segunda-feira, 3 de junho de 2013

FRASES (106)

O “CORIFEU” APARECEU NO MEU PORTÃO E DIZ TER VINDO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
Domingo, 02/06, 17h20 estava assistindo ao jogo pela TV entre Brasil X Inglaterra e a campainha toca. Em casa somente eu e o pai, uma garoa insistia em cair durante o dia todo por toda Bauru.  Ao abrir a porta, vejo de longe o semblante de um velho conhecido, CORIFEU. No instante em que me dirigi até o portão  me passou pela memória, como um click rápido, tudo o que vivenciei quando consegui, com a ajuda da jornalista Cristina Camargo, então no Bom Dia Bauru, em março de 2009, retirar das ruas o então mendigo JOCELINO REUS RODRIGUES DA SILVA e devolvendo-o para sua Itaqui RS. A história toda pode ser revivida clicando no link a seguir: http://mafuadohpa.blogspot.com.br/search?q=itaqui.

CORIFEU vive nas ruas. O conheci ano passado, quando meu filho prestava vestibular e numa tarde de domingo fui busca-lo lá na praça defronte a ITE. Um barbudo, sujo e falante me abordou e como cheguei adiantado para buscar o filho, engrenei uma longa conversa com esse cara de nome com origem grega. Impossível alguém com um nome desses, com o pai tendo escolhido um nome desses para seu filho não ter uma trajetória interessante e algo a ser resgatado e revivido.  Ninguém escolhe um nome desses gratuitamente para um filho. Olhem o significado de corifeu para a Tragédia Grega: “Para entreter os participantes das festas bacantes, ajudando a passar o tempo, eram organizadas pequenas encenações, ora dramáticas, ora satíricas, coordenadas por um corifeu. Este torna-se um personagem chave na deflagração da encenação, apresentando-se como o mensageiro de Dionísio. Acompanhava-o um coro que tinha a função de externar por gestos e passos ensaiados os momentos de alegria ou de terror que permeavam a narrativa. O corifeu e o coro são os elementos básicos do Teatro, formam o ponto de partida da encenação que mais tarde assumirá algumas alterações bem definidas”, do site http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/tragedia_grega3.htm .

Lembro bem do dia em que o conheci, mudou pouca coisa, barbudo, sujo, olhos bem claros, denotando querer conversar, contar algo, mas com receio. Naquele dia lhe disse: “Corifeu, que quer dizer isso mesmo?”. E ele me explicou, falou do teatro e até do brasileiro Corifeu de Azevedo Marques, que virou nome de rua em São Paulo. Disse-me que qualquer dia me contaria sua história. O reencontrei várias vezes e em todas, um rápido papo e a promessa: “Qualquer dia te conto algo de minha vida”. A última vez foi num sinal de trânsito, ele pedindo grana e sempre me dizendo: “A gente se encontra por aí e conversamos”.

O dia foi hoje. Esqueci até do futebol na TV e lhe entreguei o que queria, um lanche e uma blusa para o frio. Corifeu agora sabe onde moro, sabe onde me encontrar e assim sendo, especulei mais sobre ele enquanto comia. “Vamos bater aquele papo hoje?”, disse. Disse pouco, primeiro seu nome CORIFEU DI FIGUEIREDO ZANARDI, 33 anos e ter nascido e morado até dois anos atrás em São José do Rio Preto, uns 330 km de Bauru. Tem o colegial incompleto, trabalhou até quanto pode como eletricista de manutenção e depois bateu asas. Quando lhe pergunto onde reencontrá-lo, me diz: “Não paro em lugar nenhum, não dá para dormir sempre no mesmo lugar e nem marcar bobeira. Estou por aí, em Bauru”. No fechamento da conversa algo marcante, quando diz algo a respeito das imediações desse lugar onde moro e onde ele escolheu para se abrigar: “Nem sei porque não sai disso, mas uma coisa te digo, esses trilhos, essa linha de trem aqui seguram a gente de uma forma que não sei explicar”. Qual o significado disso? A reunião dos iguais, o ponto dos craqueiros... não sei. Sei é que me bate algo desalentador quando vejo muitos iguais a ele caminhando pelos trilhos urbanos, enfiando-se num destino sem volta, sem eira nem beira. Jocelino também me falava dos trilhos.

Eu não perguntei mais nada, chovia e Corifeu queria circular. Não sei se é mendigo ou craqueiro, o que sei é que é um cara bem lúcido, forte, com algumas desilusões e não encontrando forças para reencontrar seu caminho. Pedi para tirar as fotos e ele me disse que sendo para mim deixaria. Disse o que faria com elas, que as publicaria na internet e enviaria para endereços de Rio Preto. Ele não se opôs, mas me disse algo: “Não faça isso hoje, tá bom?”. Iguais ao Corifeu são muitos, aliás, um atrás do outro, cada um com uma história diferente. Semana passada fico sabendo o nome da moradora de rua e craqueira, uma que dorme na calçada de casa, a ANDREZA OLIVEIRA CAETANO, 35 anos e três filhos. Hoje, pego os dados do Corifeu, amanhã os passo adiante e nem sei como anda o JOCELINO, pois depois que o vieram buscar, sei somente que está em Itaqui, pois o pessoal da Prefeitura de lá me ligam de vez em quando. Eu tento cá do meu canto, ao meu modo e jeito ir mostrando para esses tantos, que nem tudo está definitivamente perdido. O Corifeu, como todos os demais, não merecem viver do jeito que vivem.

5 comentários:

Anônimo disse...

Já vi ele pelo centro algumas vezes .. LEANDRO GONÇALEZ

Anônimo disse...

Grande Henrique, humanista... Gente na rua, não "da" rua...

Ontem à noite na NBR canal de tv fechado do Governo Federal, houve uma roda de conversa sobre este assunto: o Ministério da Saúde implantará ainda este ano mais de 200 consultórios de rua, para atender - aos moldes do programa saúde da família, as pessoas que estão vivendo nas ruas. O mais interessante na minha opinião foi a maturidade com que os técnicos lá presentes (Uma pesquisadora da Fiocruz; uma técnica do governo do Rio de Janeiro - melhor programa nacional para este público - e um consultor do MS) a abordagem se fosse o mesmo entendimento nos municípios...estaríamos com respostas mais dignas a esta população....Mais de 30 anos sem investimento correto.
Rosa Morcelli - Cuiabá

Anônimo disse...

Henrique

A Sebes através da sua equipe deveria fazer um levantamento dessas pessoas, com os dados e buscar entrar em contato com a família. No caso , eu sou de São José do Rio Preto e temos a família Zanardi, inclusive um colega adovgado.

Maria Cristina Zanin Sant'Anna

Anônimo disse...

Derviches, não são só aqueles que rodopiam na Turquia, são tb homens santos que abrem mão de suas rela ções materiais e saem errando pelo mundo em crescimento espiritual.
Baksheesh é a esmola obrigatória, um tipo de indulgencia espiritual, nos países orientais. Aqui é só sofrimento, o abandono do mundo se da pela decepção ser maior e a capacidade de participar daquilo que se abomina é menor mesmo.

Márcia Nuriah

Anônimo disse...

É meu amigo Henrique. Tú és grande porque és humilde!

DuílioDuka de Souza