sábado, 3 de março de 2018

UM LUGAR POR AÍ (106)


A ELEIÇÃO ITALIANA E A TENTATIVA DE IMPEDIR ALGO XENOFÓBICO
Presenciei o espírito italiano em ação para a eleição ocorrida no domingo passado, 4/3, justamente o dia em que retornava ao Brasil. Me chamou a atenção os locais disponibilizados no país para a propaganda eleitoral. Por lá não se pode colar propaganda em qualquer lugar. Impensável isso. Os lugares são determinados e na maioria das vezes, painéis são colocados em locais públicos, de grande circulação, como entrada de estádios, praças, feiras e parques municipais. Ali os candidatos espalham sua propaganda. Em outros locais as listas dos partidos e candidatos. Olhava para aquilo tudo e fui me informar do que estava por detrás do pleito.

Tive o privilégio de permanecer por 15 dias numa das regiões onde a esquerda mantém predomínio, a Romana Italiana. Se ali naquele reduto onde muita transformação ocorreu dentro da história italiana algo paira no ar, imagino no resto, diante desse mundo com uma forte tendência para pender para o lado da direita xenófoba. Cresci e vivi na adolescência vendo grandes partidos de esquerda florescendo por vários países da Europa. Tenho muita lembrança de um grande líder comunista italiano, Enrico Berlinguer, que soube conduzir parcelas significativas da população para a vertente social. E agora, percebo os italianos rejeitando aquele projeto e tentados a apoiar a volta do partido do indefectível Berlusconi ao poder, uma espécie de Bolsonaro, só que milionário. Berlusconi já comandou a Itália, é uma espécie de Silvio Santos que chegou ao poder e age da mesma forma do animador de auditório brasileiro. Isso sim é populismo na sua essência mais perniciosa.

De tudo o que consegui captar nas andanças e conversas por aqui, sinto que o italiano está temendo o atual momento de imigração em seu país. Nos momentos em que o país estava vivendo seus bons momentos, esse tema era tratado de outra forma, mas agora, quando o cidadão local está com problemas e ocorre a chegada de muitos desses de vários lugares do planeta, subsidiados pelo Estado no básico, noto reclamações. O país está um tanto dividido, de um lado os que enxergam nisso o mal do pais e do outro, os que apóiam a integração, como sempre fizeram. Tanto lá como aqui no Brasil, o discurso xenofóbico dominou a campanha, em muitos momentos ofensiva e dividindo o país. Enfim, chegaram 600 mil imigrantes nos últimos tempos e isso tudo dominou o tema eleitoral.

Depois de anos de integração gradual, a crescente hostilidade em relação aos estrangeiros está na pauta do dia e talvez venha a ser o fiel da balança da eleição. Nesse momento, quando muitos procuram alguém para culpar pelos problemas, talvez o voto recaia sobre a eleição de políticos mais conservadores. Pego jornais gratuitos aqui na região onde estou hospedado, distribuidos até nos supermercados e neles vejo que as redes sociais estão ajudando a ampliar a toxidade da campanha. A Itália é uma país multicultural e os ataques ainda pipocam de pequenos grupos, mas influenciam o debate e representam perigo. Algo me salta aos olhos, os partidosa de esquerda já foram muito fortes e hoje, nem tanto, assim como a luta contra o racismo e a discriminação. Diante de tudo isso, o resultado do pleito é uma grande incógnita. Por fim, algo questionado por mim, o uso do voto eletrônico nem é questionado na Itália. Eles preferem continuar confiando no papel e nas recontagens quando necessárias, algo impensável para o modelo implantado no Brasil e questionado mundo afora.

HPA - Esse texto foi escrito antes de tomar ciência do resultado das eleições italianas. Sobre o resultado do pleito italiano, nada melhor do que acompanhar pela matéria de hoje do melhor jornal da América Latina, o diário argentino Página/12. Eis o link da edição de hoje: https://www.pagina12.com.ar/99674-una-italia-antisistema...

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