sexta-feira, 14 de maio de 2021

OS QUE FAZEM FALTA e OS QUE SOBRARAM (149)


A ESTAÇÃO FOI DESOCUPADA, MAS O QUE MESMO VIRÁ DISSO TUDO?
A Estação da NOB, ali junto da praça Machado de Mello é “a mais bonita do interior do estado de São Paulo”, segundo palavras de Ignácio Loyola Brandão, quando passou por aqui e sentado num dos bancos da praça relembrou dos tempos quando por aqui passou. Numa delas aguardou sentado a chegada de trem da então namorada Joana Fome, atriz de televisão e teatro. As histórias ali passadas são milhares, cada qual contando uma em particular. Por ali até assassinatos ocorreram, também encontros dos mais inesperados, como Che Guevara tendo por ali passado de forma clandestina. Ela reinou por longas décadas, mas depois da privatização das ferrovias, definhou e foi levada ao abandono e esquecimento. Na administração Rodrigo Agostinho um esforço para sua aquisição, já pensando em alguma utilização, provavelmente cultural. Por enquanto, nada vingou, com o ex-prefeito Clodoaldo Gazzetta disponibilizando suas instalações para variadas ações culturais. Algo por ali voltou a ferver, mesmo de forma modesta.

Logo a seguir a decisão de desocupar as instalações e assim foi feito. Todas as entidades ali ocupando espaço foram intimadas via judicial para desocupar o local. Quase todas as fizeram, só restando hoje uma a que representa o ferromodelismo, reticente por causa de sua proximidade com a linha de pensamento e ação da atual prefeita, Suéllen Rosim. Ou seja, durante os últimos meses foi efetuado um apressamento na desocupação do lugar e agora, a pergunta que sobrou disso tudo é somente uma: o que será feito da Estação? Como o desgoverno da novíssima (sic) prefeita já demonstrou por outros atos, tudo o que se refere a dinheiro está sendo contingenciado e direcionado para questões onde veja prioridade, relegando e postergando tudo o mais. Daí, com a estação praticamente vazia, será que não passaremos por novos tempos de abandono e esquecimento? Tomara que não e para tanto bato na mesa três vezes: toc toc toc. Tomara que a prefeita e seu staff de agenciadores não esteja pensando em fazer algo por lá somente esperando que verbas cheguem via leis de incentivo e emendas parlamentares. Que ao menos exista um projeto consistente para não só restaurar a estação, como incrementar a recuperação do centro velho bauruense.

Escrevo este texto movido pelos últimos acontecimentos de Audiência Pública realizada dias atrás, quando a Secretaria Municipal de Cultura foi questionada e do que se ouviu de resposta, algo mais do que preocupante. Nenhum projeto viável em andamento. A desculpa é a de sempre, a pandemia. Creio eu que, tempos como este, ótimos para as pessoas, principalmente as dentro do serviço público cultural, com pouco serviço externo e com portas fechadas, exercitem mais e mais o livre pensar, colocando em prática a difusão de ideias e proposituras. Aguardo ansioso por essas. Já ouvi muita coisa, vi muito papel impresso com projetos, mas agora, quando conseguiram tirar de lá quase tudo o que ocorria, a expectativa é imensa. Tirar todos de lá e nada fazer vai ser o uó do borogodó. “O tempo passa, o tempo voa...”, cantava a musiquinha de propaganda do Bamerindus e cai como uma luva para o marasmo hoje reinante lá na gare da estação, praticamente às moscas e tudo inerte, esperanças mais do que renovadas de que, algo foi pensado e está sendo urdido de forma séria. Enfim, até quando iremos aguardar o passo seguinte? Já passou da hora de algo acontecer por lá.

BANDA E ORQUESTRA MUNICIPAL VÃO ENSAIAR NA PRAÇA RUI BARBOSA
Essa duas instituições culturais bauruenses sofrem para dedéu por essas plagas. Mudam de lugar a todo instante e até hoje não conseguiram encontrar um porto seguro para chamar de seu. Quem frequenta o espaço onde está o Teatro Municipal ali na Nações Unidas deve ser lembrar deles ensaiando por todos os cantos, espalhando música, afinando instrumentos até nas escadarias frontais do centro cultural. De lá foram para o Automóvel Clube, onde permaneceram por quase uma década. Tempo de calmaria de boa e intensa produção cultural. Conseguiam interagir com a população circulando pela praça Rui Barbosa e diariamente muitos populares paravam diante dos portões em busca de minutos de boa audição musical. De lá, quando a Prefeitura decidiu não mais pagar aluguel daquele imóvel, tudo foi levado para a gare da Estação da NOB, ali na praça Machado de Mello. Tudo foi levado para lá e o que se via eram os jovens tocando espalhados pela imensa plataforma. A adequação podia não ser das mais apropriadas, mas por estavam novamente num porto seguro. Pouco antes, por pouco não foram alocados para onde um dia funcionou a Oficina Cultural Glauco Pinto de Moraes, na rua Amazonas, local totalmente reformado para atividades culturais e depois, quando tudo pronto, o governo estadual entrega de bandeja para atividades judiciais. O histórico é de instabilidade e constante mudança. Por fim, na administração Clodoaldo Gazzetta, foi alugado imóvel na rua Saint Martin, onde um dia funcionou posto dos Correios. Atuaram muito pouco tempo por lá, pois logo chegou a pandemia e as portas foram fechadas.

Hoje a notícia confirmada pela boca da própria secretária de Cultura, Tatiana Sá, que em recente entrevista na TV Câmara, para o jornalista Nelson Gonçalves afirmou que o contrato de aluguel do espaço na rua Saint Martin não será renovado, portanto, os músicos estarão novamente sem sede para chamar de sua, praticamente sem espaço para ensaiar e guardar adequadamente seus instrumentos quando tudo voltar a se normalizar. Estes criticam o ex-prefeito pro ter feito um contrato no local de apena um ano de duração, quando prevendo o que agora se sucede, poderia ter feito por vários anos, ou seja, mais difícil não ser honrado até o final. O fato é que no começo do segundo semestre vence o contrato e até lá, talvez as atividades culturais já estejam quase normalizadas ou se encaminhando para tanto. E quando isso ocorrer, não se tem ideia de onde serão “encostados” os músicos da Banda e da Orquestra, que tanto orgulho para trouxeram para o município e a comunidade bauruense. Como se observa, tudo por lá na Cultura está sendo tratado com pouco caso e desleixo, sem a devida importância que cada atividade exige. A pandemia facilitou a ação da prefeita, que não leva em consideração as atividades culturais, pois sendo bolsonarista, assim como seu mentor, empurra a Cultura com a barriga, pois dela possuem medo, enfim, povo culto desmerece quem o destrata. Com tudo fechado, a coisa vai que vai, mas está chegando o dia de tudo voltar a funcionar e daí, sabemos, a cobra irá fumar. A prefeita e a secretária precisam mostrar a que vieram, deixar de criar justificativas e atuar de fato em prol da Cultura. Será? A classe artística está com os pés e mãos para trás, pois diante do quase nada feito até agora, já estão imaginando os músicos ensaiando debaixo das árvores na praça Rui Barbosa e guardando seus instrumentos no cubículo debaixo do coreto.

DESPEDIDA
ORIOVALDO JUSTINO, FAMOSO "SETE OFÍCIOS", SE CALA O TOCADOR DE VIOLINO PELAS RUAS DE BAURU
Seu Ariovaldo era o que se poderia chamar de sujeito polivalente, pois fazia de tudo e mais um pouco. Muitas vezes tudo ao mesmo tempo. Inesquecível os tempos quando circulava com sua LAMBRETA pelas ruas da cidade, carregando sempre uma maleta de pequenos reparos, pois consertava de tudo, era o que se chama hoje de “Marido de Aluguel”. Pequenos reparos era com ele mesmo e assim cortava Bauru de norte a sul. Inquebrantável na alegria, junto da maleta na moto carregava outro invólucro, onde carregava com todo cuidado e esmero o VIOLINO. Eu sei que ele tocava nas igrejas da cidade, de várias crenças, pois ele não era dado a preconceitos. O importante era ser convidado para colocar seu instrumento em funcionamento e daí, parava tudo, a moto no meio da rua e se punha a flanar aquela vara nas cordas sempre afiadas. Fazia a alegria por onde passava. Eu o conheci assim e essa é a maior lembrança que carrego dele, o de um original músico destas plagas. Certa feita, o encontrei na Feira do Rolo e ele me mostrou seu novo telefone celular e como o acondicionava junto da cinta. Era um patacão, parecida um tijolo. Sim, os primeiros celulares eram grandes e pesados e só serviam para ligar e atender telefonemas, nada mais. Ele criou um aparato para envolver o aparelho e protege-lo de quedas, esbarrões e mesmo ficar solto no bolso e se perder num solavanco da estrada. Sua importância e generosidade sempre saltavam aos olhos de todos que tiveram o prazer de conhece-lo. Muitos o chamavam de "Sete Ofícios", pois batia nas onze, jogava em todas as posições, ou seja, fazia de tudo um pouco. A última vez que o via ele estava também numa manhã dominical na Feira do Rolo – ponto de encontro magistral desta aldeia -, creio eu, trazido por alguém, algum parente próximo, talvez a filha, que o soltou por ali e estava de longe o vigiando, tomando conta, cuidando da preciosidade.

Hoje quem me liga é a Mônika Batista, prima dele e me passa a triste notícia, seu Ariovaldo faleceu e ciente de já ter escrito muita coisa dele, me pede, “escreva dele, faça uma homenagem”. Paro imediatamente tudo o que estou fazendo, ainda meio esquisito e com a imagem dele na cachola. Sento e começo a batucar minhas lembranças dele. Sabe que se me perguntarem a profissão dele, do que se aposentou, não sei dizer, mas desde que se aposentou passou a ser mais conhecido, pelos dotes musicais e pela lambreta. Ultimamente ele morava lá pelos lados do jardim Vânia Maria, sob os cuidados da filha, Jussara e de outros familiares. Seu Justino será eterno personagem das ruas bauruenses e toda vez que o via, na ponta dos cascos, conversador e tinindo de saúde era mesmo de um prazer mais que inenarrável. Eu sou um trombador por natureza e mesmo na correria da vida, sempre que cruzava com estes, os tais imprescindíveis, esses que, mesmo com a passagem do tempo, fazem de tudo e mais um pouco para continuarem em exposição, sendo, fazendo e acontecendo, parava e ia prosear. As nossas ruas só são ricas, cheias de vitalidade por causa dessas valorosas pessoas, todas convergindo para um dos espaços democráticos destas plagas, a feira dominical, ponto de convergência de tantos de igual valor. Faleceu ontem, 13/05/2021 e seu enterro ocorre hoje, 15h30.

Em 30/09/2015 escrevi dele no blog Mafuá do HPA: “JUSTINO COM SEU VIOLINO E LAMBRETA, INESQUECÍVEL PESSOA - Conheço seu ORIOVALDO JUSTINO do tempo em que andava pelas nossas ruas com uma lambreta e dotado de um capacete dos mais maneiros, cheio de incrementos mais do que pitorescos. Fazia serviços variados em residências, tipo as de encanador, eletricista, sempre acompanhado do seu violino, objeto meio que inseparável. Com a idade chegando, os filhos o impediram de continuar se arriscando com a moto por aí, mas não conseguiram fazer com que aposentasse o violino. Sempre tocou em tudo quanto é lugar, desde batizado, festa de casamento, culto religioso, bodas de prata e os mais diversos locais onde era convidado. Se estivesse com o instrumento do lado e o encontrando pela rua, pedindo ele o tirava da caixa e executa o serviço ali mesmo. Figuras das mais simpáticas e solicitas. Certa vez o encontrei voltando da casa de um enfermo. Havia ido lá para levar alegria com sua música. Justino é exatamente isso, a alegria em pessoa, bondoso, simples, singelo e prático. Escrevi dele tempos atrás, pois em tudo o que fazia uma pitada de irreverência e picardia. Tinha um celular daqueles grandões, tipo tijolos, pesados e o carregada num suporte seguro pela cinta. Havia produzido uma capinha especial só para ele, toda decorada, com metal retorcido e cheia de adereços. Da última vez que o vi ele estava pronto para tocar ali numa igreja na Araújo, para cima da Rodrigues. A idade chegou e nada mais sei de seu paradeiro, sei que morava lá pelos altos do Jardim Bela Vista”.

Escrevi e publiquei no blog Mafuá do HPA estes textos sobre seu Justino: https://mafuadohpa.blogspot.com/search?q=violino+justino

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