quarta-feira, 26 de junho de 2024

COMENTÁRIO QUALQUER (250)


PEDRINHAS MIUDINHAS - PEQUENAS HISTÓRIAS ACONTECEM A TODO INSTANTE
Adoro um livro do historiador carioca, o "escrevinhador das insignificâncias" - lema adotado por mim -, o "Pedrinhas Miudinhas, ensaios sobre ruas, aldeias e terreiros". Ele é simples demais da conta e nisso reside sua beleza, na simplicidade das histórias. Eu as cato em todos os lugares, os possíveis, imagináveis e também nos inimagináveis. Histórias acontecem em todos os lugares, basta estar sempre atento e ir recolhendo. Isso me consome o dia inteiro. Tomo conhecimento de uma, anoto no meu caderninho, para depois tentar descrevê-la nos detalhes, estes guardados dentro da caixa memorial.

Neste começo de noite, fui designado para acompanhar até o distrito rural de Tibiriçá, alguns estudantes e um professor. Tudo dentro de um projeto destes junto da comunidade do distrito e também dos estudantes da rede pública estuadual. Levo e fico a observar o que se passa no meu entorno. Estava cansado, dia cheio, corpo louco para encontrar um barranco e repousar. Algo aconteceu e me fez, perder mais do que o sono. Hoje foi um dia daqueles, onde as pessoas com as quais trombei parece estavam inspiradas, pois muitas me renderam mais que "pedrinhas", ou seja, renderam histórias cheias de emoção.

Conto algumas. O estudante da escola Major Fraga, ao final da aula noturna, lá pelas 22h30, entra no ônibus escolar que o deixa meia hora depois numa porteira, perto de onde mora. Ele desce e tem que caminhar no escuro mais 1 km, guiado pela luz da lanterna do seu celular, até chegar na porteira que o levará para sua casa. Seu cão o espera na porteira e assim, ele chega em sua casa, sempre depois da meia noite. Ele me conta as histórias vivenciadas nessas diárias viagens e em cada, algo singelo, de quem se esforça muito para estudar. Ouvi várias e queria ouvir mais. O farei em breve, pois ele, descubro é um bom contador de histórias. Cutucado, solta algumas e eu feliz por ter conseguido, aprendo muito com o menino.

Uma jovem estudante, menina sorridente, também mora na zona rural. Sua história até se parece com a de seu amigo. Seu ponto da parada do ônibus e na beira da vicinal que leva ao trevo da rodovia Rondon. Tem sempre alguém lhe esperando na parada e assim vai dormir. Dorme pouco, pois acordo lá pelas 5h da manhã. Seu tio a leva de carro até o ponto de ônibus e ela pega o circular para Bauru, passando as 6h. Roda aproximadamente 1h20 até descer no centro e pegar um outro circular até o Paschoalotto, onde trabalha. Sai depois das 14h, chega lá pelas 16h em sua casa, descanso pouco e logo está pronta pra ir pra escola. Pega 6 ônibus por dia, entre o trabalho e a escola. Está feliz, pois o emprego na Paschoalotto foi conseguido há apenas duas semanas e assim mesmo, tem muitas histórias para contar.

O professor, que também é médico na Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu está empolgado por ter conhecido o distrito rural e roda os 120 km rindo e montando em sua mente como movimentará os alunos naquele dia. Ele me conta que isso o move, pois para cada público, usa algo, mas gosta mesmo é destes e de quando poucos ficam no celular enquanto fala. Hoje, de uma turma de 40 jovens, somente uns 4 estavam no celular enquanto ele gesticulava e falava. Uma vitória. Uma estudante de Design, que nos acompanhou nesta noite, veio de São Bernardo do Campo estudar em Bauru e, ela vindo da cidade grande, diz estar vivenciando algo único com as ricas histórias que vivencia ali com aquela gente simples e cheia de calor humano.

O dia hoje estava encantado ou, sei lá, era eu quem estava com o radar mais atento, ligado em 120 volts, pois tudo parecia ter sentido, tudo merecia ser anotado. Preenchi duas folhas só com anotações e antes de passar todas para o papel, creio ter conseguido reunir algo valoroso, como são todas as histórias humanas. Chego em casa, quero rascunhar algumas, para não me esquecer dos detalhes e antes disso, sono já perdido, começo por aqui e termino só madrugada adentro. Essas "pedrinhas", em cada uma, muito de cada uma das pessoas e do que ouvi delas. Ouvir é tudo, até muito mais do que falar.

MAIS UMA:
Estava me esquecendo dessa. Chegamos na escola, uma festa no intervalo e dois bolos divinais, cenoura com chocolate, quentinhos, deliciosos. Era aniversário de uma professora. Descubro a história do bolo. Tudo foi feito pelo mais atento estudante da palestra, o que respondia tudo, desses querendo aprender cada vez mais e mais. Ele me conta sua história ao final da aula, nas conversações que sempre acontecem aos final de encontros dessa natureza. O bolo foi feito ali mesmo na cozinha da escola, com a permissão da Tati, a merendeira que é também praticante de hip hop, muralista reconhecida no metiê. O meninão, grandão, com a singeleza peculiar dos moradores de um distrito rural diz a mim, quando lhe pergunto quem lhe ensinou a fazer um bolo tão gostoso. "Minha bisavó quem me ensinou a fazer esse e tantas outras coisas deliciosas", me conta. Quero saber mais, se sua bisavó está viva e ele me diz, sim, com alguns detalhes adicionais. "Eu continuo aprendendo tudo o que ela me ensina". Ele contava aquilo tudo, uma história tão simples e tão bonita, tão cheia de vida e com este algo mais que só a vivência popular pode nos revelar. 

Não sei precisar qual de todas foi a mais cativante e bonita. Na pressa da escrita, acabo não revelando alguns detalhes. mas todos, grandiosos e reveladores. Não queria mais vir embora, mas a escola tinhaque fechar e os alunos pegar o ônibus que os levariam de volta para suas moradas, todos na zona rural do distrito de Tibiriçá, reduto encantador.

DUAS PESSOAS, DUAS RICAS HISTÓRIAS E AQUI SÓ UMA PONTINHA DELAS
01.) Muito amigo da cantante e encantante Audren Ruth Victorio, a convido e a arrasto para ruar fora de seus domínios. Depois de um AVC, abdicou de cantar e neste domingo, disse não querer, mas diante de tanta gente desafinada num karaokê, arriscou e foi a mais aplaudida da tarde. É daquelas que, não precisa nem da colinha para lembrar a letra, pois tudo continua bem vivo dentro de sua memória. Vê-la batendo perna, disposição renovada é pra endoidecer gente sã. Uma de minhas cantantes preferidas em Bauru.

02.) Passar toda manhã nas cercanias do campus da Unesp e presenciar Úbaiano, quarando ao sol, antes de iniciar sua jornada de trabalho, dá aquela incontida vontade de ali parar, prosear e curtir bocadinho de sol junto de tão grandioso personagem destas plagas.

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