sábado, 1 de maio de 2021

REGISTROS LADO B (43)


NO 43º LADO B, ROSÂNGELA BEATRIZ MONGE, ARTESÃ E SUA HISTÓRIA COM RODINHA NOS PÉS, DE CIDADE EM CIDADE, NOSSA MAIS ORIGINAL “NOMADLAND”
Não assisti a entrega da premiação do cinema norte-americano, a do Oscar, mas de seu ganhador com melhor filme, “Nomadland”, li muita coisa que me caiu às mãos e ali, mais do que evidente, algo sobre os deserdados do capitalismo. Gente vivendo como nômades brotam aos cântaros por essa América, de norte a sul, cabo a rabo. Uns, como os do filme, o fazem por necessidade, após perderem a condição de possuírem uma casa para chamar de sua e passam, desde então, a viver em barracas, tendas, trailers e vans. Esses padecem muito mais, sofrimento como chaga a infestar este mundo recheado de injustiças. Existem outros, os que saem pela aí, para viver uma outra vida, mais liberta e fora dos padrões condicionantes, com todos fechados num mundo estreito e reducionista. Bater as asas também é forma de resistência. Existem também os que o fazem, mesmo tendo um “porto seguro”, mas para trabalhar e continuarem conseguindo manter este lugar de retorno.

Ao ler sobre o filme me foi inevitável pensar em uma pessoa aqui em Bauru, ROSÂNGELA BEATRIZ MONGE, gaúcha de Porto Alegre, 63 anos, artesão das mais conhecidas nas plagas bauruenses e que, há 18 anos roda o país, de cidade em cidade, praça em praça, onde instala sua barraca e ali vende por uma temporada o que produz. O faz em grupo, um protegendo o outro, tudo organizado. Leva tudo no seu carro, monta a barraca na praça junto aos demais e assim toca a vida, livre, leve e solta. Participa de feiras e festas por onde elas existirem. Sabe todas essas datas e vai de cidade em cidade, festa de igreja é com ela mesma. Me diz que alugam a praça da cidade e ali passam uma temporada, até esgotar a cidade, daí partem para outra, tudo mais ou menos cronometrado. Produz muito do que vende ali mesmo, nas horas vagas e como agora, um ano de pandemia, ela reclusa, em sua casa aqui em Bauru e aguardando o momento de retomar a estrada.

Poderia dizer ser ela uma CAIXEIRA VIAJANTE do século XXI. Mas ela é mais, muito mais do que isso. Tem um encanto no que faz. Ela, em primeiro lugar, se encontrou no ofício e dele não se afasta por nada neste mundo. Casou, descasou, o filho foi morar na Europa e está muito bem e ela, como nunca conseguiu viver trancafiada dentro de casa, bateu asas e voa maravilhosamente. Une o útil ao agradável. Desta forma consegue se manter e ser feliz. Ela me diz: “Quem se inicia nisso, não consegue mais deixar sua barraca”. Mas o que tem essa barraca de tão convidativo, qual a atração que a faz seguir em frente, não parar mais. Vamos falar disso tudo, a sua história desde quando aportou em Bauru, os envolvimentos com a cidade e as amizades construídas e mantidas ao longo do tempo. Ela tem muita história para contar e conta de um jeito só seu, rindo e sem vergonha de relatar as alegrias e perrengues. Hoje, prefere atuar pelo interior de Minas Gerais do que São Paulo e o faz por em terras mineiras existir menos violência que na paulista. “Lá tenho mais qualidade de vida e é isso que procuro”, conta. Diz mais: “Nos últimos tempos, já não conseguia viajar só com meu artesanato, tendo que anexar a ele, a venda de outros produtos, pois do contrário teria que parar”. Isso também ela vai nos contar logo mais no bate papo semanal.

Neste 43º LADO B – A IMPORTÂNCIA DOS DESIMPORTANTES, a história de uma estradeira, alguém que vive na estrada e assim como a personagem do filme Nomadland, gosta demais da conta de sentir o vento dali proveniente no corpo. Histórias dessa trajetória não faltam, pois em cada lugar, tem várias, boas e ruins, amenas e mais contundentes. Contar um bocadinho delas aqui, revirar sua memória é algo instigante e provocante, pois reaviva algo pelo qual sempre sonhei e nunca consegui colocar em prática: esse desprendimento de pegar a estrada, sair por aí, viver disso e assim conhecer o mundo. Rosângela faz isso e é muito feliz. Sua história cativa, envolve, preenche e espero poder saber bem conduzir a conversa, onde ela possa ir relatando tudo, aos poucos, como lição de vida, aliás, mais que ótima nestes tempos nebulosos.

Abaixo conto algo mais escrito por mim no blog Mafuá do HPA (www.mafuadohpa.blogspot.com):

- Em 30/12/2015 publiquei: “OS TAIS QUE CAIRAM NO MUNDO – CAIXEIROS VIAJANTES DO SÉCULO XXII - Eu adoro contar histórias de amigos e amigas. Por esses dias reencontrei dois deles assim do nada, ele no meio da feira e a ela na entrada de um supermercado. Ambos não são mais figurinhas fáceis por aqui, pois estão um tanto longe da aldeia bauruense, mas voltam sempre que podem. E nesse final de ano, cá estão. Conto, com muito gosto, algo deles. (...) ROSANGELA BEATRIZ MONGE é uma hoje quase senhora, alta, morena, cabelos longos, sorrigo gostoso e com casa montada na vila Cardia, mas residindo bem longe de Bauru, na verdade, com nada fixo, tudo dependendo do fluxo do seu negócio. Décadas atrás foi casada, nasceu seu filho, hoje residindo em Dublin, coração da Europa. O casamento não deu certo e ela ainda insistiu um tempo por aqui, mas quando ingressou de vez num negócio artesanal, viu que para fazer a América teria que bater asas. Nada mais a segurava por aqui e daí para ganhar estrada foi um pulo. Uniu-se a um grupo de organizados artesãos e em conjunto viajam de cidade em cidade, montam o aparato todo, ou seja, as barracas nas praças centrais e ficam um tempo em cada lugar. Quando o movimento começa a rarear levantam voo e vão para outras paragens. Dessa forma já conheceu uma infinidade de cidades. Nem saberia dizer o nome de todas. Dificuldade, claro, ela tem algumas e quando a reencontro na entrada de um supermercado na semana passada, relaciona algumas. A principal é ter que utilizar banheiros públicos, banhos nesses lugares e até na casa de gente que vai conhecendo nessas cidades. Dormir não é problema, pois já está mais do que acostumada com a cama desmontável e armada no centro da barraca. Com todos ali juntos, os perigos diminuem. É lindo ir vendo as fotos de cada praça, cada novo lugar por onde circule. A gente acaba viajando junto do lado de cá. Quando a pergunto sobre voltar, ela nem pensa muito e me diz que se o fizer, não sabe o que poderia fazer por aqui, pois seu negócio está nas idas e vindas, na novidade em cada novo lugar que chega. Volta mesmo só para rever os parentes, amigos e esse ano, aguardando a chegada do filho, algo que já deve ter acontecido. Curte esses dias pela cidade, mas noto que o brilho dos seus olhos está no que faz, nessa liberdade conquistada. Pode até trocar isso tudo por uma vidinha mais tranquila, mas que vai ser algo difícil, isso vai. Por enquanto, curte os dias de férias e sempre sorrindo, algo peculiar no seu jeitão gostoso de tocar a vida”.

Mais e mais dela, das andanças, histórias, aventuras e tudo o mais, logo mais. Assistam e participem... Faremos de tudo para valer muito a pena.

Eis o link com o bate papo, duração de 1h20: https://www.facebook.com/henrique.perazzideaquino/videos/4496240117072629

COMENTÁRIO FINAL:

O papo foi divinal, maravilhoso. Consegui fazer com que Rosângela se soltasse e contasse boas histórias. Seu relato é contagiante. Viveu até os 26 anos em Porto Alegre e, a partir daí, quando conheceu o músico Nicodemos, cai na estrada para nunca mais parar. De um amor intenso, foram morar em alguns lugares e acabaram aportando na feia – segundo ela – Bauru. A adaptação não foi fácil, pois estava acostumada com outros hábitos e visitas em casas de amigos sem avisar, chegar e entrar e na cidade paulista, algo diferente. Quando o casamento de desfez, ela ficou com o filho João e foi ganhar a vida com o que sabia fazer, artesanato, este de todas as formas e jeitos. Descobriu que, só com o seu artesanato não conseguiria sobreviver como gostaria e desde então, descobriu os lugares em São Paulo onde conseguia produtos de outras regiões. Foi pouco a pouco descobrindo outras feiras, cidades vizinhas e quando se deu conta estava totalmente envolvida em viagens e feiras cada vez mais distantes, nas quais, saindo de uma e entrando em outra, chegou a permanecer um ano longe de casa. Se juntou a um grupo de artesãos nômades como ela e todos, pernoitando em barracas, nos próprios locais, junto da mercadoria. Lotava o carro de produtos e caia na estrada, cidade em cidade, conhecendo quase todo o interior paulista. Logo a seguir, descobre Minas Gerais e se desliga um pouco de São Paulo, pois segundo ela, por lá, mas qualidade de vida e menos violência. Muitas aventuras, em cada porto gente nova, amizades diferentes e algo pelo qual começou e não sabe como parar. Foi indo, indo e só parou ano passado, obrigada pela pandemia e a paralisação das festas nas cidades, principalmente as patrocinadas pelas igrejas. Obrigada a se reciclar, aprendeu a vender outras coisas, curtir a casa e se virar de novas formas. Tentou até emprego como entregadora de compras, mas em todos foi barrada. Foi quando descobriu que, aos 63 anos é considerada velha. Muito bom o relato do esforço todo feito em prol do filho, este já há mais de década e meia na Europa, certa feita liga e lhe diz: “Venha, vou te mostrar parte do mundo”. E ela viajou, alguns lugares com ele, noutras só, sem falar inglês, mas se virando, romances e exercitando o que sabe muito bem fazer, bater perna. Enfim, Rosângela é uma trabalhadora como tantos outros, informal, sem poucos registros em carteira e hoje, só aguardando tudo voltar a se abrir para reiniciar o que está dentro dela, algo incontrolável, pegar estrada e ir vender seus produtos pela aí, como boa caixeira viajante.


PODERIA MUITO BEM SER FICÇÃO, MAS...*
* 11º texto deste mafuento HPA para o semanário DEBATE, de Santa Cruz do Rio Pardo, edição chegando às bancas hoje:

A história eu conto, sem contar a fonte, muito menos revelar se é sonho, ilusionismo ou mesmo algo se repetindo com o vento, neste país mais do que insano, hoje dominado pelo desGoverno de desqualificados. Alguém me soprou no ouvido, ouvi atentamente e aqui compartilho, pois algo dessa lavra não deve permanecer sem que mais gente tome conhecimento. E se possível, providências.

Uma jovem de 24 anos, oriunda da região de Ribeirão Preto aqui aporta, com dois filhos a tiracolo, um de sete e outro de cinco anos. Ganha a vida se prostituindo, não nas esquinas, mas na forma moderna, esquinas virtuais. Encontros marcados pela internet. Além de tudo, a jovem consome drogas e assim sendo, sucessão de fatos lamentáveis, irreconciliáveis. Tudo acaba sendo denunciado aos órgãos de proteção de menores. As crianças são recolhidas justamente no momento em que sentem sintomas de algo diferente. Às pressas são levadas para atendimento médico.

O que acontece daí por diante é o que se repete país afora, mantra utilizado pelos próceres, acima do bem e do mal, inclusive da Ciência. Dentro do hospital, elas são tratadas pelos conhecidos medicamentos deste indefectível Kit Preventivo. Fizeram exame para ter certeza da infecção, mas antes mesmo do resultado já haviam tomado doses, sem levar em consideração o fator idade. Tomaram, como a maioria toma, sem poder ao menos opinar. Ouvir a mãe, pra quê, se ela é mesmo uma desajustada (sic).

Existe declarada irresponsabilidade do sistema. Num todo ele é falho, omisso, perdulário, autoritário, pedante. No retorno ao abrigo, resultados negativados, a criança mais velha passa mal. Baço, rim, fígado alterados, clara consequência do inadequado medicamento. Existem rodando pela aí mais de 70 pareceres contraindicando esse uso, mas o capiroto, que nada entende de Ciência afirma ser eficiente, daí é comprado, distribuído e ministrado. Tudo aos borbotões.

Como o ruim pode sempre piorar, a criança é detectada com algo até então desconhecido em diagnósticos anteriores, leucemia. Tudo encoberto, oculto, não revelado, mas no prontuário está lá, lhe foi prescrito os tais medicamentos inúteis para uma coisa e mais do que eficientes para desencadear outros. Nela aflorou a leucemia. Outro tratamento é iniciado. Neste caso, como é do conhecimento público, não existem culpados, pois tudo foi mera coincidência, diria mesmo, fatalidade.

Acharam a avó da criança. Ela se recusa a receber a mãe, muito menos as crianças e elas continuarão no abrigo assistencial. Essa história não tem fim ainda conhecido, mas muito previsível. Recomendado tratamento para a mãe e seus filhos, apartados de vez de sua convivência. Uma ainda hospitalizada, desta feita com outros medicamentos mais recomendáveis e a outra se adaptando à sua nova morada.

Pelo que se ouve, os tais medicamentos continuarão sendo indicados, receitados, comprados, ministrados, oferecidos, engolidos, deglutidos e seus efeitos, sendo ainda de estudos. Como se percebe, cobaias sendo utilizadas para essa finalidade. Não se assustem, tudo isso se passa no mundo do faz de conta. Impensável algo assim ocorrendo sob as barbas de tão precavidos estudiosos e abnegados servidores.

Ufa! Só mesmo uma mente muito fértil para inventar com tamanha riqueza de detalhes tão macabra história. Nunca no país daquele que veio para salvar essa nação das mãos da corrupção e da perdição. Enfim, ele é família.

HOJE É O DIA DO TRABALHADOR 
Resistir é preciso - Bauru hoje, Dia do Trabalhador, parque Vitória Régia
Enquanto do outro lado estavam os apoiadores do ex-capitão se utilizando indevidamente das cores verde e amarelo, na entrada principal do parque os representantes dos trabalhadores marcaram presença e durante toda manhã arrecadaram alimentos para o projeto De Grão em Grão. Parabenizo todos que, corajosamente enfrentaram o touro a unha e lá estiveram mostrando a força da classe trabalhadora. Vergaremos os fascistas na hora certa.

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