sábado, 12 de junho de 2021

DOCUMENTOS DO FUNDO DO BAÚ (158)


REUNIÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA COHAB BAURU E SEM NENHUMA ALTERCAÇÃO, TUDO NA MAIS PERFEITA PAZ*
* 17º artigo deste mafuento HPA para edição semanal do jornal DEBATE, de Santa Cruz do Rio Pardo, circulando a partir de hoje.

Abro o Jornal da Cidade, edição de hoje, sábado, 12/06 e na seção de Classificados, penúltima página do jornal o que mais me interessou em todo o jornal. Ali publicada Ata da última reunião do Conselho Administrativo da Cohab. Peguei meus óculos, sentei numa cadeira e munido de uma lupa fui ler a coisa por inteiro, pois esperava encontrar alguns arranco rabos, provocações e demonstrações de incredulidade diante dos fatos já conhecidos pela cidade quando da divulgação do catatau investigativo de perícia feita pela polícia.

Para minha surpresa, nada disso, só salamaleques, convescotes, troca de gentilezas e acarinhamento fraterno entre os presentes. Quando vi que a prefeita, a novíssima (sic) Suéllen Rosim estava presente, achei que seria perfeitamente compreensível ela abordar os membros do Conselho, pois estão juntos há muito tempo e referendaram nas administrações passadas, tudo o que lhe foi apresentado de balanços e contas, como se nada estivesse acontecendo. Que nada, ninguém cobrou nada, nem dela para os conselheiros, nem os conselheiros disseram nada a merecer registro. Enfim, deve ter sido um encontro dos mais aprazíveis, com salgadinho e refrigerante para desviar o tédio, encher linguiça e cumprir o que reza a legislação, essa que prega a necessidade de regularmente se reunirem para avaliar e assinarem o "tudo bem".

Nem parece estarem todos diante de algo dantesco, maquiavélico, escabroso e de repercussões ainda não totalmente conhecidas para os cofres municipais. A alcaide não se interessou em perguntar nada e todos saíram de lá, pelo que deu para perceber, mais amiguinhos que nunca, coesos e ninguém soltando da mão de ninguém. Confesso já ter participado ao longo dos meus 60 anos de algumas comissões, assembleias, conselhos e em todos o pau comia, pois na existência de opiniões conflitantes, nada melhor do que, se aproveitando do encontro de todos na mesma mesa para tirar tudo a limpo, buscar explicações e convencimento pelas ações. Ou seja, o mais normal deste mundo é isso ocorrer.

Quando tudo transcorre sem sal e açúcar, creio eu, não seja bom sinal. Mal a cidade digeriu os R$ 55 milhões desviados e agora os cofres municipais à volta com não sei quantos bilhões de ação praticamente perdida, sem recurso possível e quando reunidos, nem uma palavrinha a respeito. Guardarei essa Ata como sinal de que, nos bastidores da dita cidade "Sem Limites", como me diziam, tudo se resolve sempre da melhor forma possível. Terminada a leitura, estou até mais calmo, pois se nada foi dito ou levantado na reunião, sinal de que tudo está sob controle e disso me lembro de frase do imbatível centrovante do Botafogo, aquele que resolvia tudo, Túlio Maravilha, quando diante de algo desairoso no próximo jogo afirmava cheio de confiança: "Pode deixar comigo". Ele ia lá e resolvia, já os conselheiros da Cohab, nem sei se são bons de bola.

A BANCA DO SEU ORLANDO JÁ NÃO EXISTE MAIS E UM JOVEM DO RAMO FOI LÁ FAZER AS DESPEDIDAS DE PRAXE, GUSTAVO MANGILI - O VELHO E O NOVO, HISTÓRIAS DE ONTEM E HOJE
Oficialmente a banca fechou em definitivo após 42 anos funcionando no mesmo lugar, na rua Primeiro de Agosto, quase esquina com a Rio Branco. Gerações de gente comprando revistas e jornais por ali passaram. São tantas as histórias. Por uma banca como essa circulam não só papel, mas história viva e contada pela boca de quem por ali passava. Outro dia seu Orlando me contava das lembranças que tinha de alguns clientes. Lembro de uma, a do professor Mauro Toledo, diretor da ITE por muito tempo e todo domingo, logo pela manhã ia até a banca e levava uma batelada de jornais e revistas, todas as semanais, os jornalões e também outras, pagando tudo sempre em espécie. Seu Mauro era fechadão, mas Orlando dizia que conversavam muito e ele sempre perguntando se tinha alguma novidade, alguma publicação nova que ele não conhecia.

Contei a história dias atrás num comentário, quando o amigo Arthur Monteiro, revisteiro desde sempre, lembrando ser seu Orlando um inveterado bolsonarista. Sim, tive que concordar e lhe dizer que nos últimos tempos, coisas de uns dez anos, converso menos com ele, exatamente por causa disso, mas o respeito pelo que representa ali encravado no centro velho da cidade. E contei algo ouvido dele. Ele era antipetista de carteirinha, abominava tudo o que fosse esquerda, mas me confessou que nas duas últimas eleições havia votado pra vereador em Roque Ferreira, o único, segundo ele, em que podia confiar como político. Achei tão emblemático isso e logo depois contei pro Roque, que vez ou outra passava lá também, não tanto para comprar jornais, mas para prosear e manter acesa a chama.

Ele queria permanecer aberto mais tempo. Tenho toda a lembrança bem aqui comigo de quando o centro da cidade começou a ficar mais perigoso e ele ainda insistindo em manter suas portas abertas até mais tarde, sábados e domingos até escurecer. Foi até quando deu. Foi abordado e achacado algumas vezes. Alguns pediam algo e não aceitavam recusa. Ele cansou. Restringiu o horário, mesmo querendo ficar mais tempo ali. Ele também tentou introduzir o filho no negócio, ele até permaneceu algum tempo ali atrás do balcão, mas desistiu logo, pois não tinham o dom para esse tipo de comércio. E o casal Pavan foi se revezando como podiam até o fim. Quando ele saia, ela ficava e assim tocaram a coisa até no último dia. Tem um sítio, seu sonho de consumo, mas nos últimos tempos só ia lá no domingo à tarde, quando conseguia também no sábado.

Quem apareceu por lá essa semana dentre todas as despedidas que lhe fizeram foi outro do mesmo ramo, o jovem Gustavo Mangili, que começou muito cedo nesse negócio de banca, levado pelo pai, Cláudio, hoje com duas na cidade, uma junto do Confiança Nações e outra, de alumínio defronte o Confiança Falcão. Gustavo eu vi crescer atrás do balcão e hoje, as bancas deles continuam a todo vapor pelo simples motivo de terem inovado e introduzido tudo o mais junto. Hoje, o da Nações se transformou numa reconhecida Tabacaria. Gustavo conhece a saga de seu Orlando e sabe o quanto é dura a vida de jornaleiro. Ali na das Nações ele abre às 9h da manhã e vai até lá pelas 21h, quase ininterrupto e sem dia de folga. Sua esposa colombiana fica na banca da vila Falcão e o pai, Cláudio, dá a cobertura e cobre os buracos. Quando tudo aperta, até a mãe entra na dança e também a esposa do Cláudio. A família samba unida na frente de um negócio incessante, cansativo e que, segundo Gustavo, ele já se acostumou.

Pois bem, ele apareceu lá para se despedir do seu Orlando e esposa. Conta da tristeza de ver tudo sendo desmontado, pois ali foi vivenciada uma intensa vida, mais ou menos igual a que seu pai escolheu e ele toca o barco adiante. Conversaram e seu Orlando contou a ele que queria continuar aberto, pois não encontrando ninguém para passar o ponto, tinha pela frente uma dura negociação, a do dono do imóvel querendo reajustar o valor. Seu aluguel era compatível com o tempo ali trabalhado, mas na negociação dos últimos tempos, o reajuste ficaria salgado demais. Mesmo cansado, só desistiu por causa do valor alto para renovação do contrato de aluguel. o contrato venceu e dia dez de junho foi o prazo acordado para baixar as portas. Não existem tantos como esses dois hoje pela Bauru, que tempos atrás teve mais de quarenta bancas e hoje, se perdurarem umas dez é muito. A de seu Orlando é a penúltima só vendendo revistas e jornais. Com ele fora do riscado, resta a da Ilda, lá junto do Aeroclube e todas as demais já misturaram tudo para sobreviver. Queria também escrever sobre isso das pessoas estarem lendo muito menos jornais e revistas, o modal estar em declínio, com publicações fechando, outras tantas em dificuldades, mas isso é outra história e acho que até já contei isso por aqui. Conto novamente qualquer dia destes. Por hoje, pedi para o Gustavo me enviar as fotos dele lá se despedindo do seu Orlando, o mais velho em atividade no ramo. Amanhã cedo, domingo, como será que ele, mais do que acostumado a acordar todo dia lá pelas 6h da manhã para abrir a banca vai se ver despertando e não tendo mais a obrigação de ir lá levantar a porta de metal. Vida nova para ele e a esposa após 42 anos praticamente sem férias.

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