseta. Cadê sua camiseta? Cadê sua insatisfação? Não adianta vir me dizer que o país está ruim, pois tem culpa dele ter chegado ao fim do poço. Vivemos um tempo onde ainda não se tem uma completa dimensão de tudo o que se passa, de tudo o que vem sendo feito contra a população. Eu continuo nas ruas, como dantes, e tu onde está neste momento? Já vi que não está contente. Ao menos já fez seu mea culpa?

Percebo que ele ficar vermelho, irado, o elevador chega ao estacionamento e sua mulher, calada até então, o puxa e diz:

- Vamos bem, estamos atrasados, depois vemos isso.

Ele abaixa a cabeça e se vai. Fico ali parado na saída do elevador e olhando o casal indo ao encontro de seu carro. Percebo que quando entra no carro dá uma última olhada para trás, ainda me vê olhando em sua direção, abaixa a cabeça entra no carro e sai. Eu me vou e cá estou com meu botton na lapela, minhas mesmas camisetas no peito e clamando pelas mesmas coisas de antes. Cego nunca fui. Meu antigo conhecido deve estar passando, como todos os usados e hoje descartados, as maiores dificuldades para pagar aluguel de seu apartamento e manter em dia as prestações do financiamento do seu automóvel nas condições atuais e já não sabe mais o que fazer. Agora sei, eles já sabem, mas ainda não deram publicamente o braço a torcer da grande “cagada” feita no ano passado quando apoiaram essa “merda” toda onde estamos atolados. Cruzo com eles aos magotes, poucos ainda me encaram para uma conversa e nem sei se voltarão a fazê-lo.

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