Foi um imenso prazer ao abrir minha revista semanal, a Carta Capital, edição dessa semana, me deparar com um texto na seção “Seu País”, sobre um dileto amigo, o craque da pelota, Afonsinho, 61 anos, nascido na vizinha Marília e lançado ao futebol em Jaú (áureos tempos do XV) e que, por ter sido o primeiro jogador a obter o passe livre na Justiça e pela verve descolada, continua nas paradas. “Drible na Ditadura” é a matéria assinada por Rodrigo Martins, onde Afonsinho, o eterno craque rebelde, hoje ganhando a vida como médico do INSS, morador de Copacabana, diz com enfase que “ainda vê ecos da escravidão no futebol brasileiro atual, hoje os jogadores são reféns dos empresários que negociam com os cartolas”. Afonso ousou desafiar os clubes, comprar brigas com cartolas, reivindicar direitos, numa luta solitária, travada em plena ditadura. Continua como dantes, barbudo, irreverente, gostando das boas coisas da vida e sonhando com o dia em que a maioria dos jogadores de futebol deixará de ser tratado como gado.
Nos meus tempos de trabalho no Rio costumava encontrá-lo nos mais diferentes locais na cidade, todos ligados à área cultural, como desfiles de blocos de carnaval na Rio Branco e shows, um último de Elza Soares. Fui revê-lo em Jaú, 1998, quando o jornalista jauense Kleber Mazziero de Souza lançou um livro em sua homenagem, o “Prezado Amigo Afonsinho” (Método Editora SP). Estive no lançamento, junto com um amigo em comum, o doutor Campesi, num espaço da Câmara Municipal e a dedicatória muito me orgulha:“Queira aceitar meu abraço e minha amizade pela nossa parceria nos shows da vida”. O livro eu li numa sentada dias depois e algumas frases eu reproduzo aqui:
- “O poder absoluto impõe idéias absurdas. Alguém define que é aquilo, e pronto. Usam a ciência como biombo. Dizem: Fulano estudou, se formou, como se isso bastasse para que ele ditasse normas. Quem disse foi o professor fulano. Situação pura de subdesenvolvimento, acelerado por um regime de exceção, por uma imposição política, de poder. Até hoje a gente paga por isso”.
- “Eu tenho muita dificuldade em lidar com a violência, mas me parece que até hoje não apareceu outra maneira de resolver os problemas, de verdade, em termos sociais. (...) A sociedade humana não tem caminhado a não ser pelo meio de romper violentamente estruturas de injustiça. (...) Se ele tem razão e precisa resolver, mas quem tem o poder não abre mão, ele só consegue uma coisa que ele tem direito, tem razão, perdendo a razão”.
- “A vitória da Lei do Passe e de jogar barbudo foi sobre o poder em um momento que o povo brasileiro só conhecia derrota”.
- “Quando fiz 50 anos, me senti bem, fui preparando minha vida para um outro ritmo. (...) Diminui a velocidade. Como disse o Ferreira Gullar, são diferentes a velocidade dos rio que passa, da banana que amadurece na fruteira, da criança que está com tuberculose, daquela mulher que está sentada na rede... O mundo gira ao mesmo tempo em velocidades diferentes”.
- “As diferenças sociais não implicam em mais ou menos capacidade criadora. (...) A igualdade não impede que um seja melhor do que o outro. O que importa é que cada um possa viver na sua plenitude, ser o máximo que pode ser. (...) O que o indivíduo faz da vida dele é o que faz a felicidade”.
- “Não creio na idéia de que nada mais seja possível de se criar depois dainvenção do computador. A internet é maravilhosa mas é um meio. Não é o fim. (...) É preciso ter alguma coisa na cabeça para transmitir por ali”.
- “O ser só é em conjunto. Respeitada em toda a extensão, profundidade e atitude a individualidade de cada um. (...) Todo mundo é responsável por todo mundo. (...) Eu me arrogo o direito de emitir opinião, conversar, discutir, mas definir isso, não”.
- “Eu insisto em querer que as coisas sejam bonitas, tranqüilas,ser amável, estar atento à ação do conviver. Conviver é uma palavra chave, porque viver só, tá por fora, embora se tente. O negócio é transitar, conviver com seu semelhante, harmonizar. Tudo é diferente, as pessoas são diferentes, mas é possível conviver”.
E para encerrar, a famosa música de Gil, "Meio de Campo", na voz de Elis Regina, cantando o refrão: "Prezado amigo Afonsinho/ Eu continuo aqui mesmo...": http://www.youtube.com/watch?v=wsAXuNbwcSQ
4 comentários:
Não se fazem mais facilmente gente como o Afonso e uma raridade foi ver Elis cantando a música em sua homenagem. Bela garimpagem. Cadê o Afonso que não aparece mais por Jaú. Lembram-se do Trem da Alegria, um expressinho de velhos craques que já teve, Afonsinho e até Garrincha em seus pares. Saudades disso tudo e desse barbudo que chegou a ver Zizinho jogar em Marília, quando ainda estava nos cueiros.
JCC - de Jahu
So você mesmo para lembrar do Afonsinho. Muito bom ter notícias dele. Vou comprar a revista.
Campese
Afonsinho eu ví jogar muitas vezes. O cara sabia tudo de bola. No futebol de hoje não há ninguem que se compara a ele. A começar pela barba. Eu uso a minha há 40 anos.
Afonsinho,
Ah Afonsinho.
Você não me conhece, mas, sou de Jaú.
Você marcou muito na minha vida, o gosto de jogar futebol.
Ah, tem tantas histórias. Não dá para contar agora.
Estudei no Grupo com nome do teu Pai, não por acaso, porque já te idolatrava.
Meu amigo (Pedro Barbieri, lembra-se Afonsinho dele, aquele que corria de lambreta pelo São Benedito) disse....João, para que isto, o Cara não sabe nem quem Você é, etc...
Eu disse, Deus sabe e um dia Ele vai saber.
Sou João Angelo Frari
Me sinto bem sucedido, e Você Afonsinho, sem saber, fez parte disso.... somos vencedores.
Jaú, Jundiaí, Bocaina, Campinas e até hoje, minha familia, parentes, moram em Jaú.
Abraços e Saúde.
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