* Meu 118º texto para o semanário DEBATE, de Santa Cruz do Rio Pardo, edição começando a circular hoje:
A América Latina é de uma riqueza abismal. Se hoje me perguntarem por quais lugares gostaria de estar neste momento de minha vida, aos 63 anos, sinto falta de ainda conhecer os cantos latinos por onde não consegui botar meus pés. Do que ouço de alguns destes, o despertar de não só curiosidade, mas quase incontrolável desejo de conhecer as paragens onde estes habitam e vivem suas vidas. Não necessito de estar presente em lugares rebuscados e cheios de pompa. Prefiro os mais simples, os onde o povo mais simples circula e habita. Quando os vejo numa roda, dá logo uma vontade de me juntar ao grupo, me inteirar dos assuntos ali discutidos e ir se aprumando do rumo da conversa.
Nestas duas semanas conheci vários destes. De uma professora, nascida no Uruguai, mas desde muito jovem – 5 anos, residindo em Assunção, a capital paraguaia, quando me contava as histórias vividas no maior mercado popular daquela cidade, motivo já de um longa-metragem, o denominado nº 4, não muito diferente de tantos existentes por aqui, como o Mercadão de Madureira, no Rio, o Ver o Peso, em Belém do Pará ou os tantos das capitais nordestinas, me transportei para lá. Perco o interesse pelos shoppings centers, iguais em todo lugar, para ir em busca da “insustentável leveza do ser”, nestes paradisíacos locais construídos pela movimentação popular.
Das andanças pela capital portenha, Buenos Aires, fujo dos pontos turísticos e vou perambular pelas quebradas. Hoje, cada vez menos só, pois em muitos locais já se faz necessário um acompanhante local. Quando junto destes, tudo flui e assim, desvendo com meus próprios olhos lugares nunca dantes navegados. Num destes locais, num mercado popular, embrenhado no bairro de La Boca, quase junto ao Caminito e ao estádio La Bombonera, um casal mantém um restaurante, destes que faço questão de retornar, mais para revê-los e saber das novas histórias. Muitas delas dariam um livro, até pela forma como souberam ir tocando o barco de suas vidas, sobrevivendo diante de agruras meio que intransponíveis. Quando os ouço, é como se mundo parasse e eu ali, com a responsabilidade de tomar conhecimento de algo, para mim, de uma importância descomunal.
O destino das vidas humanas é muito parecido por todos os lugares. Cada qual me conta a sua história, a que move suas vidas e delas, juntando todas com a minha, sigo buscando a forma de como seríamos muito mais felizes, quando nos compreendêssemos mais, pois mesmo tão diferente, somos todos irmãos, se não de sangue, pelo menos nas agruras e padecimentos diante de governantes não tão bons para o trato com as camadas populares. A exploração do homem pelo homem é uma doença. Tem cura, mas para tanto, se faz necessário fazer os que se acham os donos do pedaço, serem vergados, enquadrados e submetidos a rigorosas leis, onde o lucro de alguns não pode ser tão absurdo e o ganho de outros, tão miserável, a ponto de mal conseguirem sobreviver. Isso não é comunismo, isso é bom senso entre seres humanos.
Um luxo ainda conseguir viajar e desfrutar destas conversas e conhecimentos. Vivo para elas. Junto meus caraminguás para perambular pelas periferias dos grandes centros. Estes, sem sombra de dúvidas, os lugares mais interessantes de todas as cidades. Hoje mesmo, se me convidam para tomar um chopp na avenida mais badalada de minha cidade, Bauru, a Getúlio Vargas, declino de imediato, mas se o convite é para conhecer um botequim novo lá pelas bandas do Mary Dota, enfurnada no coração do Fortunato Rocha Lima, aceito de prontidão. De um lugar, quase nada traria de aproveitável, já do outro, o oxigenação e o recarregar de minha interna bateria, a de como ir conseguindo acrescentar mais alguns anos na minha existência.Henrique Perazzi de Aquino, jornalista e professor de História (www.mafuadohpa.blogspot.com).
OBS.: Por sorte, temos o SESC por aqui e a cada ano, alguma novidade alvissareira para o aniversário de BAuru. Neste um Festival de Jazz, com a valorização de muita gente mais que boa daqui mesmo, juntando a cobras, como o argentino Hector Costita. Ah, não fosse o SESC. Vou assistir todos os dias.
HISTORINHAS DE ANTIGOS SHOWS NO ANIVERSÁRIO DE BAURU E UMA MACABRA DESTE ANOSou de um tempo que, ao invés da Prefeitura arcar com o pagamento dos shows de aniversário de Bauru, existiam parcerias e estes bancavam a festa, sem despesa para o erário público. Isso já vai tempo. A Prefeitura podia até gastar, mas gastava bem e aqui relembro duas histórias, passadas em outras administrações - se não me engano, ambos na última administração de Tuga Angerami.
Na primeira um show de Jair Rodrigues, ele sempre irreverente, brincalhão e sem fazer nenhuma exigência exdruxúla para o seu camarim. Seus shows são sempre um achado e num deles, ele permite acesso de uma bauruense, que samba divinalmente no palco, quando ele interrompe o show só para reverenciar a ilustre visita. Percebam, não é nenhuma invasão de palco, como ocorreu ano passado, aqui em Bauru, com a alcaide interrompendo o show do cantante Daniel, só para colocar sua irmã cantando louvores, algo totalmente fora do propósito e do script. Jair, num dos seus shows, o de uma aniversário, foi depois jantar no Baby Buffalo, o restaurante ali na Ezequiel Ramos, um dos patrocinadores, oferecendo o jantar para o cantor e seu staff. Um dos garçons chega para o cantor, um tanto sem jeito e com um guardanapo de papel, pede se ele não poderia dar um autógrafo para uma das cozinheiras, que era sua fã. Jair, olha pro cara meio sério e diz que não vai dar o autógrafo e antes que houvesse espanto geral, se levanta e fala pra todos ouvirem, vai é dar um beijo nela e se dirige para a cozinha. Por lá promove a maior algazarra, bate panelas, prova comidas e congestiona tudo. Esse o Jair, sem arroubos extras. Uma pessoa genial, única e nunca afeito a exigências fora do comum.
Num outro aniversário de Bauru, também bancado por uma parceria com a iniciativa privada, tempos de vacas magras, o convidado a cantar no aniversário bauruense foi nada menos que o baiano Moraes Moreira, que veio só, ele e sua guitarra. O show naquele ano só foi possível pelo preço especialíssimo que o artista fez, sem nenhum outro acompanhamento. E deu conta do riscado, relembrando seus sucessos, cantado por todos na platéia. Como Jair, Moraes não era dado a fazer pedidos extras para o camarim e se contentava com o que lhe apresentavam, ou seja, nada especial. No fim do show, o jantar seria dado ali defronte, numa cachaçaria, que deve funcionar até hoje - não me lembro o nome. Moraes chama os organizadores e diz não querer jantar e convida a todos para gastar o valor a ele reservado, com algo inusitado, mais ou menos neste tom: "Por que não vamos todos tomar pinga no lugar de comer?". E foram, numa noite que não acabou cedo. Nem sei se Moraes passou pelo camarim, ou se passou, chegou a desfrutar do que lhe foi preparado. O fato é que abdicou de tudo para, junto de conhecidos, produtores, organizadores e outros que se juntaram ao grupo, para beber e papear.
Num outro aniversário de Bauru, também bancado por uma parceria com a iniciativa privada, tempos de vacas magras, o convidado a cantar no aniversário bauruense foi nada menos que o baiano Moraes Moreira, que veio só, ele e sua guitarra. O show naquele ano só foi possível pelo preço especialíssimo que o artista fez, sem nenhum outro acompanhamento. E deu conta do riscado, relembrando seus sucessos, cantado por todos na platéia. Como Jair, Moraes não era dado a fazer pedidos extras para o camarim e se contentava com o que lhe apresentavam, ou seja, nada especial. No fim do show, o jantar seria dado ali defronte, numa cachaçaria, que deve funcionar até hoje - não me lembro o nome. Moraes chama os organizadores e diz não querer jantar e convida a todos para gastar o valor a ele reservado, com algo inusitado, mais ou menos neste tom: "Por que não vamos todos tomar pinga no lugar de comer?". E foram, numa noite que não acabou cedo. Nem sei se Moraes passou pelo camarim, ou se passou, chegou a desfrutar do que lhe foi preparado. O fato é que abdicou de tudo para, junto de conhecidos, produtores, organizadores e outros que se juntaram ao grupo, para beber e papear.
Algo assim ainda acontece nos dias atuais, mas não com o padre Fábio de Mello, um dito como pop star, fazendo pose de galã. Passo pela avenida na parte da tarde e converso com pessoas envolvidas com o show noturno. Pois não é que o padre pede como condição primordial de seu camarim, quatro energéticos importados e com preço individual de aproximadamente R$ 400 reais. A produção do padre localiza onde são vendidos os tais energéticos na cidade e indica para a produção local, ou seja, bancado pelo erário municipal. Para muitos, um camarim sem luxo, para outros, exigências extras. Assim são as histórias dos bastidores dos shows de aniversários desta terra varonil, dita e vista ainda como totalmente "sem limites".
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