TIROTEIO NA LAN-HOUSE
O jogo é uma realidade dentro do dia-a-dia de uma imensa legião de jovens e adolescentes. Não, não pensem que esse jogo é o futebol. Experimentem entrar numa lan-house, em qualquer horário e logo saberão a que estou me referindo. Eu frequento algumas aqui em Bauru e na grande maioria delas, a "molecada" faz parte daquela clientela considerada fiel, batendo cartão todo santo dia, com uma finalidade bem específica: os jogos no computador. E, na sua grande maioria, jogos onde o que predomina é a violência.
A febre foi começando aos poucos e hoje infesta esses estabelecimentos. No começo, levei um grande susto. Um barulho danado ao meu lado, com um deles gritando: "Matei, matei..." Do outro lado, a resposta era mais assustadora: "Acertei o coração, sangrei o desgraçado." Tudo num clima de muita algazarra, me fazendo levantar e espiar o que se passava nos computadores ao lado. Eles, simplemente comemoravam entre si a morte dos personagens dos jogos. É um verdadeiro clima de festa conseguir eliminar de vez, matar o perseguido. Braços erguidos, urros e mais urros, além da troca de abraços. Parei, olhei estupefato para os os lados e me achei um "estranho no ninho" naquele ambiente, pois logo a seguir descobri que até o dono do negócio participava dos jogos.
"Eu acabo entrando no clima. Quando o movimento está fraco, saio detrás do balcão e vou para a frente do computador. Só não grito igual a eles, mas que é bastante contagiante é, não tenho como negar. Não tem como não vibrar ao passar pelas etapas dos jogos", diz esse mesmo dono. Finjo estar compreendendo tudo e achando o que ouço a coisa mais normal do mundo. Essa mesma pessoa, que prefiro não identificar (não é essa a intenção do texto), me coloca observando a chegada dos frequentadores. São umas 16h de sábado e a grande maioria chega com o dinheiro contado. Ele me explica, que "com cinquenta centavos ficam quinze minutos jogando. Pagam antecipado, eu registro o tempo por aqui e quando dá o tempo, o sistema desliga sózinho. Quando eles percebem que o tempo está esgotando, gritam pedindo mais quinze minutos. Registro aqui e vou lá na máquina buscar a moeda."
São vários os jogos instalados nas máquinas e deve ser esse o carro-chefe das lan-houses de hoje, pois em algumas que frequento, a tela de apresentação tem estampado cenas desses jogos. Com o passar do tempo, após semanas naquele ambiente, o barulho já não te inquieta tanto e você acaba ficando isolado abrindo e-mails, entrando em sites e baixando documentos. Tudo isso, muito enfadonho para essa nova geração, em sua maioria constituída de meninos, mas também contando já com uns 20% de meninas. Alguns jogos podem até possuir boas narrativas, mas a grande maioria passa longe disso, sendo pura pancadaria e um cenário de caça, onde os pontos são acumulados com a morte. Um deles acaba me contando mais: "Se você não matar bem matado, não acertar no coração ou na cabeça, o cara mesmo ferido, ainda consegue te atingir." Se isso é só um jogo, acho que aquilo que praticava com a mesma idade, com pipas, botões e bodoques era história de carochinha.
As novidades se sucedem e a última foi que, ao pagar meu gasto, o dono me chama de lado, mostrando um rapaz e um senhor de idade deixando o local: "São pai e filho. O filho está quase todo dia aqui, hoje trouxe o pai. Eles baixaram por quase duas horas um monte desses jogos. Pagaram a gravação e levaram para jogar mais em casa. Não permito que baixem os que tenho gravado no sistema, mas os que conseguem gravar da internet eu não tenho como proibir. Faz parte do meu negócio." Tem disso também, a própria família incentiva isso dentro de casa. Vão sentar juntos diante do sofá e se esbaldarem com aquele "divertimento".
Não sei se estou vendo coisas, mas vejo isso como um prejuízo irreparável para toda uma geração, vivendo com os olhos grudadinhos nas telas de computadores, criando barriga e tendo suas mentes deformadas. Tem quem não pense assim e ouço algo diferente de um senhor de uns 50 anos, também frequentador de uma lan-house: "Eles estão apenas vivendo uma história de aventura, matando o tempo livre." Pra começo, prefiro matar meu tempo com coisa mais saudável e desqualifico essa incomensurada jogatina como algo que poderá lhes trazer algo de útil. De fútil, com certeza. E de aprendizado então, nem pensar, pois não vislumbro aprendizado nenhum ali. Fui mais longe e dei uma espiada no livro "Arte do videogame – Conceitos e Técnicas", do professor da USP, Jesus de Paula Assis (editôra Alameda, 96 páginas, R$ 24), lá enontrando: "O interesse não estaria na dificuldade de manipular a máquina ou na aquisição de pontos a cada fase, mas na fantasia que o jogo desperta ao ser manipulado." Uma fantasia e tanto, fico a divagar.
Percorro várias dessas casas e em quase todas o mesmo cenário. Não importa se o estabelecimento é mais luxuoso, com poltronas de couro e almofadadas, com divisórias separando os clientes ou se o acento é uma simples cadeira de madeira e as máquinas são dispostas lado a lado, nada impedindo um usuário de observar o que o outro faz ao seu lado. O som produzido é idêntico, tanto no ambiente mais abastado, como dentre os frequentadores que trazem o dinheiro contado. O intuito é o mesmo, jogar e ficar matando gente na telinha luminosa. A febre contagia todas as camadas sociais, produzindo estragos já sentidos no linguajar e na reação a certos acontecimentos ocorridos fora das salas de jogos, envolvendo a violênciado dia-a-dia.
Ousei abordar alguns desses garotos, não como se os estivessem entrevistando, mas num bate-papo, de quem estava interessado no que faziam. De um deles ouvi o seguinte: "Bandido tem mesmo é que morrer. Encurralo eles e passo fogo. Não tenho dó." Alongo a conversa e consigo transferi-la para a relação com o clima de violência de nossas ruas. Ele nem pensa muito para me responder: "É igualzinho aqui. Prender essa gente pra que? Mata logo, eles não prestam e se te pegam farão o mesmo." Estava diante de um meninão de uns 14 anos, de camiseta e bermudão largo, com chinelos havaianas nos pés. Não ousei perguntar o que havia achado do filme Tropa de Elite, pois acreditava já saber a resposta.
Por fim, encontro um local diferente, no centro da cidade, onde não vejo a meninada gritando e matando tudo o que encontra pela frente. Estranho o silêncio e abordo o dono, que me diz: "Não instalei jogos nesses computadores. Preferi atingir um outro público aqui no centro e me dou bem sem aquela barulheira." Também frequento esse, não tendo como deixar os demais, pois nesse as portas se fecham às 19h, quando a violência das ruas aumenta e o dono, com mêdo do que acontece com o deserto que fica o centro da cidade após o fechamento das lojas, prefere ir para casa mais cedo. Uma bela contradição, num a violência está instalada dentro do local e no outro, a violência de fora ameaça os que estão dentro. Pirei...
OBS.: As fotos são ilustrativas e não possuem a intenção de identificar locais, muito menos usuários. A última foto é desse escriba, sentado em uma lan-house, dentre as muitas de sua preferência.
Henrique Perazzi de Aquino, escrito em 30 de outubro de 2007.
2 comentários:
Se tá véio, heim meu!
do seu amigo Daniel Carbone - São Bernardo do Campo
Ja´ouvi e ja li muita coisa em revista e jornal especializado no assunto, mas essa foi uma das maiores besteiras que ja li, cada um tem direito a ter sua propria opnião, mas escrever sem conhecer o tema chega a ser engraçado, voce deveria se informar melhor antes de tentar abordar qualquer tipo de assunto... mas valeu a tentativa...
Drª Caroline Estefanny - psicologia - PUC - SP
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