domingo, 2 de fevereiro de 2025

FRASES DE LIVRO LIDO (212)


MEU PRIMEIRO LIVRO LIDO EM FEVEREIRO É UM REVERENCIANDO O "PASQUIM"
Não escondo de ninguém, sou discípulo fervoroso do velho e saudoso Pasquim. Tempos atrás, Márcia Buzalaf, emérita professora em Londrina, com lindo trabalho acadêmico feito contando em detalhes da censura no hebdomadário carioca, me dizia: "Releio e hoje vejo, eles foram demais de machistas". Sim, ela e eu reconhecemos isso e muito mais, o que não tira o brilho do que fizeram pela imprensa e dentro dela no país. Propiciaram algo inovador em muitos sentidos e eu, cá com essa devoação, acabo por devorar tudo o que me cai nas mãos. Desta feita, um livro descoberto, comprado e devidamente devorado, através da Estante Virtual, o "RATO DE REDAÇÃO - SIG E A HISTÓRIA DO PASQUIM", do jornalista gaúcho Márcio Pinheiro.

Já li muita coisa sobre a representatividade d'O Pasquim, mas este, confesso, me impressionou. Uma riqueza de detalhes e um texto primoroso, saboroso e encantador. Enfim, continuar desbravando o que foi e representou esse semanário na vida da imprensa nativa. Da loucura vislumbrada quando de seu lançamento, sucesso imediato, carisma e tudo que envolveu seus ricos personagens, até a derrocada final. Eu, como tantos, sempre sonhei em ter um jornal pra chamar de meu e se o tivesse, me espelharia no formato do velho Pasca, cheio de colunistas, todos escrevendo o que quisesse e com paginação e ilustrações convidativas para o leitor. O modal papel definhou, mas o sonho, meu e de tantos outros permanece vivo, pois dias atrás, Pedro Romualdo instigava alguns na cidade para levantarmos a bunda da cadeira e corajosamente darmos vida ao BASTIÃO, que nada mais é do que uma espécie de Pasquim, século XXII, porém, com corpinho e inspiração em algo que colecionamos e guardamos em nossas estantes pra toda a vida.

O livro, só mesmo lendo. Rever os nomes todos que compuseram a experiência, bem no auge da ditadura militar, o proposto e como conseguiram o grande feito é salutar. Desses livros que, para mim, dizem muito, me tocam fundo, pois tenho muitos exemplares do Pasquim até hoje em casa. Comecei a comprá-los nos meus 13 anos, 1973 (a primeira edição chegou às bancas em 26/06/1969), portanto, façam a soma, de quanto tempo os guardei e de como aquilo modelou minha cabeça. Tive a sorte de dar de cara com o jornal na banca lá na praça Machado de Mello e toda semana, religiosamente, o comprei desde então, até seu último exemplar. Depois o fiz com a revista Bundas e também, o Pasquim 21, que tenho todos. Haja espaço para guardar tudo, mas não consigo me desvencilhar destes, por nada neste mundo. Meu Mafuá os abriga.

Algumas frases gileteadas do livro:
- "O sonho de todo jornalista é ter um jornal. Viver sem patrão, sem imposições ou censuras, sem compromissos com questões comerciais e/ou industriais. Sem limite de espaço para emitir suas opiniões e expressar a sua verdade como ela é vista. Também sem exigências ou regras - exceto as ditadas pela consciência e pela busca do bem comum. As convições a serviço dos mais elevados interesses".

- "...se destacava basicamente por dois pilares: a qualidade do texto e força de opinião. O Pasquim era um jornal de análise, de opinião, ainda que estas viessem permeadas pelo humor, pelo deboche, pela ironia e pelo que poderia haver de mais anticonvencional e surpreendente".

- "Todos sob o comando tirÂnico, mercurial, divertido e porra-louca de Tarso de Castro, editor chefe aos 17 anos. (...) Sergio Augusto credita quase todo o sucesso inicial ao fato de ele ser porta voz das turmas, tribos e esquerdas festivas de Ipanema. (...) Um oásis de inteligência, bom humor e busca insaciáveis pelo prazer no meio de um Brasil caótico e reprimido. (...) Humorístico, o Pasquim era também informativo".

- "Tiramos o terno e gravata das entrevistas, definiria Jaguar. Isso significava deixar o texto menos empolado. (...) Tudo se construia na base do improviso. (...) Tudo o que ele não oferecia era padronização. Cada autor poderia ter seu estilo e isso merecia ser mantido e respeitado. (...) Dava a impressão de ter vários pequenos jornais dentro de um jornal maior".

- "Em 1970, com menos de seis meses de existência, o jornal já havia inscrito seu nome na história da imprensa brasileira. E com a fama viriam as pressões. Agora a barra iria pesar mais ainda. (...) a partir do nº 66, o jornal lançou a escolha do Homem Sem Visão do Ano. (...) fechar uma edição era uma costura de egos e exigências a atender. (...) henfil criou o cemitério dos mortos-vivos, sepulcrário, onde o cartunista enterrava todos aqueles que não se adequavam ao seu padrão de resistência e crítica aos militares".

- "Aos 17 anos, Leila Diniz, entre tantos símbolos - de mulher liberada, desbocada, inovadora, independente -, havia sido a musa maior do Pasquim. (...) por causa da censura, em média, uma edição consumia o trabalho equivalente a três edições. (...) era ainda um paradoxo ser uma jornal avançadop em matéria de política e ideologia, mas atrasado no aspecto comportamental".

- "Idos de 1983, o Pasquim perdido não sabia mais nem olhar o caminho que já havia sido trilhado. Se soubesse, teria certeza de que a única fórmula para recuperar os dias de glórias seria uma síntese entre as duas linhas, investindo na cobertura política sem descambar para a caretice e sem descuidar do bom humor. E o principal: sem se engajar a um projeto político, fosse ele pessoal ou partidário. (...) O Pasquim ficara moderno demais para os conservadores e conservador demais para os modernos".

- "O Pasquim daria seu último suspiro com a edição 1072, publicada em 11 de novembro de 1991. Morreu vítima de insuficiência de anunciantes, de colaboradores de peso, de leitores e de credibilidade".

FAUSTO, REGINÓPOLIS, CARICATURAS ESPALHADAS PAREDES DA CIDADE
Meu amigo Fausto Bergocce é um inquieto cidadão. Saiu de sua Reginópolis muito cedo, ganhou o mundo, mas não consegue tirar a aldeia onde nasceu de sua cabeça. Volta sempre, para se recarregar, rever os lugares e pessoas. Quando por lá, faz e acontece. Cria sempre sarna pra se coçar. Tempos atrás desenhou, com consentimento da família, a caricatura de um dos pioneiros da cidade, bem no frontal da casa onde este residiu. E assim seu Inácio Cerreiro foi imortalizado também numa parede da cidade. Isso foi anos atrás e agora ao voltar, a pintura já fraca, desbotada. Comprou tinta, pincel e a retocou. Seus proprietários, percebam pelas fotos, pintaram as paredes novamente, mas rodearam a pintura, fazendo questão de não cobrí-la. E depois me disse: "Adoraria ficar fazendo o mesmo cidade afora, revendo e demarcando onde morou figuras que fizeram a história de Reginópolis". 

A situação econômica por lá não é das melhores e Fausto tem que voltar pra onde mora, Guarulhos. A ideia continua plantada e seria uma espécie de roteiro turístico na pequena e bonita cidade. Fico imaginando como ficaria, toda com sua gente pintada em suas paredes. Um projeto grandioso e que poderia até contar com uma dessas leis de incentivo, movendo céus e terra para viabilizá-lo. Fausto não quer ganhar grana com isso, nem notoriedade, quer é fazer sempre algo mais pela sua aldeia, o lugar onde nasceu e continuará amando enquanto existir. E se não aproveitarem, a gente sabe, ninguém é eterno. Projetos dessa magnitude poderiam ser estendidos para tantas outras cidades, com seus artistas loucos para ser, fazer e acontecer. Que o exemplo do Fausto lá na sua Regipa inspire outros tantos para encher as paredes de nossas cidades com belas lembranças de nosso passado.

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