segunda-feira, 15 de abril de 2013

MÚSICA (100)

GRAVIDEZ POPULAR NA VENEZUELA E LATIFÚNDIO NO CALÇADÃO DE BAURU
Hoje, segunda, dia de labuta, acordo e escrevo logo que soube da notícia ao abrir os jornais pela manhã (sim, só soube hoje, ontem fui dormir cedo): “Bom dia a todos e todas - A SEMANA VAI SER BOA DEMAIS, POIS O PEDACINHO INSURGENTE LÁ DO ALTO DA AMÉRICA LATINA CONTINUA SOBERANA E MADURA. Abracitos cordialíssimos do HPA”. Foi inevitável outra coisa, amanheci lembrando de Gonzaguinha e de um famoso refrão, numa de suas músicas: “Eu vi o povo na rua em plena gravidez...”. Pois é exatamente o que acontece na Venezuela, o povo na rua em plena gravidez. Lá, Chávez mostrou aos menos favorecidos que eles tinham direito ao seu quinhão, que eles podiam e deviam deixar de ser massa de manobra, que com conhecimento de causa podiam sair da quietude e promover um barulho danado, de fazer doer os ouvidos dos opressores. E um povo que enxerga até onde pode ir, dificilmente volta atrás.

Tenho aqui no mafuá, todos os LPs do Gonzaguinha e um deles, o ‘GRÁVIDO’ (EMI ODEON, 1984). A música que vos falo é GRAVIDEZ, sintam a força de sua letra: “Meninos eu vi/ o povo nas ruas/ querendo dar à luz / para quem quisesse ver/ para quem quisesse / ganhar o brilho da luz/ meninos eu vi/ o povo nas ruas/ querendo dar o sol/ para quem quisesse ver/ para quem quisesse / ganhar o brilho do sol/ bebi com eles/ a coragem das cores/ na avenida brasil/ aprender a colorir/ ergui com eles um brinde/ ao futuro/ sem o medo Brasil/ caminhar e color rir/ meninos eu vi/ que luto não é pra chorar/ é um verbo pra viver feliz/ Meninos eu vi/ o povo nas ruas/ em plena gravidez/ para quem quiser saber/ para quem quiser ganhar/ aos filhos dessa gravidez”.

Na sequência do dia algo muito triste, mais um artista proibido de praticar seu ofício no LATIFÚNDIO em que deixamos o Calçadão da Batista se transformar. “Eles”, os que se acham donos, querem impor as condições para o uso daquele espaço, daquelas quadras. No sábado, Marcílio, o eterno Chaplin de nossas ruas, dessa vez com outro personagem e para suprir suas necessidades é retirado do local. O produtor cultural Kyn Jr, fica sabendo do assunto e promete espernear junto do artista. O relato do Kyn: O NOSSO QUERIDO ARTISTA MARCÍLIO É COLOCADO PARA FORA DO CALÇADÃO BATISTA DE CARVALHO PELA POLICIA MILITAR, EU NA MINHA FUNÇÃO EM EXERCÍCIO DE PRESIDENTE DA ATB - ASSOCIAÇÃO DE TEATRO DE BAURU E REGIÃO E MEMBRO DO CONSELHO DE CULTURA DE BAURU IREI COBRAR UMA RESPOSTA DAS AUTORIDADES LOCAIS - Artigo 215 da Constituição Federal: O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura nacional, e APOIARÁ e INCENTIVARÁ a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Na foto ele quando estava panfletando na dominical feira da Gustavo, reencontra Marcílio, tiram a foto e a promessa de que o barulho terá continuidade.

Aqui a falta total de um povo em eterna gravidez, pois se assim ocorresse nessa sacrossanta cidade, algo de mais contundente já deveria ter sido feito. Isso nem é caso de desobediência civil, sendo de OBEDIÊNCIA À CONSTITUIÇÃO. Os artistas de rua, como o Marcílio precisam ter em mãos um documento, talvez emitido pela própria ATB, orientando-os de que a rua continua do povo, pelo povo e para o povo e se alguns assim não entendem, lhufas a eles. Artistas de rua são um colírio para os olhos e mentes, mas só as arejadas. Quando me deparo com alguns desses paro tudo e fico por instantes numa admiração contemplativa de lacrimejar os olhos. Travam uma labuta diária das mais dolorosas, como a que qualquer trabalhador produz, só que a deles com uma dor a mais embutida, pois ali não existe carteira assinada, nem contrato de trabalho, existe o trabalho do artista, um chapéu exposto e o povo olhando, parando quando se interessa. Os que vivem disso merecem muito mais do que meras moedas atiradas ao chapéu, depositadas numa urna na beira da calçada. Bauru tem vários desses, hoje a história de um deles.

MARCÍLIO DO NASCIMENTO tem 50 anos e exerce o ofício de artista. Veio de Minas Gerais e acabou por gostar daqui, acabou ficando e por anos trabalhou na construção civil. Muito popular na cidade como o Chaplin, hoje segundo ele, “uma Ferrari, pouco contratada”. Na tentativa de viver de sua arte cria sempre novos personagens e os expõem onde ainda isso é permitido. Sábado passado descobriu que a sua Boneca não poderia mais pisar os pés no Calçadão da Batista, pois fiscais o impediram de ali permanecer e ganhar seus caraminguás. A Boneca é algo lúdico, quando entrega mensagens para as pessoas, que a leem e depois depositam, quando querem, algo em troca dentro de uma urna. Vive disso, mora numa pensão, quarto pequeno, sem comodidade nenhuma, tentando e tateando espaços. Alegre, bonachão, de bem com a vida, enfrenta isso tudo com galhardia, pois sabe que fiscais passam e sua arte permanece. No último sábado encontrou alguém para lhe defender, o Kyn da ATB e assim prossegue, com uns a defendê-los, outros a espezinhá-lo e outro tanto a admirá-lo. Ele descobriu meio sem querer que o Calçadão bauruense é uma espécie de LATIFÚNDIO, faltando ali uma mera cerca para fazer jus ao que lá acontece. Marcílio, mesmo sem o saber é um belo de um colírio para nossos olhos, pois pratica uma pulsante arte, ralando e sendo ralado, sobrevivente do que ainda nos resta de alegria nas ruas.

6 comentários:

Anônimo disse...

Henrique, quando do bloco carnavalesco vcs tiveram a grande oportunidade de reverter o que acontece na Batista de Carvalho, mas tiveram o problema pessoal resolvido e ficaram satisfeitos. Repito agora o que disse lá: o caso é para ser levado ao Ministério Publico, a livre manifestação artística é garantida pela constituição. O Kyn sozinho não conseguirá muita coisa ele necessita de apoio, vc está interessado em apoia-lo ou via ficar no blá blá blá dos lindos escritos? Estou, daqui de longe, buscando assessoria jurídica para orientá-lo, assim como fiz contigo. "abracitos"

Carlos Eduardo Martins

Mafuá do HPA disse...

caro Carlos

Concordo contigo, não adianta ficar só escrevinhando. O buraco é mais embaixo. Prepare a ajuda pela aí, que instigarei por aqui a ida com um grupo ao Ministério Público. Proponho desde já ao Kyn e a quem quiser se juntar a nós, uma trupe daquelas bem desorganizadas, mas com propósitos bem definidos e uma sacudida nessa cerca. Vejo também um ato coletivo dos artistas na rua, num sábado próximo, quando todos poderão expor o que pensam sobre o assunto. E é claro, tudo numa quadra do Calçadão.

Henrique - direto do mafuá

Anônimo disse...

Bizarrice triste, seleção aleatória: há semanas tem um 'artista de rua' tocando violão, cantando e ganhando dinheiro no calçadão. Ele reveza as quadras, talvez assim demore pra ser repreendido rsrs

ARAN - EXTINÇÃO DISCOS

Anônimo disse...

Falou Henrique, sabia que podia contar contigo, dê uma super força para o Kyn, já passei para ele umas indicações da Margareth.
Carlos Eduardo Martins

Anônimo disse...

Henrique, você como um bom notívago e profundo apreciador da noite bauruense e frenquentador dos bons barzinhos, deve conhecer, já viu ou já ouviu falar do RICKY STONES. Pois é, ele merece ser integrante de sua coluna facebuquiana: PERSONAGENS SEM CARIMBO – O LADO B DE BAURU. Tenho um contato no face que é sobrinha dele. "Abracitos"
Paulo Roberto Proença

Mafuá do HPA disse...

Paulo, me dê o contato, pois o Rick é figura impar da MPBauruense.

Henrique - direto do mafuá