sábado, 16 de outubro de 2021

REGISTROS LADO B (67) e DIÁRIO DE CUBA (217)


CONVERSA PRA LÁ DE POLÊMICA COM O AGITADOR DAS ENTRANHAS DESTA ALDEIA, KYN JUNIOR, MAIS UM ADESTRADOR DE PROBLEMAS E ADVERSIDADES, TAMBÉM TENDO A SOLUCIONÁTICA SEMPRE NA PONTA DA LÍNGUA
Chego neste momento ao 67º LADO B – A IMPORTÂNCIA DOS DESIMPORTANTES, este bate papo semanal, dando voz para os que se encontram, na maioria das vezes, oculto pelo ostracismo provocado exatamente por isso, por não fazerem parte do grupo denominado como “Forças Vivas”. Por aqui, não encontrarão de jeito nenhum algum destes tais de “forças vivas”, pois para tecer algo sobre estes já existe meios mais que suficientes. O negócio aqui é bem outro, ou seja, mostrar o outro desta cidade e de também gente de outros lugares, mas nenhum fazendo parte dos Donos do Poder. Aqui algo das alternativas possíveis dentro deste nosso mundo e a cada semana, resgato uma conversa do arco da velha, dessas onde, na maioria das vezes conhecemos os personagens, mas quase nada de sua construção como pessoa. Este bate papo tem essa finalidade, a de conversar com as pessoas e é isso que tem me movido nos últimos meses, continuar com esse resgate e talvez até torna-lo mais visível, abrangendo mais e mais pessoas. Hoje quem aqui estará e alguém mais que polêmico nesta cidade, KYN JUNIOR. Kyn já foi de tudo um pouco nessa vida e desde muito tempo faz e acontece por essas paragens. Faz ao seu modo e jeito, muitas vezes aos trancos e barrancos, mas em alguns momentos conseguiu avanços e belas vitórias, em outras retumbantes derrotas. Concordar ou não com ele é outra história. O que quero neste momento é conversar com ele e ouvi-lo, a sua opinião sobre muita coisa desta terra pouco varonil.

Kyn é barulhento e também o dizem espalhafatoso, performático. Pode até ser tudo isso. Acho que é mais que isso, porém nos últimos tempos tem passado poucas e boas. Neste exato momento tenta se reerguer, dar a volta por cima e voltar a balançar a roseira, o coreto e as carcomidas estruturas desta cidade. De algo ninguém pode dizer que o danado não seja, um fuçador, desbravador e incontido cidadão, destes que não se seguram nas calças. Diz de tudo, quase sempre sem refletir muito nas consequências e depois do estrago feito é que vai medir o que foi dito, podendo até rever e pedir escusas. Muitas vezes já é tarde demais, mas aí “Inês já é morta”. Kyn Junior é assim temperamental e imediato, ariano e sem amarras. Eu e ele nos digladiamos muito ao longo de nossas vidas, posições antagônicas, lugares opostos, mas nem por causa disto deixamos de conversar e confabular quando possível e necessário. Já nos ajudamos mutuamente e assim devemos continuar fazendo ao longo de nossas vidas. Hoje ele aqui estará para falar de si, contar suas histórias, rever algo alegre e também os tristes. Teve perdas recentes, dessas mais que transformadoras e todas elas estão marcadas em sua face, também nos seus atos. Ele não consegue esconder mais isso, pois ele mesmo escancara tudo quando abre a boca em suas gravações pelo facebook.

Não sei como posso qualifica-lo adequadamente. Sei que foi um produtor cultural, gerenciou negócios, ajudou alavancar outros, tentou ser publicitário e homem de rádio e TV, investiu em um dia ser Secretário Municipal de Cultura, para tanto apoiando diferentes candidatos. Levou bordoadas e também as desferiu. Uma pessoa assim, atuante, desgostando muitos e agradando outros, não pode passar batida. O que ele não é alguém do qual possamos fingimos não ver ao nosso lado, pois ele marca presença, pede a palavra e se pronuncia, enfim, sabe espernear quando necessário. Um ser instigante, com uma história de vida por detrás de tudo isso e é exatamente isso que quero registrar e mostrar para quem ainda desconhece esse seu lado, cheio de humanidade. Vamos ver no vai dar esse encontro. Somos velhos conhecidos, dos tempos quando manteve um relacionamento de anos, depois desfeito, morou junto ao Mafuá, saiu de lá para a barrancas da Havan, depois o Santa Edwirges, onde está até hoje. O conheci quando nossos filhos estudavam no numa escola pública estadual, mas suas histórias já corriam a cidade. Os artistas trabalhando hoje livremente no Calçadão da Batista devem isso muito a ele e também quero resgatar algo dessa história, uma de suas vitórias.

Abaixo alguns dos posts que fiz sobre ele pelo blog Mafuá do HPA, com escritos publicados diariamente desde 2007 (www.mafuadohpa.blogspot.com):

- Publiquei em 24/09/2013: “ARTISTAS NA RUA PARA O QUE DER E VIER - CALÇADÃO DA BATISTA DESIMPEDIDO - MEU ENTENDIMENTO: Eu sou um cara turrão, mas quando tenho que reconhecer algo em alguém o faço sem problemas. KYN JUNIOR, o atual presidente da ATB é um deles. Discuto com ele constantemente por uma infinidade de diferenças, ideológicas principalmente, o que não me diminui nesse momento em reconhecer nele o grande batalhador da aprovação da lei que devolve a liberdade dos artistas atuarem no Calçadão da Batista, centro de Bauru SP. Outros merecem aplausos, como o Secretário de Cultura, Elson Reis e o vereador Roque Ferreira, mas credito ao Kyn, os maiores louros dessa vitória. Explico. Muitos queriam ter esse impedimento derrubado, falávamos muito (eu um deles), mas ninguém havia ainda pego o touro a unha e destrinchado adequadamente o que poderia e deveria ser feito. O Kyn fez isso. Diante de tudo o que critico nele, hoje dou o braço a torcer e o aplaudo em pé, pois se dependesse de mim e de tantos outros, talvez demorássemos mais um tempo para tudo ser concretizado. Nessa luta ele foi incansável e como o vi nessa cancha, promovendo a boa batalha, gostaria de vê-lo em outras frentes com a mesma disposição. Faço esse reconhecimento público, pois já discuti muito com ele aqui pelo facebook (acredito que posso continuar discutindo), mas é impossível não creditar à sua pessoa parte considerável dessa aprovação. O debate com o vereador Moisés Rossi, que queria votar contra o projeto, mas fez uso de um bonecão pelas ruas da cidade e pela Batista foi digno de registro (a última foto é do tal boneco). O vereador capitulou, eu também nesse merecido reconhecimento. Sim, a conquista será coletiva, os benefícios idem, a luta era de todos, mas o empenho maior foi dele. Já o elogiei o suficiente para que, no próximo encontro num dos bares da vida, a cerveja fique por conta exclusivamente dele. Façamos bom uso, como sempre vi sendo feito, da Batista liberta, sem amarras, sem grilhões, sem arame farpado, sem porteiras fechadas. Era o que tinha a dizer a respeito do encantamento que me arrebatou após tomar conhecimento de que o grande MAURÍLIO, nosso Chaplin sempre de plantão poderá trabalhar livremente sem que ninguém o tente impedir. A arte vence, mas alguém precisava fazer um algo mais. E ele foi feito”.

- Publiquei em 26/09/2020: KYN JUNIOR ME ENVIA VÍDEO INÉDITO DE ALEMÃO DA KANANGA CANTANDO E TOCANDO - Telefone toca aqui pela manhã e do outro lado KYN JUNIOR, amigo de longa data e muito acabrunhado nos últimos tempos, pelos percalços da vida. Começa me dizendo estar completando dois anos da perda da filha, algo irreparável e incontornável em sua vida, mas mesmo assim não desiste e morando agora lá nos altos do Jardim Bela Vista, perto do Panelão da Santa Edwirges, diz ter conseguido se adaptar e tenta levar sua vida como pode, numa boa, sem entrar em muitas divididas. Lhe digo: “Kyn, você é um sábio no que faz, sabe muito bem como ir se safando em todas as situações e diferenças de classe. Sabe de infiltrar e usufruir de benesses dos mais abastados, assim como onde se encontra, junto a quem não tem muito, mas tem calor humano e assim, nessa mescla toca sua vida, sem grana e se safando, tocando-a para frente com maestria”. Kyn esteve junto a vizinhos, muitos deles já amigos e me conta da noite de ontem, quando bebeu e comeu, conversou e teve acesso a mais e mais histórias de vida, muitas cheias de dor e alegria. Cada dia, no raiar de um novo dia, ao abrir os olhos, tenta ver como fará para driblar as adversidades e seguir de cabeça erguida. Ele tem sido mestre sapiente neste quesito, o de contornar adversidades e seguir altaneiro. Mas o motivo de sua ligação para comigo foi outro e isso muito me envaidece. Conseguiu um vídeo, que me diz ser inédito de nada menos que o Alemão da Kananga e ao assistir chora, lembra de mim, me liga e me passa o vídeo pela whatts. Ao desligar assisto e ao rever o amigo que se foi, sua voz, aquele jeito boêmio e fanfarrão, a saudade me invade. Kyn volta a ligar e conversamos sobre o amigo em comum, muitas histórias de ambos com o músico. Kyn batalha como pode, com as armas que tem em mãos e se safa, ou seja, segue em frente e isso me faz ver o quanto muitos conseguem maravilhas neste mundão desesperançoso. Fico revendo o vídeo do Alemão e assim passo boa parte deste sábado, envolvido em histórias que não voltam mais.

Isso tudo nada mais é do que um breve e curto aperitivo para o que virá hoje.

Vamos juntos?


Infelizmente tivemos algumas interrupções no bate-papo, com alguns espaços vazios no meio. Vou assistir com calma e demarcar o tempo exato dessas paradas e pedir para que retornem na fernte, pulando os vazios. A conversa teve dois momentos, intercalados por um trecho quando Kyn perdeu a conecção e teve que se deslocar até um vizinho, em busca de outro wi-fi. Por fim, juntando as duas partes, deu tudo certo e conhecemos um pouco desse personagem bauruense, dos mais populares e controversos. Vale a pena ouvir, o Kyn, como todos, temos lá problemas, mas quem não os tem? Convivemos com os nossos, os quais achamos os mais normais do mundo. Vida que segue...


EXISTE, AFINAL, ALGUM TERRITÓRIO PARA ESCAPAR DESTE MUNDO?*
* Meu 35º texto para o semanário DEBATE, de Santa Cruz do Rio Pardo:
Essa pergunta me instiga, afinal vivemos enfronhados num perverso mundo capitalista, onde o deus mercado está acima do ser humano, lhe dita as regras e massacra os dos degraus de baixo. Muita crueldade em todo o entorno, ou seja, tanto faz irmos pra ali, ficarmos aqui ou nos dirigirmos pra acolá, as condições terão pouca mudança. O Brasil de hoje, após o advento bolsonarista piorou sensivelmente e além das dificuldades todas, está mais pueril, mais violento, algo banal no ar e pregações de ódio, destoando de quem quer viver e deixar viver.

Diante de tanta agrura, vejo as pessoas mais do que perdidas, como cegos num tiroteio e a pergunta que mais vejo se repetindo por onde circulo é a “Escapar para onde?”. Vasculho a internet e descubro sem querer algo sobre essa procura num filme italiano recém lançado, o “Cidadãos do Mundo”, dirigido por Gianni Di Gregorio, onde algo além do cômico e do político, essa busca insana por algum lugar considerado palatável. Trata-se de uma crônica bem atual versando sobre o destino de três homens maduros, cuja vontade de melhorar de vida tropeça na realidade áspera. Eles, como os daqui, após a aposentadoria veem o valor de seus proventos minguarem a cada mês e a vidinha modorrenta, sem sentido, daí, tomam uma decisão, mudar tudo e ir em busca de algum lugar onde a vida possa transcorrer de forma diferente.

Mas como? Existirá mesmo um lugar assim onde o valor de suas aposentadorias não termine antes do final de cada mês? Preparado para fugir se deparam um negro africano, que acabara de fugir de seu país, naquelas viagens pelo mar revolto e em embarcações frágeis e lotadas, tudo também para tentar encontrar um lugar onde pudesse viver, no caso deste, sobreviver mais decentemente. Percebem que essa busca se dá por outros tantos, cada qual buscando algo e de tudo, a percepção de que o ser humano não tem conseguido, mesmo com todo avanço tecnológico do momento, atender as expectativas de bem estar para o corpo.

Essa busca pelo paraíso sonhado, mas não no pós vida e sim, agora, quando nesta vida é algo atormentador. Cada qual percorremos caminhos em busca de algo onde esse corre-corre, esse stress diário possa ser atenuado, mas pouco, muito poucos conseguem de fato. Na verdade, a conclusão que tiro e me vendo também nessa busca, constato ser o filme uma denúncia da atual crise social onde estamos todos inseridos, quase num beco sem saída. Fracassamos nos formato de vida, pois nele as desigualdades estão cada vez mais acentuadas e cada vez mais, existirá de tudo no mundo, mas cada vez menos terão condições de usufruir dessas benesses. Enfim, existirá alguém totalmente feliz dentro do atual momento brasileiro? Creio que, muito poucos e mesmo assim, não sei como o conseguem vendo seus semelhantes padecendo ao lado. Como alguém pode ser feliz, mesmo tendo tudo e ao seu lado, milhares penando, lutando pela sobrevivência?

Quando se pensa num lugar paradisíaco para fugir do lugar onde vivemos, praticamente impossível ele existir sem que a pessoa tenha muita grana. Quer dizer que tudo gira em torno do vil metal? Existirão lugares onde, mesmo na pobreza, não miserável, a vida transcorra sem percalços de competição e disputa? Podem me criticar de tudo, mas o mais próximo disso tudo, mesmo com todos os defeitos e problemas é o regime cubano. Em Cuba isso é possível e mesmo para não comunistas, entender isso é ressaltar: o ser humano quando em primeiro lugar, longe do desenfreado consumismo, pode viver mais e melhor. E se aperfeiçoarmos o que já existe lá na ilha e daí sair algo ainda melhor? Talvez a busca estaria resolvida. E por que insistimos num regime que só nos traz infortúnios? Será tão prazeroso assim sofrer? Eu não me canso de sonhar e dos sonhos não consegui enxergar outro lugar no planeta. Me ajudem com mais sugestões.

OBS Final: saquem do que escrevo assistindo ao trailer do filme: https://www.youtube.com/watch?v=o09GZvFYARI.
Henrique Perazzi de Aquino, jornalista e professor de História (www.mafuadohpa.blogspot.com).

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