UM DIABÉTICO EM TRÂNSITO*
(*Saiu a edição 266, da Revista do Caminhoneiro, com meu terceiro texto, publicado na seção "Beira de Estrada". É um luxo ler lá que a tiragem é de 100 mil exemplares, tudo auditado pela PrinceWaterhouseCoopers. Busquei inspiração para esse texto em experiências vividas com meu pai diabético, o qual cuido com muito carinho e atenção. A ilustração é do amigo reginopolitano, Fausto Bergocce).
Com seu Evaristo tudo se sucedeu da exata forma que irei relatar. Aprendeu a conviver com a diabetes desde que a mesma foi-lhe diagnosticada aos 13 anos. Sentia umas sensações estranhas, tipo um pequeno mal estar, confirmadas logo a seguir por uma diagnóstico assustador, diante dos seus pais, proferidas por um médico de Posto de Saúde pública. “Você é diabético, menino. Daqui para a frente sua vida terá que ser regrada, aprenda isso. Esqueça tudo o que já fez, pois tudo será diferente daqui para frente”, lhe profetizou o tal doutor, quase sem lhe direcionar o olhar.
Do susto inicial, que poderia ter se transformado num trauma, logo constatou que o “bicho” não era assim tão feio. Aprendeu a conviver com a tal vida regrada. Lá se vão 40 anos dessa descoberta até os dias atuais, onde dirige um caminhão pelas estradas paulistas, transportando laranja. “Carrego comigo o que chamo de tralha. É uma espécie de embornal de primeiros socorros, pois sem eles não vivo. Nele tudo o que necessito, desde as seringas descartáveis, a insulina e alguns comprimidos regulatórios”, começa seu relato.
O encontro ocorre num posto, desses perdidos na imensidão desse país continente e vendo-o com aquelas frasqueira, cheia de gelo, foi o suficiente para me interessar por sua história. Logo de cara veio me questionar: “Você também não está me confundindo com drogado, né?”. Disse que não e ele continuou: “É que fui confundido com um, também pudera, manuseando essas seringas descartáveis por aí. Não gosto de fazer isso em público. Evito, mas tem momentos que não posso esperar mais. Numa dessas, um sujeito ao me ver com uma na mão, pronta para a auto-aplicação, ligou para a polícia. Até explicar que focinho de porco não era tomada, juntou gente e no final, nem vi a cara do denunciante direito, sumiu, acho que de vergonha”.
Evaristo não é o único diabético no volante, nem gosta de ser visto como um mártir. É apenas mais um trabalhador brasileiro, como outro qualquer, com uma limitação controlável e assim sendo, toca seu barco, segue sua vida e rotina de trabalho. Uma vez por mês passa pelo Posto de Saúde de sua cidade, onde através de um programa federal recebe gratuitamente os medicamentos, incluindo as seringas e lancetas para medir a glicose no sangue. O Posto estabelece uma data para ir buscar e rever o médico, porém nem sempre consegue cumprir. No seu caso, como caminhoneiro, o recebem numa outra data. Um luxo, que ele agradece.
“Faço as aplicações duas vezes ao dia. Logo ao acordar, antes do café da manhã e duas horas após o jantar, pouco antes de deitar”, conta. Outra particularidade é o não descarte desse material em qualquer lixo. Junta tudo dentro de uma garrafa pet de refrigerante, dessas grandes, dentro da boléia do caminhão, desde as seringas, fitas e agulhas usadas, todas com resquícios de sangue. “Aprendi isso numa reunião lá no Posto de Saúde. Produzo um lixo diferenciado e existe um lugar específico para seu descarte. Todo mês, levo a garrafa cheia e entrego a eles. Dou risada, pois além do lixo diferenciado, digo a eles que produzo um lixo viajado, pois viajo com tudo de um lugar para outro”, explica.
Essa é a vida de Evaristo, diariamente pelas estradas, contornando seu problema da melhor forma possível e tirando lições do que poderia ser o grande percalço de sua vida. “Eu não reclamo de nada. Sofro um pouco, tenho limitações, mas não me entrego. Resisto e sigo em frente. O que tenho não me impede de trabalhar no que gosto e sei fazer. Tenho uma família linda e controlo a diabetes da melhor maneira possível. Que mais poderia querer da vida?”, diz pouco antes das despedidas.
Com seu Evaristo tudo se sucedeu da exata forma que irei relatar. Aprendeu a conviver com a diabetes desde que a mesma foi-lhe diagnosticada aos 13 anos. Sentia umas sensações estranhas, tipo um pequeno mal estar, confirmadas logo a seguir por uma diagnóstico assustador, diante dos seus pais, proferidas por um médico de Posto de Saúde pública. “Você é diabético, menino. Daqui para a frente sua vida terá que ser regrada, aprenda isso. Esqueça tudo o que já fez, pois tudo será diferente daqui para frente”, lhe profetizou o tal doutor, quase sem lhe direcionar o olhar.
Do susto inicial, que poderia ter se transformado num trauma, logo constatou que o “bicho” não era assim tão feio. Aprendeu a conviver com a tal vida regrada. Lá se vão 40 anos dessa descoberta até os dias atuais, onde dirige um caminhão pelas estradas paulistas, transportando laranja. “Carrego comigo o que chamo de tralha. É uma espécie de embornal de primeiros socorros, pois sem eles não vivo. Nele tudo o que necessito, desde as seringas descartáveis, a insulina e alguns comprimidos regulatórios”, começa seu relato.
O encontro ocorre num posto, desses perdidos na imensidão desse país continente e vendo-o com aquelas frasqueira, cheia de gelo, foi o suficiente para me interessar por sua história. Logo de cara veio me questionar: “Você também não está me confundindo com drogado, né?”. Disse que não e ele continuou: “É que fui confundido com um, também pudera, manuseando essas seringas descartáveis por aí. Não gosto de fazer isso em público. Evito, mas tem momentos que não posso esperar mais. Numa dessas, um sujeito ao me ver com uma na mão, pronta para a auto-aplicação, ligou para a polícia. Até explicar que focinho de porco não era tomada, juntou gente e no final, nem vi a cara do denunciante direito, sumiu, acho que de vergonha”.
Evaristo não é o único diabético no volante, nem gosta de ser visto como um mártir. É apenas mais um trabalhador brasileiro, como outro qualquer, com uma limitação controlável e assim sendo, toca seu barco, segue sua vida e rotina de trabalho. Uma vez por mês passa pelo Posto de Saúde de sua cidade, onde através de um programa federal recebe gratuitamente os medicamentos, incluindo as seringas e lancetas para medir a glicose no sangue. O Posto estabelece uma data para ir buscar e rever o médico, porém nem sempre consegue cumprir. No seu caso, como caminhoneiro, o recebem numa outra data. Um luxo, que ele agradece.
“Faço as aplicações duas vezes ao dia. Logo ao acordar, antes do café da manhã e duas horas após o jantar, pouco antes de deitar”, conta. Outra particularidade é o não descarte desse material em qualquer lixo. Junta tudo dentro de uma garrafa pet de refrigerante, dessas grandes, dentro da boléia do caminhão, desde as seringas, fitas e agulhas usadas, todas com resquícios de sangue. “Aprendi isso numa reunião lá no Posto de Saúde. Produzo um lixo diferenciado e existe um lugar específico para seu descarte. Todo mês, levo a garrafa cheia e entrego a eles. Dou risada, pois além do lixo diferenciado, digo a eles que produzo um lixo viajado, pois viajo com tudo de um lugar para outro”, explica.
Essa é a vida de Evaristo, diariamente pelas estradas, contornando seu problema da melhor forma possível e tirando lições do que poderia ser o grande percalço de sua vida. “Eu não reclamo de nada. Sofro um pouco, tenho limitações, mas não me entrego. Resisto e sigo em frente. O que tenho não me impede de trabalhar no que gosto e sei fazer. Tenho uma família linda e controlo a diabetes da melhor maneira possível. Que mais poderia querer da vida?”, diz pouco antes das despedidas.
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