Como é difícl manter a escrita diária, quando numa viagem de 30 dias, hoje chegando ao 27º dia. Sei o quanto é preciso descansar durante algo tão intenso e se não o fizer, ainda mais na reta final, quando o corpo já está mais do que cansado, a incerteza de não conseguir chegar ao fim. Daí, quando no hotel e diante de escrever ou dormir, deitar e apagar, o corpo nem pensa duas vezes e desmonta, para logo mais, manhã seguinte, começar tudo de novo.
Hoje cedo, saímos por volta das 9h e voltamos para o hotel por volta das 20h, quando ainda saímos novamente em busca de um mercado, para nos reabastecer de vinho. No retorno, a cabeça gira e o corpo pede imediato descanso. Daí, mesmo com tudo isto a me embalar, tento escrevinhar algo, lembranças deste dia e aqui posto aos poucos, em drops.
A decisão foi a de dividir o dia em duas grandes visitas. Pela manhã ida até a região de Belém e visitar tudo por ali e na da tarde a região central, suas ruazinhas e entranhas, Baixo do Chiado, com seus museus e tudo o mais. Evidente que, muita coisa não conseguimos, mas ao menos tentamos. Para o turista, diante de roteiro extenso, não adianta desesperar, pois impossível querer ver tudo de uma só vez. Em alguns lugares, dedicação de mais tempo, noutros, um vapt-vupt.
Eu e Ana Bia de posse de um cartão Lisboa Card cada um, temos 72 para utilização em transporte público e entradas em lugares variados. Facilita a vida e assim, não se faz necessário ficar abrindo a carteira a cada instante. Basta apresentar o cartão. A estréia foi com o ônibus linha 727, pego logo aqui na esquina, junto da estação do Metrô Parque. Fomos dar lá perto da famosa Torre de Belém. Para mim, que frequentei bons anos de minha vida duas padarias com este nome, ambas 24h num tempo onde isso era permitido em Bauru, uma na rua Primeiro de Agosto e outra da Duque de Caxias, a imagem daquela edificação me trouxe inúmeras lembranças. Queria porque queria veria a tal torre.
A parada antes se deu para adentrarmos o famoso Mosteiro dos Jerônimos, algo grandioso e com uma fila infindável, dessas que todo turista adora enfrentar. Quase uma hora na fila e depois, lá dentro menos que isso. Tudo vale, pois o visual é impagável. Com a mesma percepção de tudo o que já vi com estes olhos, enfim, como pode tanta ostentação, garbosidade e sintuosidade em algo com conotação religiosa? Essas construções mais me assustam do que engrandecem a alma por tê-las visto. Se for pensar nisto a me martelar a mente, não vejo mais os monumentos todos, reverenciando os "donos do poder" daquelas épocas idas. Tento olhar para tudo só com o viés do monumento histórico. Dó menos.
De lá, partimos para ver com os próprios olhos a tal da Torre de Belém. Bela caminhada e com um trilho férreo, todo cercado, pela frente. A torre do lado de lá e nós dois do lado de cá. Foi uma longa caminhada até encontrar uma passarela e estar do outro lado. Belos parques públicos existem aqui por Lisboa, onde o povo pode se refestelar e ter bons momentos junto ao sol. Por aqui, as manhãs são um pouco frias, tudo esquenta no meio do dia e ao final da tarde volta a esfriar. Neste intervalo, o povo sai às ruas e se esbalda com o sol. Presenciar gente deitada pelos parques é algo para se segurar e não fazer o mesmo.
Voltamos pelo lado de lá dos trilhos, junto ao rio Tejo. Passamos também pelo monumento "Padrão dos Descobrimentos" e muito adiante, adentramos um túnel para nos levar do lado de lá e assim poder, caminhando pouco mais, ir comprar os famosos Pastéis de Belém, feitos no mesmo local desde 1837, num lugar onde novamente imensa fila para adentrar. Não havia fila para quem fosse somente pegar os tais pastéis e foi o que fizemos. Visitamos antes os Museus, da Marinha e o de Arte Popular, além de conhecer também o Centro Cultural de Belém.
Pegamos outro ônibus e este nos deixou no Centro Histórico. O desejo era pegar o bonde de número 15, que aqui é chamado de Elétrico, mas diante de tanta gente na fila, não foiu possível. A intenção a seguir era almoçar. A indicação era procurar o restaurante João do Grão, mas o mesmo, para nossa tristeza, fechou as portas definitivamente. Uma pena, pois só ouvimos coisas boas deste. Como já era mais de 15h, nem todos estavam abertos e sem conhecer, avistamos um bem simples e o adentramos, quando demos de cara com todos os funcionários já no almoço para fechar as portas. Fomos recebidos de braços abertos, a cozinheira de colocou à disposição de montar seus últimos pratos do almoço e assim, juntamos as mesas, num almoço e conversação de outro mundo.
Na saída, pedi ao dono do estabelecimento para nos ensinar o caminho mais suave para irmos ter com nossos corpos na Casa dos Bicos, a Fundação José Saramago. Ver a carinha deste grande mestre estampada na parede frontal foi de arrepiar e me lembrar da desgraça hoje ocorrendo no estado onde moro, quando um governador bolsonarista retira o nome de uma estação do metrô, dada a Paulo Freire substituindo por o de um bandeirante, algoz do povo. Saramago e Paulo Freire muito se assemelham. Na entrada, lugar bem visível uma placa de rua com o nome de nada menos que Marielle Franco. Justa homenagem desta mártir brasileira, cuja identidade de seus assassinos ainda conheceremos.
Viajei pelo interior de seus quatro andares disponíveis para visitação, reencontrando também Jorge Amado, numa justa homenagem. Este paraíso, livros por todos os lados, após tantas visitas feitas durante o dia foi para lacrar os passeios desta quarta com chave de ouro. Não resistir e gasto meus caraminguás em dois livros em homenagem a Saramago e numa camiseta dom uma frase de sua autoria estampada em sua frente: "Não te permitas nunca ser menos do que aquilo que és". Saramago é um dos autores estrangeiros que mais tenho títulos, leitura mais do que saborosa e agradável. Trata-se der um ser iluminado, vindo ao mundo para nos iluminar e assim, hoje foi o motivo para me reanimar. Mesmo ciente de que, rodeado de inúmeros monumentos e ilustres figuras portuguesas com estátuas em prça pública, foi neste local, onde mais apreciei no dia de hoje o que vem a ser um passeio ter valido mesmo a pena.
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