sexta-feira, 31 de agosto de 2012

ALFINETADA (101)*
* Continuação da rebublicação dos meus antigos textos d'O Alfinete, semanário de Pirajuí. A cada mês três deles, na sequência que foram publicados por lá. Algumas correções foram feitas, mas mantida a essência e de tudo uma constatação, tem coisas que não escreveria hoje da forma como o fiz doze anos atrás.

O CUIDADO NO TRATO COM A TERRA (13) – publicado na edição n° 77, de 19/08/2000
Terminei de ler o último livro de Leonardo Boff, “Saber Cuidar: Ética do Humano – Compaixão pela Terra”, da editora Vozes/RJ  e como fiquei impressionado pelo descaso que, nós humanos, continuamos praticando com o nossa habitat, compartilho com os leitores desse semanário, um pouco do que li. Nas 200 páginas do livro, Boff nos faz entender que não sabemos cuidar da Terra e que a ausência de um cuidado é o principal motivo do desleixo. “Cuidar é mais do que um ato, é uma atitude”, apregoa o autor. Ele deixa claro que a Terra não está à nossa frente como algo distinto de nós mesmos. Temos a Terra dentro de nós. Somos a Terra e precisamos ter um cuidado especial para com ela. É urgente esse cuidado, uma sinergia para com a vida, para com a sociedade e para com o destino das pessoas, especialmente da grande maioria empobrecida e condenada  da Terra. O texto faz pensar e muito, pois é nítido o sofrimento do homem, sendo necessário esse repensar, voltado para um cuidado maior. E esse cuidado somente surge quando a existência de alguém tem importância para mim. A partir daí, passo a me dedicar a ele, disposto a participar de seu destino, de suas buscas, de seu sofrimento e de seus sucessos, enfim, de sua vida. Cuidar das coisas implica ter intimidade, senti-las dentro, acolher, respeitar, dar sossego. Cuidar é entrar em sintonia, é afinar-se. É o sentimento que nos une às coisas e nos envolve com as pessoas. Passamos por um momento em eu é mais do que importante desenvolver uma atitude atenta de escuta, um sentimento profundo de identificação com a natureza, com suas mudanças e estabilidades. O ser humano precisa sentir-se natureza. Num certo momento Boff desabafa: “quanto mais uma pessoa sofre com a degradação do meio ambiente, se indigna com o sofrimento dos animais e se revolta com a destruição da mancha verde da terra, mais desenvolve novas atitudes de compaixão, de enternecimento, de proteção da natureza e uma espiritualidade cósmica”. A leitura termina com a certeza de que o cuidado não é uma meta a ser atingida somente no final da caminhada. Deve ser um princípio a nos acompanhar em cada passo, em cada momento de nossas vidas. Sem o exercício constante do cuidado, não conseguiremos inaugurar um novo paradigma de convivência. Vamos tentar?
MORTADELA: UMA PAIXÃO NACIONAL (14) – publicado na edição nº 78, de 26/08/2000
O brasileiro adora comer mortadela, mas odeia que os outros fiquem sabendo dessa sua preferência. Escondido, no conforto dos seus lares, todos a degustam, comendo-a de todas as formas, seja pura, com pão ou de outras formas. Quando perguntado sobre o assunto, ele nega, foge e não confirma seu gosto por alimento tão sem refinamento. “Imagine eu gostar de mortadela”. Não adianta despistar, ela é uma das preferências nacionais. E além de tudo, tem um precinho dos mais convidativos. Muitos a renegam, porque gordurosa, podendo elevar os índices de colesterol, mas mesmo assim, de vez em quando, é inevitável o apelo daquele inconfundível cheirinho. Isso mesmo, o cheirinho é peculiar. Bastou tocar nela para impregnar. Comendo então é a certeza do cheiro lhe acompanhar pelo resto do dia. Todos à sua volta vão saber que devorou uma mortadela naquele dia. Mas, como não é mesmo fácil resistir, mesmo com aquele complexo de culpa, enfrentamos garbosamente todas as consequências. A esposa é sempre a primeira a evitar uma aproximação, enquanto persistir o cheiro, só que ela também come escondida. Falou-se muito de que era feita de carne de cavalo, mas nem isso impediu sua popularização. Comprada meio às escondidas, no meio das compras do mês, fatia-se quando a padaria está meio vazia, comida meio reservadamente, mas ninguém fica sem ela. E como a danada é gostosa. Dizem que em excesso é indigesta, mas tudo em excesso nessa vida é indigesto. Quero, nesse momento, externar minha declaração de amor à tão injustiçada iguaria. Uma rejeitada, que intimamente todos adoram, tanto ter sido merecedora dessas linhas. Por falar nisso esse escrito me dá uma vontade danada de  come-la e como não a tenho no momento em casa, sou obrigado a parar a escrita e sair à procura de uma padaria, em busca de tão cheiroso tesouro. Continuo escrevendo depois...
BANHEIRO LIMPO É RARIDADE (15) – publicado na edição nº 79, de 02/09/2000
Quem trabalha como vendedor padece desse mal. Vendedor não tem parada, corre-corre de um lugar para outro, de cidade em cidade. Aquela aflição para tornar o dia rentável, faz com que não se tenha muito tempo para nada. O almoço é feito às pressas, quase sempre num self-service, vapt-vupt. Dia todo tomado, muitos clientes a serem visitados e as horas correndo. Essa é a rotina, mas além disso tudo, podem surgir mais algumas coisinhas, para desalento e aumento do stress diário. Uma dessas aflições, que pode acontecer com qualquer um é aquela necessidade incontrolável de ir ao banheiro quando estamos longe de casa. Posso afirmar que quando ela surge, a aflição vem junto, pois a grande maioria dos banheiros públicos é de uma falta de higiene de  fazer gosto. Quando somos obrigados a encarar banheiros de botequins, de praças públicas e de alguns estabelecimentos comerciais, passamos a dar importância enorme para assuntinho tão simples. Tem banheiro por aí que só de passar por perto, começa o mal estar. Imagine lá dentro e de porta fechada. Entra-se por não haver outra saída. Nesses lugares, fazemos de tudo para tentar melhorar o ambiente, antes da consumação da sentada. O momento requisita um relaxamento, que o local não propicia. Chato mesmo é quando, mesmo com todos os cuidados tomados, um respingo do vaso acaba por molhar o incauto. Não nos esquecemos tão fácil de cenas como essas. Quem é que já não ficou apertado no meio da rua? Quando possível, volta-se correndo para a santa casinha, mas nem sempre isso é possível. Eu mesmo, já passei por situações aflitivas. Sou um crítico voraz dos shoppings centers da vida, mas numa hora dessas, rezo para encontrar um pela frente, pois lá terei certeza de encontrar um banheiro limpo. O que mais queremos nesses momentos é ter paz e tranquilidade. Esse assunto tão edificante, me faz lançar aqui pelo O ALFINETE, uma campanha pela reforma dos banheiros públicos e a conscientização dos comerciantes, entendendo que um banheiro limpo é algo de primeira necessidade. Restaurante com banheiro sujo, faz imaginarmos como será  a cozinha do mesmo. Cuidando desses detalhes, o comerciante certamente será criterioso nos demais. É ou não um bom assunto a ser discutido?

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

RETRATOS DE BAURU (127)
SEU ANTONIO, O DA AVE MARIA E HOJE COM TERRA E CASA PRÓPRIA
Antonio da Ave Maria é mineiro de Botelho, mas boa parte de sua vida passou dentro de acampamentos rurais Brasil afora. Num certo momento esse senhor, 67 anos, corpo mirrado, porém um touro quando na luta por seus ideais, aportou em Bauru no então Assentamento de Aymorés e de lá não mais saiu. Aos 9 anos ganhou o apelido, quando perdeu o pai e desde então, por rezar diariamente o terço, ninguém o chama por outro nome. A luta sindical faz parte de sua vida e certa vez ao interpelá-lo se fazia parte do Sindicato Rural, sua resposta foi imediata: “Sempre fui é do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, não confunda. Olha como essa palavra soa linda, trabalhador”. No começo sua casa no assentamento era feita em módulos, prontos para serem desmontados, hoje ergueu uma de tijolos, permanentes, pois a terra é sua, legalizada. Criou cabras e vendeu muito leite e queijos, hoje prefere atuar no segmento de verduras sem agrotóxicos, algo a envolver toda sua família. Sua luta não sofreu interrupção por causa da conquista da terra, pois hoje a água é difícil, as melhorias chegam em conta gotas e a organização popular nunca está totalmente efetivada, pois ele bem sabe que a reforma agrária brasileira está ainda pela metade. Sua luta continua e ele prossegue sua saga, com seu jeito mineiro de ser (nunca perdido e esquecido), alegre, irreverente, mas de forma contundente e precisa. Certa feita, anos atrás, Isaías Daibem, numa visita ao então acampamento disse aos presentes: “Seu Toninho é valente. Reza com toda a fé do mundo e depois não perdoa, vai à luta, sem dó e piedade”. Eu já acho que é o contrário, primeiro ele vai à luta, faz tudo o que tem que ser feito e depois, às 6h da tarde, reza e dorme tranquilo.
OBS.: Eu sempre preferi chamá-lo de Toninho da Ave Maria, mas ele mesmo, hoje, com o passar dos anos se intitula Antonio da Ave Maria e assim sendo, quem seria eu para contraiar sua vontade e gosto.
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quarta-feira, 29 de agosto de 2012

BAURU POR AÍ (72)
PADRE SEVERINO, CPT E ROMEIROS REUNIDOS NO ASSENTAMENTO DE AYMORÉS
No último domingo, 26/08/2012, algo me fez levantar cedo, preparar a matula e cair na estrada junto de amigos. Eu, Ana Bia, Roque Ferreira e Wellington Leite aportamos cedo no Assentamento Aymorés e presenciamos uma romaria católica. Não se espantem, nem se insurjam por esse desencaminhado andarilho estar à procura de novos caminhos. Os meus continuam sendo os velhos e bons caminhos. Desses não abro mão e foi o que fizemos adentrando a 14º ROMARIA DA TERRA E DAS ÁGUAS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Não se tratava de uma romaria qualquer e sim, de uma organizada pela CPT – Comissão Pastoral da Terra, talvez o último bastião libertador (e propagador dela) dentro da hoje conservadora igreja católica. Saudades imensas de tempos onde a Teologia da Libertação era atuante e permitida.  Esse resistente agrupamento de decididas pessoas, dessas realmente transformadoras tenta mover a igreja, voltando-a para atividades sociais, de cunho libertário e atendendo os anseios dos menos favorecidos, os explorados e renegados. Ouvir o clamor dos povos dos campos e florestas é coisa que poucos se habilitam a fazer, lutar pela defesa da terra como princípio elementar para sobrevivência do ser humano virou raridade. E lá fomos nós, unir a cidade com o campo, na ingrata luta travada pelo trabalhador em busca do direito de cuidar da terra e de possibilitar que ela lhe dê frutos para o seus sustento.
Esse era o motivador de todos. O Assentamento, já legalizado, fica seguindo em frente o Mary Dota, por uma estrada de terra pra além do Chapadão. Uns dez quilômetros de terra e por fim um grande agrupamento de gente, carros e ônibus. Uma missa estava terminando e nela vi quase lado a lado, o marxista Roque e o bispo católico, d Caetano Ferrari, que lá aportou, afinal o evento tinha cunho aglutinador religioso. Essa parte eu perdi e o que veio a seguir foi uma longa caminhada pelas estradinhas rurais, com muito sol, cantoria e parada para muitas falas. Revi gente muito querida, tendo à frente o sempre presente padre Severino Leite, com paróquia em Promissão e atuação mais do que consolidada junto ao MST. Ouvi-lo é ainda um alento, pois prega tudo o que arrepia hoje seguimentos da atual cúpula religiosa. Nada de novo, só o respeito e reconhecimento do direito aos explorados. Vejo residir exatamente a acesa chama a assustar, a possibilidade do explorado cobrar e exigir seus direitos. Nas paradas, representantes de vários outros assentamentos expunham sua situação, seus problemas e o faziam diretamente ao presidente do Incra, ali presente.
Muitos vieram de longe, caravanas de várias cidades e cito somente alguns dos conhecidos e lutadores por dias melhores. Além de Severino (quero muito fazer um Memória Oral com ele, de sua luta e atuação), estava lá o vereador Roque Ferreira, o presidente do Incra, a incansável Maria do CPT, Antonio da Ave Maria (amanhã aqui um Retrato de Bauru com ele), Celso Costa, professor Oscar Sobrinho, o sindicalista Abel Barreto de Duartina, lideranças regionais, tanto religiosas como dos movimentos populares e romeiros. No final da caminhada um imenso barracão, construído pela comunidade, estrutura de bambus, parceria com a Unesp local e lá uma grande feira, produtos dali, comidas variadas, um palco e uma grande festa rural. A escolha por Aymorés como sede da romaria deste ano é uma espécie de denúncia, pois além da conquista da terra, os assentados sofrem com a falta de água, acessos difíceis, estradas ruins, recursos escassos, lixo das  cidades, desmatamento, enfim, uma omissão dos poderes públicos. Como expresso no folheto distribuído, em resumo são “essas as dores, omissões, desrespeitos, injustiças e desigualdades que denunciamos e celebramos nessa romaria”. Marquei presença.
OBS.: Todas as fotos foram tiradas por mim, exceto, claro numa em que estou presente. Essa, confesso, não me lembro de quem a tirou.

DESAFADO DE UM PROFESSOR SOBRE DIA 28 – “As discussões sobre a função alienante dos meios de comunicação já virou um bordão surrado entre acadêmicos, entre setores religiosos tidos como críticos, entre conservadores e moralistas etc. Quando se comenta sobre a disseminação da violência, sobre a “excessiva” liberação sexual e dos costumes, sobre consumismo, logo ecoa vozes do senso comum afirmando que a culpa é da televisão, do rádio, da internet etc., que vivem mostrando em domicílio, maus exemplos de todo tipo. Como jornalista e pesquisador da comunicação, eu não posso fazer eco para discursos sem fundamentação científica.
No entanto, devo ressaltar que no Brasil, os meios de comunicação não têm cultura e postura democrática e também não contribuem nem um pouco, para preservar a memória histórica nacional, da luta recente contra o autoritarismo, do qual muitos jornalistas e até veículos também foram vítimas. Ontem, 28 de agosto completaram 33 anos da aprovação da Lei de Anistia.  A votação da lei permitiu que tantos perseguidos pela Ditadura Militar pudessem sair da clandestinidade ou voltar do exílio, foi episódio decisivo para a redemocratização, que ocorreria formalmente em 1985, com a derrota do candidato dos militares no Colégio eleitoral.
Portanto, 28 de agosto deveria ser um dia para ser relembrado em grandes reportagens, em matérias detalhadas, em depoimentos de personagens significativos da época; merecia até um pronunciamento em cadeia nacional, deveria ser feriado, dia de celebração, de reflexão em escolas e instituições públicas. No entanto, foi motivo de manifestações isoladas de velhos militantes, de brurocráticas notinhas de redação em veículos sem disposição para relembrar qualquer coisa cpivica ou socialmente relevante. Enquanto seguimos reclamando que as novas gerações não sabem de nada e não respeitam ninguém, os mais novos vão repetir de modo pior, os hábitos dos mais velhos e a cultura autoritária e alienada, que eles tiveram durante a criação... Leia mais e http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5746 “. Esse texto entre aspas me foi enviado pelo Prof. Dr. Antônio Francisco (Dino) Magnoni,Tutor Grupo PET-Rádio e Televisão da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - Departamento de Comunicação Social. Contatos:Telefone: 3103-6066 - Ramal: 7204. E-mail: petrtv@faac.unesp .

terça-feira, 28 de agosto de 2012

DOCUMENTOS DO FUNDO DO BAÚ (40)
O ACERVO DO JOÃO DEZ E MEIA ESTÁ NA PRAÇA E A MÓDICOS PREÇOS
Quem gosta de bons programas radiofônicos conhece muito bem JOÃO DEZ E MEIA (fotos dele de J.Schubert, restantes minhas). Seu programa fez história na FM96, quando tocava preciosidades que poucos tinham, raridades do seu próprio acervo, algo juntado ao longo de décadas, principalmente jazz, blues e instrumentais brasileiros. João deixava muitas vezes de se alimentar direito, mas nunca de comprar mais e mais discos, ultimamente CDs. Infelizmente em março do ano passado João Olckmey Albert Leite, esse seu nome, nos deixou aos 68 anos de idade e como não tinha esposa e nem filhos, seu acervo ficou sob a responsabilidade dos parentes mais próximos. Existe uma máxima nesse sentido que diz: “A pior coisa que existe para um colecionador chama-se viúva”. Não faço uso da frase aqui com sentido pejorativo, muito menos de cobrança. Tudo o que relato a seguir são circunstâncias da vida e a mais pura realidade. Ele se foi, seu acervo ficou com pessoas e essas não enxergaram nele a riqueza que João denotava para aquilo. Só quem coleciona sabe do que digo. O mais previsível de acontecer é o que sempre acontece. Tudo foi vendido.
Fico sabendo do fato através do amigo Aldo Wellicham. Ele, assim como eu, um fuçador por natureza. Esteve dia desses no mais belo e organizado sebo da cidade, o SEBO LITERÁRIO (Rua Antonio Alves, entre a Batista e a Rodrigues) e lá só de bater os olhos numas novidades nas prateleiras teve a certeza: “Isso aqui faz parte do acervo do João”. E faz mesmo. O proprietário Antonio desconhece a história da procedência, sabe de quem comprou, mas nada de quem a amealhou ao longo dos anos. Fez o negócio, vislumbrou possibilidades comerciais com a nova aquisição e ao colocá-la à venda, sente na receptividade do público, ter feito mesmo um bom negócio. Ótimo, diria. Ninguém pensou nisso antes, pois esse acervo mereceria não ser disperso. Tarde demais para discutir isso. 

Ganho um CD de presente do Aldo, o “Cambre Avec Vue”, do Henri Salvador. Vou lá e trago mais cinco. A vontade de voltar (toda vez que passo em frente) e amealhar tudo o que fui vendo é grande, mas o comedimento se faz necessário e na impossibilidade de ter aquelas preciosidades todas reunidas aqui no meu mafuá, passo a bola e indico para os amantes da boa música: sejam rápidos, pois a boa nova corre de boca em boca. De tudo, o saldo positivo é que terei aqui comigo e como compartilho do mesmo gosto do saudoso João, pelo menos alguns dos CDs que ele tanto gostava. Fica a dica: todos ao Sebo Literário (o Antonio é ruim de choro, mas pressionando cede algum desconto). E um viva para esse danado João, que esteve a vida toda envolvido com questões musicais. Viva!!!
DUAS EXPOSIÇÕES NO MESMO LUGAR: Hoje, algo em curso e que não acontecia há certo tempo. Exposições sendo abertas com a chancela do MUSEU HISTÓRICO MUNICIPAL DE BAURU. Bato efusivas palmas e torço muito para que o mesmo volte a funcionar o mais rapidamente possível num definitivo lugar, o prédio da antiga Cia Paulista, junto à rua Julio Prestes. “Cozinha Caipira”, ambientação da tela do artista “Nelson Martins” com peças do acervo e “Telas e Pontos Históricos de Bauru”, são as duas montagens e podem ser vistas de hoje à noite até 30/09 na Casa Ponce Paz (esquina da Ezequiel com Antonio Alves).

ADENDO AO TEXTO DO JOÃO DEZ E MEIA: Publiquei esse texto no final da tarde e repassei a indicação para alguns diletos amigos. De um deles, J. SCHUBERT, algo mais, pois me envia três fotos tiradas por ele com o nosso personagem, João Gordo, seu outro apelido. Na primeira, que substitui lá no alto, a última dele vivo, já aparentando não estar bem de saúde e nas duas últimas tiradas num momento de descontração na Casa Síria, local onde ambos se encontravam para bater papo. A rapidez com que algumas respostas chegam via internet é algo que ainda me espanta. Para esse tipo de procedimentos é perfeita, respostas quase imediatas e solidariedade idem. O que não noto rapidez nenhuma é quando lanço algum questionamento impertinente, principalmente envolvendo personagens locais da política e pedindo posicionamentos do outro lado. Nesses momentos são poucos, mas poucos mesmo os que se sujeitam a colocar a cara para bater. Esse os dois lados do mundo virtual. Para o Schubert, meu sincero agradecimento, pois batucamos muitas conversas pelos meios quase ocultos da internet, um dando dicas ao outro e as fotos recebidas, com a concordância dele, estão sendo postadas quase que de forma imediata. Tudo para podermos falar mais um pouco do inesquecível João Dez e Meia.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

PALANQUE – USE SEU MEGAFONE (27)

DIÁLOGO DESSE MAFUENTO ESCREVINHADOR COM GAZZETTA e PERGUNTAS AOS OUTROS TRÊS NA DISPUTA
Campanha política é um campo minado. Ótima para distanciar pessoas, pois durante esse período o acirramento de ideias corre solto. Não fujo do confronto e o faço abertamente, sem esconder de como penso e são minhas ações. Reproduzo abaixo um diálogo iniciado via facebook, quando li algo, respondi e hoje, durante o dia, uma troca de mensagens entre mim e o candidato CLODOALDO GAZZETTA - PV. Expus meu ponto de vista e mesmo não concordando com o dele, não posso negar, não fugiu do pau, respondeu, mesmo não tocando em alguns dos temas sugeridos por mim. Não tenho pretensão de polemizar, de questionar como sendo o único dono da verdade, algo arrogante e muito menos, de moralismo. Meu caminho é bem outro. O diálogo com o Gazzeta está aqui reproduzido:
Diego Willian, 13 anos, internauta participante do Grupo de Discussão no facebook, o “Acorda Bauru! Proteja o cerrado”, publica em 25/08, 21h31 o seguinte texto: “TODA MENTIRA É DESCOBERTA, AMIGOS DE BAURU, RODRIGO PREFEITO NÃO ESTÁ NA FRENTE, UMA AMIGA VIZINHA QUE LEVA AS FILHAS NA SORRI BAURU ME CONTOU QUE AS FILHAS DELA É QUE VOTARAM NA PESQUIZA A FAVOR DO PREFEITO, AS MENINAS TEM 7 E 8 ANOS, E AS DEMAIS CRIANÇAS QUE ESTAVAM LÁ, VEJAM SÓ QUE GRUPO DESSE CARA. NÃO ADIANTA MENTIR A VERDADE VEM A TONA. SOU GAZETTA SOU 43”. Eu, que nem sei o que sou, mas vejo algo muito semelhante em três candidaturas à prefeito de Bauru, vejo que Diego postou isso ao não concordar com pesquisa que coloca Rodrigo com quase 70%, Chiara e Gazzeta em torno de 5% cada nas intenções de voto em pesquisa encomendada pela TV Tem.

Respondo ontem, 26/08, logo ao acordar, às 6h11 e da seguinte maneira: “Diego - Todos mentem Uns mais, outros menos. Uns com mais perniciosidade, outros com menos, mas não existem os que não omitem o que realmente fazem. De Rodrigo você escancarou isso, de gente do DEM/PSDB, tudo o que de pior existe nesse país, os acordos mais espúrios e tudo acobertado pelos barões da mídia. E do tal do Gazzetta, o santo do pau oco dessa eleição, que gravita em todos esses salões e descaradamente vem a nós dizendo que é um ser diferente, que propõe o novo. Nada disso. É mais velho e arcaico que os demais, pois omite, oculta, esconde, escamoteia. O PV é um arremedo de partido e o que menos defende hoje é a questão ambiental. É uma sigla igualzinha a todas as outras. Quer um exemplo:  Natalino, o vereador de Bauru sempre votou, por imposição do partido, ao lado de tudo de ruim o que tivemos dentro da Câmara. Vá constatar e depois me diga: por absoluta imposição partidária. E só me responda algo: Quem são os que ditam as normas do PV na cidade? Não se iluda meu caro, dentre todos, o bom mocismo do Gazzetta é o puro lobo se fazendo de cordeiro. Um abracito do HPA”
O próprio candidato adentra o campo de jogo e ainda ontem, 26/08, às 23h54 me dá a seguinte resposta: “Prezado Henrique Perazzi de Aquino quando vc tiver pelo menos um mínimo de educação para falar das pessoas, vai merecer ao menos o meu respeito em responder aos seus questionamentos. Na vida como na politica a tolerância aos que pensam diferente de vc é essencial em para a boa convivência em uma sociedade democrática, pena que vc não deve ter a compreensão do que é civilidade, e do que é respeito”.

Foi doído, tanto que ao acordar hoje, 27/08, não perdi o apetite, mas respondi a ele ainda de barriga vazia, 7h53: “Gazzetta, te respeito, mas não te entendo. Minha civilidade tem limites. Enxergo e busco as respostas aos meus questionamentos nas entrelinhas. Posso lhe questionar disso aqui proposto (e não respondido) e muito mais. Tudo muito simples, como dois e dois são quatro: como alguém pode ser diferente, propor o novo estando inserido carnalmente com tudo o que é atraso e arcaico? Felizmente, o povo parece ter percebido isso. Com os pés em tanta canoas, uma hora é líquido e certo, o fim será o fundo do rio. Abracitos cordiais do HPA”.

Como já previa, Gazzetta não gostou e veio na sequência, 27/08, às 10h01 com essa: “Agora sim podemos dialogar com civilidade! Seus questionamentos agora merecem minha manifestação. O que vc não sabe é que meus pés continuam firmes e fortes no mesmo propósito que me trouxe para a politica. Continuo com os mesmos ideais que tinha, quando aos 21 anos entrei para o PV. Não sei sinceramente de onde vc tirou essa história de pés em várias canoas, ela é tão absurda, que vc vai precisar achar outro para aplicar sua tese, talvez o governo atual que imagino vc deve ser um defensor e admirador possa servir de exemplo para essas conjecturas. Se vc soubesse a dificuldade que temos para manter o partido com vida orgânica na cidade, e para colocar a Campanha na rua, que só é possível graças aos trabalho incansável da militância e dos jovens que nos ajudam neste processo, mesmo sabendo das dificuldades que vamos enfrentar com os esquemas que estão enraizados na cidade para que ela fique do jeito que está, suas colocações são tão absurdas que se tiver pelo menos a curiosidade, venha conhecer o único movimento partidária da cidade que vive de forma independente. Mas tudo bem, acredite se quiser! Quanto ao voto, ele não precisa ser conquistado de ninguém, as pessoas é que devem estar convencidas da cidade que elas querem morar e do projeto ideológico que melhor representa este sonho”.

Às 12h53 batuquei isso como resposta: “Gazzetta: Essa campanha tem algo que não bate. Quando vejo vc, Chiara e Rodrigo se dizendo diferentes um do outro, isso não condiz com a realidade. Todos são neoliberais, muito ligados ao tal do pensamento único vigente e fazendo o jogo acertado com e da minoria, em detrimento do da maioria da população. Veja só o seu caso, por exemplo. Primeiro tentou ser vice do Rodrigo, sem sucesso. Depois tentou o mesmo com a Chiara e até com o PSDB, idem. Por fim, tentou algo com o PTB (o Ricardo explica bem isso) e também nada conseguiu. A única e última opção foi se lançar da forma como o fez. E se tivesse optado por Rodrigo, hj seu discurso seria outro. Do que diz de Chiara e do PSDB percebo algo mais, não uma dura crítica, mas algo ameno. Isso tem motivo, sempre esteve ligado ao PSDB, tentou ser secretário de Estado, depois negociou assumir vaga na ALESP, com a saída de um deputado, que assumiria outro cargo e tu seria deputado. É sempre muito mais fácil fazer a crítica ao Governo Federal do que ao Estadual, ainda mais quando existem relações muito próximas, posicionamentos políticas similares aos tucanos. O PV em Bauru, com atuação na Câmara vota tudo em comum acordo com os tucanos e força seu único vereador, constrangido, a fazer o mesmo calado, com pífias explicações. Isso é ser diferente? O PV não é diferente de nenhum outro. Até seu presidente, o Penna, para continuar no cargo, age igual a qualquer outro. Onde está a diferença, me explique. É isso, nada contra sua pessoa, simpática, bonachão, agradável, mas quando o assunto é política, temos que ser duros, sinceros e honestos conosco mesmo. É o que faço. E querendo continuar o papo, estou à disposição. No final da tarde, repercuto essa conversa e um algo mais no meu blog, pois aqui no facebook ela já é mais do que pública. Um abracito do HPA”.
Como não podia deixar de ser, quem cutuca, recebe o troco. Ele chegou às 13:34 : “Prezado Henrique Perazzi de Aquino tá vendo como suas reflexões estão baseadas em fatos que não existem, e claro que sua visão fica totalmente distorcida da realidade. Quem te disse que alguma vez cogitei ser vice do Rodrigo ou da Chiara, talvez vc precise renovar seus contatos ou conversar com pessoas de credibilidade. Posso te dizer que fomos muito, mas muito mesmo assediados com facilidades para entregar o jogo, mesmo assim continuamos firmes e fortes com o mesmo propósito de apresentar um novo projeto para a cidade. Vale lembrar, que o PV foi a primeiro partido a dizer que teria candidatura própria, basta vc procurar um pouco nas mídias desde 2011. É verdade que conversamos com todas as agremiações partidárias, até porque fomos procurados por todos, uma hora para desistirmos da disputa, outra para compor na chapa proporcional. Não mudei de lado, nem de discurso, e nosso vereador na Câmara vota conforme seu pensamento individual, nunca fizemos qualquer policiamento ideológico, e somos cobrados por isso, ao contrário do que vc nos cobra, veja como engraçado são as coisas. Concordo com vc que o PV não é diferente de qualquer partido, mas, independente de sigla partidária eu continuo com os mesmos princípios, mesmo que vc e a politica tradicional da cidade tentem rotular. Grato”.

O que disse e o que o candidato disse pode ser facilmente comprovado, mentiras e verdades. Batuquei algo novo às 14h32: “Candidato: Meus fatos existem sim, estão aí. Vc diz ser verdade o que me escreveu, eu idem do que escrevi. Os fatos é que podem desmentir a um ou a outro. Nada me diz da proximidade quase umbilical ao que prega e faz o tucanato. É isso mesmo ou fantasio? Percebo isso pela observação atenta da ação sua e do PV. Triste isso, de ser cabo de força para algo maior. E se isso for mesmo verdade, me responda: Por que não unir forças numa só candidatura, DEM, PSDB e PV? Torço e o que me move é por um Brasil novo, mais justo, diminuindo as desigualdades, com ações claramente voltadas para a massa, hj enganada, ludibriada. E não vejo essa possibilidade em nenhuma dessas três candidaturas. Só isso e sendo sincero comigo mesmo, sou obrigado a mostrar isso quando instigado. Abracitos do HPA”.
Sua resposta veio logo a seguir, exatamente às 14h47 e de uma forma a encerrar o papo, ainda fugindo de responder a certas perguntas: “OK, agora sim esclarecido! Cada um acredita na versão que quer acreditar e na visão de cidade que quer defender! Com educação, o diálogo sobre qualquer assunto fica democraticamente legal! Abraços e boa sorte!”. Ficamos nisso.

Gostaria de poder fazer o mesmo com Chiara e Rodrigo (e também com o Paulinho). Lanço aqui somente uma pergunta (para começar o bate-papo com eles), como se jogasse uma garrafa ao mar em busca de encontrar alguém do outro lado.
PERGUNTA PARA CHIARA: Percebo que, em sua propaganda eleitoral, ao falar sobre a morte da adolescente no PS, procura livrar a cara do Hospital Estadual, jogando toda a culpa na Prefeitura. Acha certo isso? Por que não aproveita e discorre no mesmo programa todas as reclamações, que só não vieram a se transformar em óbito por pura sorte, da falta de atendimento no Estadual (lembra da fala da dra Tereza?). Pratica o protecionismo aos seus e crava estaca só no erro do adversário. É assim sua ação? E sobre uma declaração do deputado Pedro Tobias no seu programa, de que se eleita, tudo melhorará e o governo estadual terá outro posicionamento. Acha certo isso? Quer dizer, que se você perder, estaremos no mato sem cachorro? Não acha justo dar um puxão de orelha no deputado ou pensas igualzinho a ele, afinal ele disse isso no seu programa de TV?

PERGUNTA PARA RODRIGO: Composição partidária é mesmo um problema, chega de tudo, os ruins e os bons, os de um lado e de outro, os negociantes e os negociáveis. Conviver com isso não é fácil. Diga-me, foi percebido durante seu mandato que não consegues dizer não aos grandes que te ajudaram na campanha. Tem momentos em que é preciso contrariar esses interesses, não deixando eles imporem nomes desqualificados para cargos. Conseguirá fazer isso daqui para frente, mesmo não tendo feito até agora? Por que essa sua preferência para dentre os aliados, ficar sempre aos lado dos mais direitosos (posições conservadoras) e cada vez menos ao lado dos mais esquerdistas (posições progressistas)? Não acredita que seu governo poderia ter uma outra cara, se optasse pelo jogo ao contrário?
PERGUNTA PARA O PAULINHO: Você não acha que está perdendo uma grande oportunidade, quando fica martelando que o Governo Federal é isso e aquilo, instigando menos os três candidatos nos debates, deixando de mostrar o quanto cada um é parecidíssimo com o outro? Por que do comedimento? Esses debates ditos de “alto nível” é o que "eles" querem, sem provocações, sem o dedo na ferida, sem mostrar de fato a que vieram. Meu caro, se não fizer isso, você sabe, ninguém mais o fará. Quando um mediador como o empresário Duda, da TV Preve faz elogios rasgados a ti, vejo que algo de errado está acontecendo. É sua chance de ao provoca-los, cair nas graças do eleitorado e pelo menos deixar dois atrás de ti. O que está faltando para fazer isso?

Obs final: Todas as fotos ilustrativas desse texto foram tiradas por mim ontem, durante a 5º Parada da Diversidade, na avenida Nações Unidas, Bauru. São expressivas e nelas muita gente que gosto de ver pelas ruas, alguns amigos e outros, que mesmo desconhecidos, estavam deslumbrantes e merecedoras de um click. Pena fotografar tão mal.

domingo, 26 de agosto de 2012

MEMÓRIA ORAL (126)

O PODER NÃO ESTÁ ONDE IMAGINAM – MURALISMO / O artista argentino Rep, que se vê como um resistente, exporá em Veneza – texto desse HPA publicado na seção Plural, revista semanal Carta Capital, edição 712 (29/08/2012), páginas 70 e 71.
Buenos Aires tem muito de São Paulo e São Paulo tem muito de Buenos Aires. Isso foi o que Miguel Rep, o famoso muralista argentino, 51 anos, fala sobre o conservadorismo de sua cidade natal, ao compará-la com a maior cidade brasileira. “Em toda metrópole há duas metades do bolo e na divisão, pendência sempre maior para o conservadorismo. Na Espanha, os partidários de Franco continuam representando parte significativa da população. Em Buenos Aires existem 40% de conservadores, 40% de progressistas e os outros 20% são voláteis, flutuando de acordo com a oferta eleitoral. São os fiéis da balança. Em Buenos Aires isso é mais evidente que no resto país, pois aqui existe uma direita classista, com medo do negro que vem das províncias. É um bastião branco, reacionário. A sorte é que não decidem sozinhos uma eleição presidencial, mas o que ocorre na Prefeitura comprova isso, MacrI, o prefeito é o típico populista”, diz.

Rep está mais do que inserido dentro dos 40% reservados aos progressistas. Autoditada, publica algo advindo do seu traço desde 1976. Expõe em mostras individuais e coletivas, em seu país e no exterior. Obteve prêmios nacionais e internacionais, tanto pelas tiras, charges, ilustrações, como pelo seu trabalho mais conhecido: o muralismo. Na Argentina, existem muitos a praticá-lo. “Aqui o muralismo está associado à prática política. Buenos Aires sempre foi muito politizada e isso uma de suas particularidades, uma apropriação, efetiva ação popular nos existentes espaços públicos. As ruas daqui sempre foram utilizadas para isso. Durante a ditadura, claro, houve restrição, mas hoje abundam por todo país. Isso não significa uma ação de qualidade, mas fazem. Pouca qualidade, pois poucos estudaram o tema. Diante disso, não sou considerado um muralista na acepção da palavra e sim, praticante, estudioso, resistente e persistente”, explica.

São três os seus mais importantes trabalhos em Buenos Aires. Um imenso painel no salão principal da Biblioteca Nacional, o Mural do Bicentenário conta a história do país dos primórdios até o momento atual. Parando diante dele observa-se cada detalhe da luta de transformação do país, desde tempos vindouro, até os panelaços, papel da igreja, dos oligarcas, chegando às Madres da Praça de Maio e no que propiciou os Kirchner. No pátio interno da Faculdade de Ciências Sociais, na avenida Córdoba, imenso mapa com o contorno de toda a América Latina, como se fosse um único país e um título mais do que explicativo: “Faltan ellos”. No terceiro, na Casa Garrahan, o mesmo ímpeto dos demais, a explicitude na demonstração das diferenças sociais existentes no país. Em todos Rep deixa claro ter um lado e mesmo sem ser radical, desses centrados somente no tema ideológico, não deixa dúvidas do lado escolhido. “Sou um humorista político, trabalho em cima da história real. Não tenho nenhum problema em mostrar minha ideologia. O que deixo claro, sem retoques é que o governo atual do meu país não está com o poder. O poder está do outro lado. Igual no Brasil, não?”, pergunta.

Isso ele demonstra diariamente numa tira na contracapa do diário Página 12, publicada desde sua fundação. “Ele é hoje o terceiro jornal do país em tiragem, mas o primeiro em influência. Não existe no país redação de rádio ou jornal que não esteja atenta ao que diz o Página 12. Durante muitíssimos anos o El Clárin e o La Nácion tinham benefícios diferenciados, impunham uma agenda a ser seguida e desde 2008 isso deixou de existir. Foi um corte, sentido por eles e a reação são os ataques a quem propiciou a perda de privilégios. Note que antes o poder era do Estado, hoje é da imprensa e exercida de forma cruel por esses grandes grupos. Tudo foi tocado de forma impune, foram se fortalecendo. Hoje se utilizam de todos os meios possíveis para se impor. Inventar notícias negativas é só o começo”, relata. Sua  explicação dos motivos de um grande embate nacional em pleno andamento é esclarecedor: “A Lei da Mídia, votada em 2008 e barrada até então pelo El Clárin entrará em vigor em 8 de dezembro e até lá tudo é um campo minado. A artilharia deles é feroz tentando reverter algo que lhes será prejudicial, principalmente aos negócios, a como executam seus negócios. Criam temas e ficam semanas martelando mentiras e falácias em primeira página, sempre contrárias ao governo”.

Ele não se cansa de falar da imprensa do seu país e do mundo. “A imprensa hoje, de uma forma geral emburreceu, ficaram muito ruins. Caiu a qualidade investigativa. Na Espanha, o jornal El País já não é nem sombra do que foi um dia. E na Argentina? É só o Página 12, mais nada. Os outros leio muito raramente, algumas vezes pego num café, mas cada vez mais me horrorizo”, diz. E diante desse cenário sombrio onde Rep consegue publicar? Ele mesmo explica: “Tenho a tira diária no Página 12, uma charge na única  semanal legível do país, a Vein ti Tres e por ter conquistado um espaço, viajo muito, mantenho muitas atividades. Virei um formador de opinião e mesmo sem divulgação na mídia, todas minhas incursões pelo interior lotam. Em Baía Blanca, local conservador, em algo minimamente divulgado só pela Secretaria de Cultura local e pela internet, o salão estava lotado. Isso se repete no país todo. Minhas palavras parecem repercutir e ela é minha força, além do traço. Pinto muito, tanto aqui, como fora. No final de agosto estarei em Veneza e sempre convidado”.

Na sua peregrinação pelos lugares onde é convidado, além do traço contundente, sempre a propiciar divagações e acalorados debates, fala muito e sabe que hoje, esperam isso dele. “As pessoas estão presas, reprimidas e aguardam ansiosas que alguém surja para acender o pavio. A história argentina é sempre contada com grandes golpes. Dou sempre a minha interpretação e não escondo isso das pessoas. Não temos que ficar esperando por iluminados, líderes de outra maneira, pois o capitalismo sempre foi e será cruel. Eles inventam palavras, como liberalismo, capitalismo selvagem, negócios predatórios, que no fundo é tudo a mesma coisa. O mural continua, diante disso, sendo um bom atrativo e pode ser visto de infinitas maneiras. É o que me instiga a continuar desenhando e provocando”.
Tudo que Rep desenha para a imprensa é produção do seu estúdio, montado num apartamento, adaptado a esse fim,  numa movimentada rua próxima do centro de Buenos Aires, a Amenales. Um refúgio, onde ele junta de tudo um pouco. Desde um boneco inflável com a fisionomia de Hugo Chávez a outro, de isopor, de um dos seus mais famosos personagens, Lukas. Livros estão espalhados por todos os cantos, esboços de prováveis desenhos, cartazes e pôsteres. Um ajuntamento aparentemente caótico, mas que de todo modo demonstra sua decisão por trabalhar sozinho e rapidamente. “Tudo o que vê aqui reunido faz parte de algo referente ao processo criativo no qual estou inserido. Um livro aberto, um recorte de jornal, um cartaz de algo que me despertou interesse, peças recebidas e até presentes. Trago para cá somente algo a me provocar e nada está totalmente perdido. Querendo e precisando, encontro tudo bem rápido”, explica. Rep não para e nesse momento negocia uma visita para setembro no interior paulista, outras para o interior do seu país e finaliza a arrumação de suas malas para viajar à Itália, onde a partir do dia 23 estará envolvido na criação de mais um mural, esse na Bienal de Arquitetura, em Veneza.