Mafuá do HPA

FRASES DE UM LIVRO LIDO (41)

“O ASSASSINATO DE GARCÍA LORCA”, DE IAN GIBSON
Li esse livro em 1988, ele é da editora L&PM RS, em sua primeira e única edição brasileira, com 334 páginas e versa sobre “o mais completo depoimento sobre a vida e o assassinato de García Lorca. Uma minuciosa investigação das circunstâncias que desencadearam a Guerra Civil Espanhola, levando à morte trágica um dos maiores poetas de todos os tempos". Quase o perco, quando cupins devoram sua lateral. Guardo-o como demonstração de apreço que tenho aos livros, pois me são raros. Hoje, observando uma campanha política entre Serra x Dilma, uma das mais moralistas da história, rever o que fizeram com Lorca é tentar fazer dos tempos atuais a não repetição de tempos sombrios (Lorca já era classificado pela direita como inimigo). Quem se apega a moralismo, como o submundo da campanha de Serra, pode muito bem pregar contra alguém com um pensamento libertário, transformador e até invocar como não recomendável sua opção sexual (Lorca era um intelectual de esquerda, um revolucionário e homossexual). E o que diriam esses de alguém a sentir um profundo desinteresse pelos mecanismos da vida política. Rever as frases desse livro é de uma atualidade que dói:

- “...neste mundo eu sempre sou e serei partidário dos pobres. Eu sempre serei partidário dos que não têm nada, e até a tranqüilidade do nada lhes é negada”.
- “O dia em que a fome desparecer, vai se produzir no mundo a maior explosão espiritual que jamais conheceu a Humanidade. Os homens nunca poderão imaginar a alegria que estourará no dia da Grande Revolução”.
-“Neste momento dramático do mundo, o artista deve chorar e rir com seu povo. Há que deixar o ramo de açucena e se meter no lodo até a cintura para ajudar os que buscam as açucenas”.
-“Eu nunca serei político. Eu sou revolucionário, porque não há verdadeiros poetas que não sejam revolucionários”.
- “...era extremamente prudente, além de psicologicamente compreensível, declarar-se e sentir-se católico naquele momento. Era como se, sendo – e sendo reconhecido – católico, houvesse mais possibilidade de escapar da morte”.
- “Num ambiente de furor repressivo, todos os matizes se confundiam e os rebeldes já eram incapazes de distinguir entre um comunista, um anarquista, um socialista, um sindicalista ou um simples republicano. Todos eram vermelhos e todos precisavam ser liquidados como inimigos da gloriosa cruzada nacional e católica que iria salvar a Espanha”.
- “...seria passado pelas armas quem escondesse um vermelho na sua casa”.
- “Valdés poderia tê-lo salvo se houvesse desejado. Mas Valdés não era homem de salvar ninguém, muito menos um poeta vermelho”.
- “Nós, os homens, só nós conhecemos quando choramos juntos muitas vezes; quando convivemos durante longo tempo na intimidade das trincheiras, ali onde floresce a mais alta vida”.

Rever isso nesse exato momento da vida política nacional me dói muito, pois se não dermos um breque no avanço de forças retrógradas, elas irão ganhando força, aumentando a musculatura e se perpetuando. Usando de um falso fervor religioso, os que estão do lado de Serra querem mais que isso, uma democracia sem povo e portam-se como afirmou Mino Carta em seu editorial desta semana na revista Carta Capital (edição 618), exatamente com os mesmos argumentos de sempre “desde a oposição a Vargas democraticamente eleito, à resistência à posse de Jucelino, a manipulação constitucional para que João Goulart substituísse o renuncitário Jânio ao aceitar a imposição do parlamentarismo, enfim, o golpe de 1964 e o golpe dentro do golpe de 1968. Até a rejeição da Campanha das Diretas Já, a eleição das indiretas de 1985, a posse anticonstitucional de José Sarney, a eleição de Fernando Collor no seu papel de antídoto ao Sapo Barbudo. Sempre com a mesma peroração, a favor das mesmas inaceitáveis razões”. Guardadas as devidas proporções, Lorca foi morto e toda uma nação está sendo obrigada a ver um futuro governo federal tornar-se mais fundamentalista, tudo por causa de uns poucos que se acham donos de tudo, impondo até nossa forma de pensar e agir. Lorca sobrevive.

Ouço enquanto publico isso a fala de Leonardo Boff, transmitida ao vivo pelo blog do Tijolaço, onde artistas lotam o Teatro Casa Grande, no Rio, em apoio à Lula, Dilma Rousseff e as conquistas feitas. Num certo momento disse com a voz embargada: "Se com Lula a esperança venceu o mêdo, com Dilma a verdade vai vencer a mentira".