quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

BEIRA DE ESTRADA (31)


BIOGRAFIAS NÃO AUTORIZADAS DO LADO B DE BAURU (02) – publicado no jornal mensal Metrópole News (do Vinicius Burda), nº 7, janeiro 2014.
HILDA SE SOUZA, A CATADORA A MERECER UMA JUSTA HOMENAGEM
Janeiro é mês emblemático dentro do ano, que pelo visto começa a partir de março, depois do Carnaval.  Ano passado, uma das ocorrências repetidas quase que semanalmente na Casa de Leis bauruense foi a entrega de MOÇÕES DE APLAUSO para pastores evangélicos, todos com ligação umbilical com o que pensa e age o atual e o anterior presidentes. Fizeram da Câmara uma extensão de suas atividades como pastores. Isso causou transtornos, malentendidos, fuxicos e muito descontentamento. Afinal, por que só pastores seriam os merecedores dessa honraria...

Ao invés da repetição dessas Moções somente para pastores, afinal, acredita-se que todos já foram agraciados, a Câmara de forma edificante poderia homenagear as pessoas mais simples, as "carregadores de piano", que são muitas e na maioria das vezes esquecidas e até menosprezadas. Imaginem a cada semana (ou até com um espaçamento maior), uma homenagem renovada, uma MOÇÃO DE APLAUSO PARA OS QUE REALMENTE DIGNIFICAM BAURU.

Na ideia inicial (encampada pelo vereador Roque Ferreira), pessoas das mais dignas, dessas que trabalham muito, são vistas pela cidade inteira e dão seu quinhão de contribuição para Bauru ser o que é. Penso inicialmente em DONA HILDA DE SOUZA, a famosa catadora de papéis do centro da cidade. Essa senhora, com seu carrinho de mão ajuda de forma substancial a limpar o centro de nossa cidade, teve sua residência incendiada recentemente, sustenta toda sua família com o que arrebanha na porta dos estabelecimentos comerciais, está sempre a sorrir e com os seus mais de 60 anos, se mostra alguém a merecer uma honraria e o reconhecimento dessa cidade. Hilda personifica o trabalhador que carrega seu instrumento de trabalho com a força do próprio punho. Com ela poderia ser dado o pontapé inicial para um projeto grandioso, o de valorizar essas pessoas a circular por nossas ruas. Depois, muitas outras e as sugestões ficam em aberto, pois nomes é o que não nos faltam.

A seguir um pouco mais dessa valorosa batalhadora. O nome dessa batalhadora deveria ser Desbravadora, Guerreira e Persistência, pois sua vida toda foi uma intensa luta pela sobrevivência. Criou todos os seus filhos com a força do seu braço, coletando objetos pelas ruas da cidade, sem dó e piedade, levantando seu lar e dando de comer aos seus. Aos 67 anos, figura muito conhecida de nossas ruas, forte como tem que continuar sendo, busca forças diárias para empurrar o seu carrinho pelas ruas e ganhar o seu sustento. Há 35 anos está catando reciclados e vivendo disso. Possui um vozeirão de impressionar, forte e contundente, daqueles que fere quem está ao seu lado, pela imponência. É uma mulher decidida, líder comunitária onde mora, no Fortunato Rocha Lima, de onde não sai de casa para quase nada, a não ser o trabalho e ir à igreja. Possui uma risada e uns dentes de fazer inveja e uma conversa envolvente, como todas as pessoas que não têm nada a esconder. É de uma sinceridade impressionante, não gosta de fotos, muito menos as tiradas quando está com o seu objeto de trabalho, o carrinho. No seu rosto as marcas do último embate, dessa vez com uma panela de pressão que explodiu perto de sua face. Não permite concessões ao seu modo de viver. Quem a conhece sabe o que quero dizer, ela é desse jeito e pronto. Uma mulher de fibra, numa atividade aviltante, como a grande maioria dos desvalidos desse país.

OUTRAS BIOGRAFIAS, TODAS PERSONAGENS LADO B DE BAURU:
MARINA GIORDANO é uma senhora de fino trato, trabalhou a vida toda em diversos e variados lugares, como a Drogasil, Sampaio, Mappin e outros, até conseguir a justa aposentadoria. Aos 72 anos, moradora do Mary Dota, goza do benefício de não mais pagar ônibus circular urbano e assim vem para o centro fazer o que gosta. Mas de que gosta dona Mariana? Ele possui uma coleção de aproximadamente mil discos, que ouve regularmente em sua vitrolinha e está sempre a cata de novidades. Sua preferência, mambo, salsa e os do Rolando Boldrin. Coleciona xícaras e circula pela Feira do Rolo em busca de novidades, trazendo sempre outras para troca. Ali naquele reduto, traz livros já lidos e vai os trocando pelos ainda não lidos. Na bolsa, diz sempre manter um, o que lê no momento. Viúva há 25 anos, esses seus passatempos, essa sua forma de encarar a vida e pelo sorriso ostentado, aparenta ser feliz e fazer o que gosta. Irmã do famoso Marron, lá do Pé de Valsa, ela ainda revende Avon nas horas vagas e de sombrinha em punho, para enfrentar as agruras do calor bauruense, diz sem medo de ser feliz, que a vida não tem lhe sido ingrata. Lépida, fagueira, dona Marina sabe o que faz.

CLAÚDIO DE SOUZA é um sujeito com a cara da felicidade estampada no sua face (como é fácil fazer com que as pessoas possam ser felizes). É o personagem representando o juiz na peça, todo de preto, algo surreal (talvez um Joaquim Barbosa dos tempos idos), estripulias mil no palco. Aos 48 anos, Cláudio diz amar o teatro. Mora longe, lá no Santa Edwirges e trabalha num suado batente na empresa Nova Era Empreendimentos Industriais, lá no Distrito Industrial I, defronte a Sukest. Sua função é a jardinagem, ofício aprendido ao longo dos anos e desenvolvido com maestria e sapiência. Bolou esquetes de 15 minutos cada, texto dele mesmo e não tendo onde apresenta-los, pede ao patrão se não pode fazê-lo no horário de intervalo, mostrando aos seus colegas de trabalho um bocadinho de sua arte. Licença concedida, ele diz que no início foi motivo de olhos atravessados, mas hoje, não querem que ele pare mais. E ele continua. Meses atrás foi atrás de Paulo Neves, mostrou a gravação de alguns deles e disse que queria fazer teatro de verdade, ter o registro da categoria. Essa foi sua estreia e a alegria o invadiu por inteiro. Deu o melhor de si. Suou a cântaros. Contou sua história para todos que tiveram a disposição de ouvi-lo e agora, gelo quebrado, quer expor suas gravações no youtube, facebook e buscar outras formas de reconhecimento. Cláudio é a esperança em pessoa, cheio de sonhos,
crendo que após conseguir chegar até aqui, poderá ir muito mais longe. E quero muito que vá.

Seu SALVADOR MOURA é um distinto senhor, morador do Geisel e tendo por ofício de vida o de pintor. Pinta e borda, paredes mil, casas uma atrás da outra, esse seu sustento. Aos 59 anos, bem vividos, já fez de tudo na vida, mas dentre as coisas que gosta de relembrar com imensa saudade é a de cantar. Sim, foi (alguém deixa de ser?) cantor. E para provar, abre o gogó sempre que solicitado. O apelido, que carrega pro resto da vida é VAGALUME e explica: “Eu pegava serviços à noite, coisa que poucos queriam fazer e em algumas vezes usava um farolete para clarear as paredes. Começaram me chamar de Vagalume e o apelido fincou em mim”. Pois bem, esse Vagalume trabalhou por mais de dez anos na Bauru Painéis, depois outro tempo como decorador e continua pintando por aí, cantando pouco, infelizmente. Pai da cantora Joelma, do grupo Balaio de Sinhá, tem orgulho em dizer que ela já cantarolava desde os dois anos, influência paterna total. Um retinto senhor, magro, esbelto e cheio de muito charme, inclusive nos momentos em que circula com um cigarro (apagado, viu!) atrás da orelha. A simpatia em pessoa, um ser de bem com a vida e sabendo leva-la a contento, como deve mesmo ser as nossas relações com essa distinta senhora. Vagalume é desses a clarear trilhos para os desalumiados.

MAURO DIAS BORBOREMA é seu nome de batismo, mas com o passar do tempo ficou só BORBOREMA, como todos o conhecem. Nasceu em Garça, mas ganhou a estrada logo cedo, de um lado para outro, aportando em Bauru e por aqui se estabelecendo. Com 50 e lá vai fumaça de idade, uma das tantas coisas que faz por gosto é o amor pelo futebol. Fundou um time amador na cidade e na querência de homenagear o falecido BAC, aproveitou o B de Bauru e o do seu nome, assim nascendo o Borborema Futebol Clube, um desses tantos que vive sem patrocínio, buscando forças aqui e ali, sobrevivendo só deus lá sabe como. Estamos a poucos dias de mais um torneio amador ter início, tudo ainda está embrionário lá pelos lados do time, mas ele não se perturba, pois sabe que a luz virá e o time entrará em campo. Borborema é um místico, teve famoso templo de umbanda em Garça, sua terra natal e hoje tenta reviver outro por aqui, algo que deve acontecer tão logo a luz baixe e lhe inspire onde, como e por que. Enquanto isso não acontece, festeja a vida ao lado de gente do samba, do futebol, da umbanda e os que compreendem sua forma de ser e agir. Bonachão, bate bola em várias posições, tudo ao mesmo tempo, trabalhando, crendo e curtindo o lazer pelas quebradas do mundaréu. No último domingo gravou vários vídeos, um de 48 minutos com o pessoal do samba lá na Escola de Samba Coroa Imperial e quer que o ajudemos a espalhar a festa. Eis aqui seu vídeo, entregando todos que por lá estiveram:https://www.facebook.com/photo.php?v=244682635712567&set=vb.100005124964140&type=2&theater 

Um comentário:

Anônimo disse...

HENRIQUE

O CAMINHO É ESSE

MENOS PASTORES
MAIS GENTE SIMPLES NA FITA

POR QUE O ROQUE NÃO LEVA ADIANTE AQUELA ANTIGA IDEIA DELE DE HOMENAGEAR ESSAS PESSOAS?

PARA CADA PASTOR HOMENAGEADO, UMA PESSOA POPULAR SENDO APRESENTADA POR ELE.

E IRÍAMOS LÁ PARA APLAUDIR E INCENTIVAR MAIS E MAIS.

ESSA HILDA MERECE, CONHEÇO ELA DAS RUAS.

ALVARENGA