NINGUÉM ME PERGUNTOU, MAS EU DIGO: MEU LUGAR É O RIO
Voltei à cidade do Rio de Janeiro para uma visita de quase uma semana, de 18 a 22/01/2011. Mesmo a serviço procurei dessa vez observar alguns detalhes novos na cidade e encontrei a melhor forma de abordar o que aqui escrevo. Ao ler uma das matérias da revista Brasileiros (edição 42, janeiro de 2011), a "Algum Lugar", com o seguinte subtítulo: "Todo mundo tem na memória um destino inesquecível que, por alguma razão, nem sempre objetiva, marcou a vida. Brasileiros pediu a amigos e colaboradores que buscassem em seus álbuns de viagens impressões e imagens dessas inspiradoras jornadas". Era o que procurava para renovar aqui o meu amor à cidade do Rio de Janeiro.
Viagens já fiz algumas na vida. Nem tanto como gostaria, mas não tão poucas. Sou um ser latino e prefiro mais a convivência com os daqui do que os lugares d'além mar. A viagem mais marcante de minha vida, sem sombras de dúvidas foi a feita à Cuba no ano de 2008, mas os constantes retornos que faço ao Rio, desde os meus 17 anos, deixaram em mim uma marca de aproximação latente e pulsante, renovada a cada recontato. Adoro circular por suas ruas e algo que acaba por cair nas minhas graças é a descoberta de novos detalhes. Mesmo a trabalho paro tudo, tiro a máquina fotográfica da bolsa, dou a clicada e promovo um rápido bate papo. Voltei a fazer isso na semana passada e o "Meu lugar", por mais que isso possa parecer redundância, continuará sendo o Rio, por quem nutro um amor antigo, desses que nunca terão fim*.
Os registros começaram na rua Bambina, em Botafogo, quase na esquina com a rua marquês de Olinda, quando vejo uma casa dessas antigas, centenária, fechada há anos e com uma raiz de árvore a lhe invadir as paredes. A cena é similar a que vi em Cuba e boquiaberto sou abordado por um vizinho. "Não conhecia essa? Circulando por aqui tem mais, se precisar de ajuda na localização me procure aqui do lado, que te levo lá. Uma mais interessante que a outra, todas fechadas. Décadas de abandono", me diz. Não muito longe dali conheço seu Antonio, que monta na rua Humaitá, no bairro do mesmo nome, bem próximo da unidade do Corpo de Bombeiros, esquina com a rua Miguel Pereira uma espécie de banca, espalhando na esquina discos, livros, CDs e outros adereços, vendendo tudo a preços irrisórios. "Compro muito pouco, a maioria os próprios moradores acabam por doar quando querem se desfazer de coisas antigas e revendo tudo aqui na rua. Um CD sai por R$ 2 reais e um livro não chega a R$ 5 reais", me conta. Iguais a ele são muitos espalhados pelo Rio todo. Livreiros de calçada estão nos mais diferentes pontos e a maioria com a mesma concepção de negócio.
Os registros começaram na rua Bambina, em Botafogo, quase na esquina com a rua marquês de Olinda, quando vejo uma casa dessas antigas, centenária, fechada há anos e com uma raiz de árvore a lhe invadir as paredes. A cena é similar a que vi em Cuba e boquiaberto sou abordado por um vizinho. "Não conhecia essa? Circulando por aqui tem mais, se precisar de ajuda na localização me procure aqui do lado, que te levo lá. Uma mais interessante que a outra, todas fechadas. Décadas de abandono", me diz. Não muito longe dali conheço seu Antonio, que monta na rua Humaitá, no bairro do mesmo nome, bem próximo da unidade do Corpo de Bombeiros, esquina com a rua Miguel Pereira uma espécie de banca, espalhando na esquina discos, livros, CDs e outros adereços, vendendo tudo a preços irrisórios. "Compro muito pouco, a maioria os próprios moradores acabam por doar quando querem se desfazer de coisas antigas e revendo tudo aqui na rua. Um CD sai por R$ 2 reais e um livro não chega a R$ 5 reais", me conta. Iguais a ele são muitos espalhados pelo Rio todo. Livreiros de calçada estão nos mais diferentes pontos e a maioria com a mesma concepção de negócio.
Seguindo em frente, na Fonte da Saudade, junto a Lagoa Rodrigo de Freitas, pertinho do Túnel Rebouças estacionado e meio que abandonada, com os pneus murchos está uma colorida perua Kombi, com dizeres que me chamam a atenção: "Bem vindo a redação volante, Rio Etc". Com a citação de um site, o http://www.rioetc.com.br/ . Como curiosidade mata, fui conferir e lá com o subtítulo do livro do cronista João do Rio, "A alma encantadora das ruas", algo mais sobre o que gosto, as ruas e pessoas dessa cidade realmente encantadora. No centro da cidade, na movimentada rua do Ouvidor, estreita e com lojas por todos os lados, uma desdentada trabalhadora negra serve de pirulito para expor uma propaganda de um sexy shop. "O que quer com essas fotos. Olha lá, hem, não gosto que me exponham ao ridículo. Estou aqui porque preciso". Sei disso e o registro vale para provar que qualquer jeito é jeito para se ganhar o pão de cada dia.
Os orelhões, todos eles, do centro da cidade estão infestados de propaganda sexual, predominantemente de travestis. Forrados com a exposição das qualidades e virtudes de quem está se oferecendo para a preços módicos atender as necessidades de quem estiver a fim. Virou moda colar isso nos orelhões, afinal deve ser muito mais barato que pagar anúncio em jornalões. Ali pertinho dos Arcos da Lapa, numa rua atrás da Sala Guiomar Novaes, num muro desenhos de artistas variados e um deles me chama a atenção, Ataulfo Alves, numa pintura de acabamento primoroso. Virei a esquina e no restaurante português Adega Flor de Coimbra, o garçon, morador da distante Mesquita, traz a geladíssima cerveja de cabeça para baixo e numa dessas coincidências que a vida proporciona me diz: "Por aqui me chamam de Ataulfo, pois dizem ser muito parecido com o cantor. Fico orgulhoso". Com um sorriso latejando no rosto, mostra-se um agradável papo, como o da maioria dos garçons daquela região da cidade.
No Saara, o maior shopping center a céu aberto do Brasil (pelo menos apregoam isso nos microfones espalhados por suas ruas), o negócio já é Carnaval, predominância do comércio local. Do restaurante "Girafa's", um fast food especializado em comidas rápidas algo inustitado. Carregadores saem às pressas com pesada carga de livros, todos novos, títulos recentes. "Não me pergunte nada. Não pode levar nada. Sou pago para levar daqui para outro lugar. Se estão a venda? Pergunte lá na loja", é a resposta de um dos carregadores diante do meu interesse por tão valiosa (pelo menos para mim) carga. Pego o metrô e desço na praça Saenz Pena, no coração da Tijuca e lá uma cena para outra obrigatória parada. Em cortejo, uma comitiva da Velha Guarda do Salgueiro seguem para um ensaio da sua Escola de Samba. Peço para tirar fotos e eles perfilam-se alegres e pimpões. "Venham todos, vamos tirar mais uma foto para o amigo aqui. Já fizemos isso hoje uma par de vezes e isso muito nos alegra", me diz um deles.
De lá sigo para o Leblon, rua Timóteo da Costa, uma ingreme ladeira da Zona Sul (pensam que morro é só para gente de pouca renda? Ledo engano). Defronte o número 100 paro para observar orquídeas sendo cultivadas num frondosa árvore ali e quando menos espero, quem está do meu lado é o zelador. "Gostou? Nessa região tem muito disso. Aqui por perto tem um zelador que cultiva um pé de jaca defronte um prédio e cuida para que nenhum caia sob os carros estacionados debaixo da árvore", me diz. Na Praça Tiradentes toda sendo reformada encontro um funcionário público, desses a serem considerados verdadeiros artistas, colocando uma a uma pedras no calçamento novo no local, com uma dedicação e esmero a merecer o registro. Sózinho vai produzindo o desenho a brilhar na futura calçada de tão comentado lugar. Volto ao centro e na avenida mais movimentada do centro nervoso do Rio, a Rio Branco, colado na lateral de uma fechada banca de revistas, um cartaz com um insólito pedido, como se fosse uma clemência aos transeuntes: "Favor não urinar na banca".
O dia quase findava e passo pelos jardins do Museu da República, no Catete, local onde Getúlio se suicidou. Ali, diante de tanto verde e algum lixo jogado pela calçada, um casal de moradores da região, inveterados amantes do arejado ar respirado dentre as árvores, munidos de vassouras, sabão e um borracha com água, lavam o local no meio dos transeuntes. Tudo para manter tão diferenciado local com aquele ar mais do que saudável. De lá, o último lugar é o Grajaú, onde estava garbosamente instalado. Ao descer do ônibus, rua Gastão Penalva, quase esquina com rua Uberaba, divisa entre o Grajaú e o Andaraí vislumbro na minha frente uma livraria com um pomposo nome, "Che". Adentro, conheço os dois proprietários e alguns gatos, que circulam com certa intimidade junto aos livros. Deitam de uma forma gostosa, procurando os espaços livres para esgueirar seus corpos. Não se assustam com intrusos e segundo os dois "guevaristas" (o slogan da casa é "o dever de todo revolucionário é fazer a revolução" e o site http://www.letraseletras.hpgvip.ig.com.br/ ), não fazem suas necessidades junto ao material a ser comercializado. Saio de lá direto para um reconfortante sofá, pés desascostumados a longas caminhadas e precisando de um bom e reparador descanso. Chego aos aposentos a mim reservados e com a certeza que me faz retornar sempre a essa cidade, constato que eu gosto mesmo é disso tudo, um bocadinho de cada coisa. O Rio é o "Meu Lugar".
* Ainda mais agora que namoro uma carioca da gema, de uma região que passei a admirar com mais fervor, o suburbano Grajaú, local de nascença e morada da querida Ana Bia.
5 comentários:
henrique querido
fico muito feliz de que cada vez mais seu lugar seja o rio e o meu bauru. aqui também aprendi - e continuo aprendendo - e vivencio muitas coisas bacanas. quando conto minhas estórias pros meus amigos e familiares cariocas, todos dizem dar um livro. quem sabe um dia ....? tenha a certeza de que, diferente de ti que já conhecias o rio, pra mim em bauru uma das coisas mais importantes está sendo a de te conhecer mais a cada dia. estou sempre contigo e não abro, viu ? um grande beijo da ana bia andrade
Henrique
Calor por calor, se lá tem praia aqui temos teatro sem ar-condicionado, se lá tem cultura e lazer a dar com pau aqui temos intransigência cultural pra dar e vender, se lá temos sambistas tocando na rua aqui temos sertanojos em cada esquina. É por isso que não saio daqui... Estamos entendidos.
Valéria
HENRIQUE,
ia com os meus pais para o Rio desde 1941. Hoje, meu filho Jr. é oficial da Marinha e mora e tem consultório (implantes) em Copacabana.
O Rio não é o mesmo que conheci, principalmente pelo nível de segurança, MAS CONTINUA LINDO...
Abs.
MURICY
Grande Henrique,
Acabo de chegar de viagem e vou ler seu Rio. Abraços
Hélio Campos Mello - Brasileiros
Henricão
É gostoso esse negócio de irmos descobrindo algo nas pequenas coisas, nas coisas que trombamos pelas ruas e na maioria das vezes nos passam sem que notamos. Isso tem nome, sensibilidade. Viajei no seu texto, mesmo conhecendo o Rio muito pouco.
Ro
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