sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

O QUE FAZER EM BAURU E NA REGIÃO (58)


OS QUE DORMEM EM COLETIVOS

Noites mal dormidas em nossos colchões e complementadas depois no transporte urbano. Sempre pensei em sair fotografando pessoas nessa situação. Não iniciei até agora por um simples motivo. Acho deselegante, desagradável e uma invasão no individual de cada ser humano eu sair fotografando pessoas sem o seu consentimento e justo num momento onde estão totalmente indefesas. Muitos o fazem. Eu mesmo já o fiz em algumas ocasiões. Não divulgo essas fotos. Estou pesquisando por esses dias e lendo algo sobre um jornalista boliviano, Alfonso Gumucio-Dagron, textos divinais sobre “Comunicação, Desenvolvimento e Mudança Social” em nossa América Latina. Além do trabalho jornalístico escrito, reproduz belos ensaios fotográficos numa página na internet, a “Nuestra Mirada” (http://www.nuestramirada.org/photo/albums/transdormitorio). Enquanto tento escrever algo sobre isso, dessa soneca em lugares públicos, aqui somente em coletivos, algo mais do trabalho do fotógrafo Diego Sandoval N., 36 anos. O trabalho aqui reproduzido tem por título “Transdormitório - Estação Mapocho”, Santiago, Chile, novembro de 2014. No site quase 4000 portfólios, temas variados e fotógrafos idem, todos de situações em países latinos.
 
Percebam, todas tiradas no começo de alguma noite qualquer. Não importa o dia, importa muito a condição, dos motivos disso se repetir dia após dia. O cansaço está estampado na face de todos, indistintamente. O trabalhador, tanto daqui como acolá, pega um coletivo bem no começo do dia, na maioria das vezes percursos longos, horas sentados no coletivo, trabalha depois o dia inteiro e no retorno, algo inevitável, o corpo não mais aguenta e ele desfalece. Quantas vezes não me ocorreu o mesmo nos grandes centros. Minha resistência é pífia em coletivos. Durmo fácil com o chacoalho do veículo em movimento. Começo lendo e termino babando, jornal ou livro encontrados posteriormente no chão, já devidamente pisoteados. Muitos dormem pela aí e pelos mais diferentes motivos. Esse do trabalhador cansado, na maioria das vezes nos grandes centros urbanos mundo afora é o mais cruel. Daria para fazer um tratado sobre isso, imagina o que viria quando entrevistados um por um, sendo observado os motivos individuais para aquela soneca ali registrada. Isso vai muito além do ensaio.

Vinha pensando nisso hoje quando atravessei a praça Rui Barbosa, a central, postada no coração de Bauru. Fui e voltei e em ambas caminhadas vejo gente dormindo em bancos e em plena luz do dia. A ideia das fotos me volta à cabeça. Seguro a vontade e no retorno contei, eram três os que vi assim de longe dormindo nos bancos e isso por volta das 12h. Essa praça daria também mais do que um belo estudo sobre dos motivos das pessoas ali pararem, algo muito além do descanso, de um simples folego para continuar a jornada. Quantos ali, percebo, estão sem eira e nem beira. A praça lhes cai como uma luva e sentados, olhares pregados num horizonte nebuloso acabam dormindo. Volto para casa pensando nisso e ao retomar minha pesquisa com o jornalista boliviano, eis que encontro as fotos do site citado. Sento e escrevo isso tudo numa só sentada. Num só folego e posto sem pensar muito. São tantos os belos temas para pesquisa. Algo para tentar entender das agruras desse mundo moderno e cada vez mais insensível. Isso ocorre aqui, em La Paz, em Santiago do Chile, em New York, em Arealva e por todo lugar. Vejam as fotos e olhando nos detalhes de cada uma delas, muita reflexão por vir.


Por fim conto uma história que aconteceu comigo tempos atrás. Perto de uns quinze anos atrás. Pouco a ver com essa situação das fotos aqui retratadas, mas algo valendo o registro. Embarquei num ônibus do Prata com destino a Santos, viagem a noite toda e com chegada prevista para o terminal no litoral bem no começo da manhã. Iria passar o dia todo trabalhando e voltaria no final da tarde para Bauru. Claro, fui dormindo quase a viagem toda. E dormi demais, tanto que todos desceram e ninguém me acordou. Fui parar na garagem e ao ser acordado por uma pessoa da limpeza, um susto. Nada além disso. Fui encaminhado a um banheiro e em seguida me levaram de volta num carro para a rodoviária. Trabalhei o dia todo vendendo as tais chancelas e no final do dia, disso não me lembro, mas tenham certeza assim ocorreu, desmaiei e só fui acordar em Bauru. Dessa vez, conseguindo descer no terminal rodoviário. Essa foi só uma delas, outras tantas dormitei em circulares em São Paulo e no Rio de Janeiro. Tomava o cuidado de dormir abraçado com meus pertences, daí nunca nada me aconteceu merecendo o registro. Durmo até hoje, só péssimo acompanhante em viagens. Mas aí entra em questão a tal da diabetes e a prosa muda de rumo.

3 comentários:

Anônimo disse...

Anos atrás eu voltava de SP no Prata e era o último horário da noite, aquele que passa por Lençóis Paulista e Agudos antes de chegar em Bauru.
Uma senhora iria descer em Lençóis, dormiu e foi parar em Bauru em plena madrugada, fiquei com ela até resolver a situação pois a senhora chorava muito de nervoso, mas o Prata a colocou no próximo ônibus e resolveu, hj é quase impossível isso acontecer porque eles tem uma norma de verificar todos o ônibus antes de sair.

Gosto muito de rodoviárias, são os lugares mais democráticos, todos com um objetivo em comum, não importa classe social, nada, sempre pessoas chegando e partindo, lágrimas no reencontro e na despedida, alegrias e tristezas, é um espaço para o sono, leitura, o desejo de quem sonha com algum lugar, das moedas juntadas pouco a pouco para realizar o sonho de partir, todos se encontram na rodoviária, lugar que mais gosto e no observar, inspirações mil. Acho que o mundo seria melhor se ele fosse uma grande rodoviária.

Agora aqui nos coletivos em Bauru, tem uma linha que fiquei sabendo que tem dia que é impossível alguém dormir diante de tantas confusões e que o Guardião anda pegando essa linha e rendendo histórias pra lá de HQ, será?? Talvez um trabalho jornalístico para averiguar.

Camarada Insurgente Marcos

Anônimo disse...

Henrique

Durmo em onibus desde que me conheço por gente.
Vou e volto para Bauru muito de onibus, pois já não enfrento essas distâncias entre meu trabalho aqui nas barrancas do Mato Grosso e minha cidade natal sem sentir sono ao volante.
Depois de passar por alguns apuros, decidi viajar menos e ir e voltar de Mercedes, com motorista particular.
Dos meus tempos de capital paulista senti na pele o que é de fato dormir na ida e retorno ao trabalho. Impossível não dormir com três horas dentro de um trem ou onibus. Todos o fazem.
Paulo Lima

Anônimo disse...

Adorei a dica do site de fotos.
Não tinha o hábito de entar no blog e só no seu facebook, mas o faço para registrar que serei seguidora do site de fotos latinas.
Belos ensaios.
E também do seu blog.

Maria Laura