MONTEIRO LOBATO, UMA MULATA NUA E O BLOCO "QUE MERDA É ESSA"
Viajei durante o Carnaval, mas algo que havia sido enviado por e-mail antes da festa começar, acabou me motivando a escrever o texto abaixo. A professora bauruense Maria Cristina Romão é militante junto a APEOESP e possui um posicionamento dos mais dignos e sérios. Dois dias antes de pegar estrada recebo dela esse texto: "COLEGAS, NÃO SEI SE VOCÊS JÁ VIRAM NA MÍDIA A POLÊMICA CAUSADA PELO DESENHO DO ZIRALDO PARA UM BLOCO DE CARNAVAL DO RIO CHAMADO "QUE M* É ESSA" ONDE ELE RETRATA MONTEIRO LOBATO ABRAÇADO A UMA "MULATA" E JUSTIFICA DIZENDO QUE É PRECISO ACABAR COM ESSA BRINCADEIRA DE RACISMO NO BRASIL. O MOVIMENTO NEGRO CAIU DE PAU E COM RAZÃO, REPASSO PARA VOCÊS O LINK COM A CARTA DA ESCRITORA ANA MARIA GONÇALVES AO ZIRALDO, UM DOCUMENTO INCRÍVEL, BEM ESCRITO SOBRE A DUPLA ZIRALDO/LOBATO E O RACISMO DE AMBOS. ABRAÇOS E UM BOM FERIADO M.CRISTINA". No link, clicando nele o texto de Ana Maria Gonçalves: http://www.abpn.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=647%3Acarta-aberta-ao-ziraldo-por-ana-maria-goncalves&catid=25%3Aartigos&Itemid=25&lang=pt
São tantas coisas, que nem sei por onde começar. Primeiro, digo que pensava exatamente igual a professora Romão e a escritora Ana, mas mudei meu pensamento, pelo menos nesse e em outros casos. Segundo, passo o Carnaval no Rio e fui conhecer o tal bloco, a sair nas ruas de Ipanema no domingo de tarde (publico aqui amanhã as minhas fotos nesse bloco e no Simpatia é Quase Amor). Pra começar odiei esse negócio de não escrever a palavra "MERDA" na camiseta do bloco e sim um "M*". Até no conservador jornal O Globo está lá o nome do bloco com todas as letras. Temos um mêdo bobo ao não assumir certos nomes, seguindo uma tal de "politicamente correto", que acho detestável (muitos ainda usam o termo "revolução" para a "quartelada" ocorrida no país em 64). Segundo os defensores do tudo certinho, continua durante o Carnaval a crença de que patrulhar a linguagem das letras, bem como de toda a produção cultural ocorrida décadas atrás é lutar por um país mais justo, igualitário, soberano e livre. Balela, conversa pra boi dormir. Imaginem esse pessoal dando uma vasculhada nas letras do Braguinha, nosso mais famoso letrista de marchinhas carnavalescas e levando ao pé da letra o que consideram o modo mais adequado de construção das mesmas. Hoje só ouviriamos percussão e nada de letras de carnaval. Não poderíamos mais cantar a "Cabeleira do Zezé" e tantas outras. Entendo o Carnaval como um período onde deva ocorrer a suspensão da moral cotidiana (para o bemgeral da nação). Os moralistas de hoje não levam em consideração o momento em que as letras foram escritas. No caso do Monteiro Lobato, li muitos dos seus textos e vi sim embutido em alguns algo preocupante no quesito preconceito, mas não desmereço sua obra e analiso tudo procurando me colocar naquele período histórico. A licenciosidade do carnaval não deve ser ultrajada com conceitos de gente acadêmica, que parecem não entender patavinas do que acontece nas ruas brasileiras. Achei a pegação de pé em cima da postura do Ziraldo acima do tolerável, algo insensível de quem se acha dono da verdade e isso é perigoso. Quanto a Lobato ao lado de uma mulata nua, isso é carnaval e o desenho do nosso maior chargista ficaria horroroso com ela totalmente vestida. Para mim a brincadeira com a charge é mais do que válida e o que falta para uma certa parcela da intectualidade brasileira (branca, negra, amarela, cafusa...) é ser mais festeira e deixar de misturar alhos com bugalhos. Não avançam um milímetro quando acirram a questão, pois ao invés de esclarecer e desmistificar a questão, ajudam a confundir ainda mais a cabeças. Deveriam todos estar em trégua no período do reinado de Momo. É o que faço desde sábado, só voltando à seriedade na quinta próxima e olha lá.
Eu sei muito bem separar o que é uma séria discriminação a ser combatida e uma brincadeira de carnaval. Para os que ainda não entenderam o espírito da coisa, deixo a pergunta: QUE MERDA É ESSA...
Em tempo: Hoje é 08 de março, Dia Internacional da Mulher e vivo ao lado de uma a pensar igual a mim, eu branco, ela negra e com uma sintonia a assustar gregos e troianos, obtusos e redardatários. Sabemos que o fosso entre brancos e negros nunca foi tão profundo (vide capa da última Carta Capital, edição 636, nas bancas) e lutamos sem tréguas pela conquista da consciência da cidadania, sem sermos hipócritas. Deixo claro que em alguns casos detesto ser politicamente correto e adoro a liberdade emanada no e do Carnaval.
2 comentários:
Henrique
Meu caro,
Ao Carnaval sempre foi permitida uma licenciosidade, uma espécie de trégua, onde se podia falar de tudo e de todos, com ironia e até mordacidade. Os tempos atuais, chatos e sombrios está querendo retirar esses gestos de galhardia, os únicos restantes e introduzindo o mundo cada vez dentro de um só pensamento. Acho isso tacanho e algo a ser duramente combatido. Assim como o nome do bloco QUE MERDA|È ESSA, acho que devemos estar inseridos num outro lema, o do RESISTIR È PRECISO.
Abraços carnavalescos do
Pascoal
Com esse negócio de politicamente correto, quer dizer que não posso mais mostrar a mediocridade de certas situações e nem fazer as gozações que antes se fazia?
Se for isso, não gosto nem um pouco e prefiro como antes.
Clarice e Osmar
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