UM LUGAR POR AÍ (18)
UM TEATRO NO RIO, A VIDA DA PROSTITUTA GABRIELA NO PALCO E O PÓS ESPETÁCULO
Na quarta, 21/09, 19h30, CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil, quase ao lado da famosa Candelária, cruzamento das avenidas Presidente Vargas com Primeiro de Março, centro velho do Rio, lá vou eu assistir a peça teatral baseada no livro de Gabriela Leite. A sala 3 não acomoda mais que 100 pessoas, mas esses espaços estão sendo disputadíssimos desde a semana passada, quando da estréia de “FILHA MÃE AVÓ PUTA – UMA ENTREVISTA”, com apresentação do Ministério da Cultura e patrocínio do Banco do Brasil. Com direção do também ator Guilherme Leme e tendo no elenco somente duas pessoas, vivendo a Gabriela, Alexia Deschamps e no papel do entrevistador Lauri Santos. O cenário é simples, uma grande mesa tendo numa das pontas o entrevistador e na outra a prostituta a contar suas histórias. Os recursos de uma boa iluminação ajudam bastante em todos os momentos e em pouco mais de 60 minutos, passados quase num instante, vapt-vupt, num prender de respiração, uma vida é passada a limpo, sendo exposto além de tudo o que foi vivido, também outro lado, o do pensamento pessoal e político de uma liderança desse país. Sim, quer se queira ou não, Gabriela é uma liderança e de uma linhagem das mais éticas. Pôs a cara para bater, enfrentou o touro à unha e não tem vergonha de expor isso, aliás, faz com muito orgulho.
Sai de lá com a alma lavada e quase sem respiração. Não tem como não ir juntando algo dentro de cada um ali naquele espaço. Só consegui soltar tudo pra fora ao reencontrar na parte inferior do CCBB, o Flavio Lenz (ele, o intelectual, marido da Gabriela, para incredulidade de alguns), que estava à espera do irmão, que havia vindo da Serrinha para assistir a peça. Fiquei meio sem palavras para expressar a ele o que havia achado da peça. Depois fui ler o bonito folfder distribuído aos presentes e lá encontrei algo assinado por Marcia Zanelatto: “Gabriela Leite poderia estar numa peça de Ibsen. Ser personagem de livro de Dostoiveski. Ou de um filme da fase socialista de Godard. Mas está aqui, na realidade. É brasileira. Mora no bairro do Catete, no Rio. Trabalha duro para se sustentar, sofre lendo os jornais de manhã e se diverte bebendo sua cervejinha com os bons amigos. É uma mulher simples, gente como a gente. A atuação de Gabriela nunca se pretendeu histórica. Mas o tempo a fará assim. (...) Pela cidadã que é e pela importância da causa que representa. (Ibsen teria adorado conhecê-la)”.
O melhor de tudo veio no fim do espetáculo. Flavio rodeou o CCBB junto do irmão, da esposa deste e de mim. Estávamos à procura de um bar para conversar e bebericar. Ali reencontra o ator Louri (que ele insistia em chamar pelo nome todo Lourinelson), o diretor Guilherme e um casal que havia assistido o show, o ator Luiz Mello e a esposa. Fomos todos para o primeiro que encontramos, ao Adega Timão, na esquina do Centro Cultural dos Correios. Quem chega a seguir é a atriz Alexia e logo a seguir, Gabriela (chamada pelo Flávio). Uma mesa das mais alegres e o único furão esse que vos escreve. Ouvi belas histórias do espetáculo, sinalizações de mudanças, expectativas e o alto astral de Gabriela pairando no ar. Da Alexia, não me contive e disse-lhe que a imagem que guardava dela era de uma capa de Playboy. Rimos e fiquei de mover céu e terra para levá-la a Bauru com a peça. “Tente, pois tenho um tio de Matão, fazendeiro, que quer levar para Araraquara. Seria uma temporada interiorana”, diz. Todos estavam muito falantes e até Luiz Mello, que queria ter ido a outro lugar para jantar, ficou sem reclamar. Do bar, sai direto para um táxi e cama. Não deu nem tempo de fazer as despedidas do casal da noite, Gabriela e Flavio. Nessa noite, algo colocado em prática do livro que acabei de ler, o “TerraMareAr”, quando afirma que no Rio existe um acordo tácito de trombar com artistas e agir com a maior naturalidade. Fiz isso e presenciei um papo teatral dos mais interessantes.
Encerro aqui o ciclo de narrativas de lugares visitados na semana, também em cima do tema do livro. E o fiz por um motivo muito simples, para demonstrar que em todas as viagens que faço, procuro entrelaçar lazer com cultura, deixando de lado pontos turísticos e badalações outras. Mais que isso, minha cultura é uma cultura quase de graça, gasto sempre pouco. Nesse dia, o teatro no CCBB me custou R$ 5 reais (meia entrada por ser correntista do banco) e a inteira eram R$ 10 reais. Não faço isso dos relatos para me gabar, mas gosto de escrevinhar e de demonstrar a existência de uma outra possibilidade de lazer e cultura, muito além dessa via consumista de hoje, onde tanta porcariada nos é enfiada goela abaixo (e custando os olhos da cara). Para encerrar de vez, hoje, sábado, 24/09, 21h, Teatro Municipal de Bauru, entrada gratuita, 450 lugares, CARMEN, ballet de Bizet, com um grupo bauruense recheado de diletos amigos. É isso que me faz continuar saindo muito de casa.
sábado, 24 de setembro de 2011
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