domingo, 1 de setembro de 2013

RETRATOS DE BAURU (145)


NA PARADA DE HOJE JURANDYR BUENO SERIA COMISSÃO DE FRENTE
Hoje acontece na cidade a 6ª Parada da Diversidade LGBT e o encerramento da 3ª Semana de Combate ao Preconceito e a Discriminação de Bauru. Acordei ciente de que irei a mais essa Parada e junto dessa certeza uma incontida vontade de escrevinhar algo de alguém que já se foi e que certamente, se vivo fosse, estaria em mais essa festa nas ruas: JURANDYR BUENO FILHO, o famoso arquiteto e falecido anos atrás, meses após ter sido eleito vereador por Bauru. Lembro como se fosse hoje de vê-lo na edição da 1ª Parada, seis anos atrás, descendo sozinho de sua casa ali pertinho das Nações, circulando com seu jeito bonachão e falador por todos os cantos, sendo cumprimentado e fazendo a festa entre os presentes. Deve ter dado até autógrafos. Escrevo mais dele a seguir.

Jurandyr nunca foi uma figura controversa, era o que era, assumidíssimo e nem por isso, se deixando vergar e ser vergado. Sabia muito bem se impor. Inconteste isso. Podia ser contestado (e o era em muitas ocasiões) pela sua postura sempre ao lado só de gente endinheirada, que era onde conseguia o seu dimdim para viajar mundo afora, como o fez. Foi usado e usufruiu ao seu modo de tudo isso. Não nego também de tê-lo visto sempre por aí nas “quebradas do mundaréu”, como apregoava Plínio Marcos. Gostava de botar o pé na lama. Não sei se fez como o arquiteto comunista Niemeyer, que doava projetos para construções populares, mas sei que ajudou a muitos desses. O fato é que um era comunista, Jurandyr não.

Do pouco que atuou como vereador, tinha a nítida impressão de que muito contribuiria para a ampliação do debate democrático dentro daquela Casa de Leis. Não era dado a cabrestos e não tendo papas na língua (nem no Vaticano, como no poema de Lázaro Carneiro), não se acomodaria em votar cegamente tudo o que lhe chegasse às mãos. E tinha bom cabedal de conhecimentos para discutir e debater. Perdemos todos essa oportunidade. Outro ficou em seu lugar e ninguém, sabemos bem disso, é igual ao outro. As diferenças demonstram bem quem somos, pois esse negócio de manada tudo agindo de forma igual e comandada é algo dos mais maléficos para os destinos da humanidade.

Num de seus últimos atos me ajudou lá na Cultura municipal a restaurar um imenso mapa dos primórdios de Bauru, instalado lá na entrada da Prefeitura, na praça das Cerejeiras e que hoje foi retirado do local e deve estar juntando poeira em algum lugar incerto e não sabido (alguém pode me dizer do paradeiro do quadro?). Fez campanha para arrecadar o dinheiro para a moldura. Inesquecível o dia em que esteve numa reunião do Codepac e de suas explicações sobre variados tombamentos (o gestual foi ótimo, podia cair no mar e sem saber nadar, com certeza, não morreria afogado). Tenho a grata lembrança de um e-mail dele para mim, quando deixei o cargo por lá, dizendo exatamente isso: “Sinto muito pela sua saída. Fará falta, pois possui um ótimo entendimento do que é patrimônio e sua defesa”. O momento era mesmo de sair. Tenho guardado aqui no mafuá um livro dado a mim por ele, o “Bauru Edição Histórica”, da administração Sbeghen, com apresentação dele e com dedicatória a mim dessa forma: “Ao grande incentivador de cultura bauruense, com um grande abraço do Jurandyr, 30/01/2008”.


Jurandyr era tudo isso e muito mais. Polêmico, irreverente, ousado, nada polido, algumas vezes intransigente, noutras meio que autoritário, maledicente, mas uma pessoa de fino trato, de fácil convivência para quem o sabia entender e levá-lo na maciota. Sim, era uma estrela, brilhava como nunca e gostava de ser paparicado. Nunca precisei usar desse artifício. Dialogávamos muito sobre a cidade sem nos atermos a rabos presos, como sei era obrigado a fazer em conversações mil e fechamentos dos seus contratos de trabalho. Estive várias vezes em seu escritório e hoje ao ver aquilo tudo com outros ares, sei que deve fazer falta a todos, inclusive aos vizinhos. Juju, se me permitem chama-lo assim, faz falta entre nós. Na Parada então, não existe Comissão de Frente que se iguale a uma tendo ele como um dos seus bastiões. É impossível descer aquelas poucas quadras sem voltar à mente do Jurandyr todo alegre e pimpão a desfilar (sim, ele desfilou naquele dia) junto aos seus. E quem me diz que ele lá não estará hoje?
Obs.: Todas as fotos foram tiradas daquele domingo de setembro de 2008.

3 comentários:

Mafuá do HPA disse...

Juliana Guido Sujeito complicado, esse. Uma vez, em um projeto em que fiz o levantamento e desenhei plantas, discutindo um determinado ponto do trabalho, ele me cortou dizendo "você não pensa, você não fala na-da!". Não sei como foi a cara que fiz ou ouvir isso, mas deve ter vindo com um olhar daqueles de "MORRA!", porque ele pediu desculpas minutos depois...
há 14 horas · Editado · Curtir · 1

Henrique Perazzi de Aquino Juliana, ressaltei isso, ele tinha dessas frequentemente, mas tinha a ombridade de voltar atrás em alguns casos. Ele aprendeu muito com o tempo. No final estva mais compreensivo, aprendeu com a vida.
há 13 horas · Curtir

Helena Aquino Ele era emoção ..... falava e pronto e depois esquecia, pedia desculpas ..... ahhhh não o condeno .... tb tenho esse ímpeto ....
há 12 horas · Curtir

Cristina Camargo Nessa ocasião, ele me falou algo tão engraçado! Mas não posso contar publicamente...
há 11 horas · Curtir (desfazer) · 1

Beto Grandini Era competência pura!!!!

ESSES ALGUNS DOS COMENTÁRIOS NO POST NO FACEBOOK
HENRIQUE - DIRETO DO MAFUÁ

Anônimo disse...

Henrique

Muito bonito o depoimento pois, além de respeitoso, traça o perfil de uma personalidade com múltiplas facetas.

Me fez pensar, juntando com a história da Lotta, como as elites brasileiras sempre foram flexíveis à orientação sexual de seus pares (seja na capital federal, seja em Bauru).

No entanto, como esse arquiteto elegeu-se vereador, essa flexibilidade não se restringia então às elites e nem representava - como representa a eleição do Jean Willys hoje, a defesa de uma alteridade plena de direitos.

A orientação sexual das pessoas, se podia ser alvo de comentários e críticas, não chegava a ser alvo de execração pública, como ocorre hoje entre os fundamentalistas e carecas.

A violência (real e simbólica) tornou-se linguagem oficial dessa nossa época de consumo imediato e desenfreado - de bens, pessoas, religiões e preconceitos.

Por isso me sinto tão estrangeira no país e tão extraterrestre no planeta.

Beijo.

Maristela Debenest

Anônimo disse...

A maior escola é a vida e com certeza o "Jura" se formou para professor, diante da sua sensibilidade e competência.
Parabéns Henrique Perazzi de Aquino pelo belo texto.

Roberto Antonielli