segunda-feira, 15 de setembro de 2025

BEIRA DE ESTRADA (199)


DANDO UM TEMPO
Quatro dias, de hoje, 15/09 até quinta, 18/09, eu e Ana Bia fugimos e estamos na estrada, longe do burburinho bauruense. Ele veio trabalhar eu, já gozando a vida como sedentário aposentado, batendo perna e gastando sola de minhas alpargatas. Não esperem andanças pelos Jardins ou a Bela Cintra, Iguatemis da vida. Quero mais é ir pro Brás, andar a pé da Sé ate a Liberdade, fuçar sebos ainda não navegados, adentrar muitos pés sujos e usufruir também disso de não mais pagar ônibus e metrô - não pago mais nem o Prata, ida e volta grátis. Deixo, por estes dias de publicar a Vitrolinha do HPA e o Cena Bauruense, só escrevinhando algo das coisas daqui. Gente, pareço cada vez mais, algo como dizem, pinto no lixo, todo pimpão, ciscando pra tudo quanto é lado. Dizem que, algo mudou no modus operandis lá de Sampa pros lados da vila Madalena. Vou lá conferir. Ana me faz sair com o celular amarrado numa cordinha. Acho muito brega, mas como tenho espelho lá em casa, sei fazer parte deste time faz tempo. Ela diz ser alvo fácil, mamão com mel. Se alguém souber de alguma manifestação, me conte. Gargarejei ontem o dia inteiro pra perder a rouquidão. Tô pronto pra me esgoelar por aí. Quero ir comer aquele quitute vendido lá no campo do Juventus, na Móoca - como é mesmo o nome? - e ver um filme no Belas Artes. Quatro dias voam. Chato mesmo será voltar pra terra bolsonarista onde nasci, cresci e vivo. Será que consigo ir rever o Museu do Ipiranga, 40 anos depois? Que mais, hem!!!
HPA, no Prata, com Ana ronronando no banco ao lado, já perto de Sorocaba, 8h25, segunda, 15 de setembro de 2025.

RECORDANDO E CAMINHANDO EM SAMPA
01.) AQUI NESSA RUA OCORREU UM DOS EMBATES MAIS EMBLEMÁTICOS DA TRAJETÓRIA ESTUDANTIL BRASILEIRA
Escrevo de memória, sem consultar nenhum alfarrábio. Hoje, logo depois do almoço deixo Ana para participar de abertura em Congresso Acadêmico no Mackenzie, ali perto da Rebouças e de lá decido descer a pé até o centro velho paulistano. Caminho bem pouco e dou de cara com rua Maria Antonia, de saudosa memória. Não vivenciei os embates históricos ali ocorridos, pois fui da geração seguinte. Lá pelos idos de 1968, tinha 8 anos. Li muito a respeito. Neste trecho, no final dos anos 60, época fervilhando a repressão na ditadura militar, ocorreu o choque entre duas vertentes do movimento estudantil da época. De um lado o com ligação umbilical com a esquerda, consequentemente com a luta armada e noutro, a direitona, essa com ligação umbilical com todos os grupos fascistas de então, principalmente os ditos anticomunistas. O choque foi inevitável e hoje, passando novamente pelo local, sento num bar, peço algo para beber e fico assuntando de como os jovens de hoje se situam neste cenário. O Mackenzie domina o pedaço e, evidente, os jovens de hoje são bem diferentes dos daquela época. Os tempos são outros, tudo muito diferente, porém, algo continua do mesmo jeito, a eterna luta pela autonomia universitária e as liberdades democráticas. Não vejo no estudante destes tempos a mesma fibra de antanho, mas escrevo isso sem aprofundamentos. Tudo hoje gira por essa tal de lei do mercado e estes, ainda mais numa escola particular, nenhum sentido revolucionário. Muita luta individual para vencer na vida e pouca para resolver o problema social brasileiro num todo. Não dá para comparar as situações assim numa sentada, meramente observando jovens almoçando num bar. Eu é que, gosto de viajar no tempo e espaço. Divago e para mim, a Maria Antonia representa muito. Foi um momento de intensa resistência e enfrentamento ao poder estabelecido na época. Olho para os lados e é como tudo viesse como li, inclusive com a fumaça nas ruas, a repressã ocomendo solta e a favor dos direitistas. Passei horas divagando sobre tudo isso, tão representativo para mim.

2.) A PRAÇA ROOSEVELT SEMPRE ME SEDUZIU
A primeira vez que vim sózinho para Sampa, lá pelos meus 17 anos, 1987, por aí, em trabalhando na Bradescor em Bariri, conheci assim de bate pronto a praça Roosevelt, no coração paulistano e desde então gosto de circular por dois pontos ali existentes, fincados como patrimônios tombados, o Cine Bijou e a Teatro Satyros. Desde aquela época, gosto demais da conta de bater perna por São Paulo. Anos depois, vendendo chancelas, circulei muito por todos seus cantos, vendendo e aproveitando para garimpar lugares, situações, pessoas e, assim, aprendi a amar a Paulicéia Desvairada. No Bijou já assisti filmes que não veria em nenhum outro lugar e confesso, nunca foi assediado por lá. Talvez isso tenha gerado em mim grande decepção. Tantos outros o foram e dessas incursões tantas histórias, hilárias ou não, eu não as tenho. Assisti filmes e só. Bebi ali nas redondezas, mas nada também fugindo do trivial. Só uma única vez, no Famiglia Mancini, anos 80, conheci alguém e jantamos juntos. Perdi a foto ali tirada e isso muito me entristece. No Satyros, aquele teatro mais que alternativo e num espaço com essa cara, a de quem resiste e insiste em ser diferente, ousar e provocar. Aquele quarteirão é um cabedal de infinitas histórias. Tenho alguns amigos que as contam, eu me reservo a gostar daquele cantinho da cidade grande. Faz uma pá de tempo que não circulo mais por lá à noite. Não vai ser dessa vez. Hoje estive durante o meio da tarde, ambos os locais fechados. Fechei os olhos e viajei na maionese. Vivo muito do passado. Envelheci, mas querendo continuar em exposição, como disse Aldir Blanc numa de suas canções, enquanto Ana Bia está lá numa palestra acadêmica, fico flanando e revendo o passado, com o coração recheado de um saudosismo que sei, não voltará mais. Eu já passei do ponto. A Roosevelt resiste bravamente. Não deve ser a mesma coisa de antes, mas está lá, firme, nem sei se tão forte, mas sei, eu passarei e eles lá continuarão. A vida é assim, a gente passa, os lugares ficam.

3.) A PRAÇA E AS IMEDIAÇÕES DA BIBLIOTECA MÁRIO DE ANDRADE
Eu tenho uma amigo, reginopolense e hoje, guarulhense, Fausto Bergocce, que trabalhou ali na esquina, quando na encruzilhada funcionava o Diário Popular - alguém se lembra dele? Aquele canto da cidade me atrai. No lugar do jormal, hoje um teatro e na sequência da rua, uma padaria, daquelas onde os quitutes e a comida são a cara paulistana. Defronte ela um sebo, pé bem sujo, mas com preciosidades. Hoje encontrei um livro de fotos do Paulo Garcez, que foi fotógrafo d'O Pasquim e me arrebatou, depois outro de escritos latinos do Augusto Boal e outro com o relato do jornalista Paulo Henrique Amorim, contando a história de quando Roberto Marinho quiz roubar uma eleição de Leonel Brizola e se deu mal. Sai de lá carregando os livros e na praça, bem defronte a famosa biblioteca, duas bancas, nenhum de revistas e jornais novos, mas de livros e antiguidades, estilo sebo. É a forma como encontraram para tocar a vida, num mundo onde leitores ainda pipocam por aí. Eu um deles. Na segunda banca, o cara sobrevive com reprodução de pintores famosos e pelo que vi, gosta muito de Picasso. A praça mudou muito de décadas para cá. Essas duas continuam abertas e tentando manter a chama acesa. Da biblioteca, espiei pelas janelas. Não tive tempo para adentrar e viajar, enfim, o tempo urge. Eu queria muito caminhar, andar, rever lugares e algumas pessoas. Consegui em partes. Enfim, tudo muda com o passar do tempo. Eu tive o prazer de ver aquele reduto com baita movimentação. Até um show solo, piano e voz, com Angela Ro Ro já presenciei por ali. A rua lá do jornal é a Martins Fontes e dava passagem para seguir em frente e chegar ao Bexiga. Andei muito por ali. Muitos cortiços pela frente e neles, gente sobrevivendo como pode, aos trancos e barrancos. Esses ainda possuem certa sorte, por terem encontrado um canto para viver próximo da muvuca, ou seja, do centro nervoso da cidade grande e não precisam de grandes deslocamentos para chegar ao lugar onde tudo acontece. Circulei por ali e depois fui rever a Galeria do Rock, onde décadas atrás, um certo Toninho gerenciava o pedaço e por lá uma loja em especial, a Baratos e Afins. Nessa gastei alguns caraminguás, não hoje, mas ao longo do tempo. Hoje, nem consegui subir as escadas, pois passei do horário. Fico de voltar e o faço sempre que posso. Gosto desses lugares. Aliás, prefiro estes que perambular pelos Jardins. O centro, com todos os seus riscos e perigos possui seus atrativos. Muitos deles os em buca só de luxo não os enxergam. Eu vislumbro algo mais por destrás da simplicidade destes lugares e ali me recarrego.
Amanhã tem mais, hoje vou dormir...

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